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Acervo da BN | Compilador Mineiro: o pioneiro das Alterosas

31 out 2020

Artigo arquivado em Acervo da BN
e marcado com as tags 1820, Imprensa Mineira, Independência do Brasil, Minas Gerais, Ouro Preto

Fundado pelo padre e artista visual José Joaquim Viegas de Menezes, o Compilador Mineiro deixou sua marca na história da imprensa brasileira ao ser o primeiro periódico redigido e impresso na província de Minas Gerais. No entanto, o pioneirismo de seu editor não se restringiu a isso; anos antes da publicação do jornal, Viegas de Menezes, pelos conhecimentos que adquirira em Portugal, instituiu em Vila Rica (a atual Ouro Preto) juntamente com o artífice português Manuel José Barbosa Pimenta e Sal e alguns operários, no ano de 1820, uma das primeiras tipografias brasileiras – bicentenária em 2020. Publicado nessa cidade, então capital da província, a partir de 13 de outubro de 1823, o Compilador Mineiro desencadeou a fundação de outras folhas locais. Mesmo assim, muito por seu teor polêmico, o periódico pioneiro de Minas Gerais não durou muito: após publicar sua 29ª edição, de 9 de janeiro de 1824, foi suspenso, dando lugar à Abelha do Itaculumy, impresso em sua oficina a partir de 14 de janeiro de 1824 com o objetivo expresso de substituí-lo, embora em linha mais moderada.

Cabe aqui ressaltar os antecedentes do Compilador Mineiro, que, em verdade, não foi o primeiro impresso de Minas Gerais: em Vila Rica já havia sido publicado, também por Viegas de Menezes, um opúsculo de 18 páginas, sendo destas 15 impressas, contendo ainda uma gravura, no ano de 1807, antes mesmo da chegada da família real portuguesa ao Brasil e, portanto, da liberação da criação de tipografias na colônia por D. João VI, decretada somente em 13 de maio de 1808 a partir da Impressão Régia. Esse opúsculo, no entanto, não era de autoria do padre editor: era um poema laudatório de Diogo Pereira Ribeiro de Vasconcellos intitulado “Canto Encomiástico”, dedicado e ao então governador Pedro Maria Xavier de Ataíde Melo.

Nelson Werneck Sodré, na “História da imprensa no Brasil”, cita o seguinte quanto às origens da tipografia que imprimiu o Compilador Mineiro, a Typographia Patricia, totalmente improvisada e artesanal:

Viegas de Menezes aprendera a arte (da tipografia) na Tipografia Calcográfica, Tipoplástica e Literária, do Arco do Cego, em Lisboa, dirigida por Conceição Veloso. Sua capacidade ficara obscurecida na modéstia do meio colonial, a que retornara, até esplender na referida façanha e nas gravuras de cenas brasileiras que preparou para o pintor francês Pallière. Em 1820, a instâncias do português Manuel Joaquim Barbosa Pimenta e Sal, chapeleiro e sirgueiro, improvisou uma tipografia inteira, dos tipos ao prelo, aparelhando o tórculo e moldando e fundindo as letras. Concluída a oficina, nos fins de 1821, Pimenta e Sal solicitou isenção militar para os seus artífices, alegando ‘a prontificação de uma tipografia que bem merece o epíteto de Patriótica pelo emprego de letras e máquinas construídas na mesma imperial cidade’”. (p. 35)

A pauta política do Compilador Mineiro focou, sobretudo, as discussões dos princípios constitucionais que agitaram o cenário político daquela época, transcrevendo o projeto da Constituição Brasileira então em discussão na Assembleia. Assim, em seu curto período de vida, o jornal teve tempo de firmar posição favorável à adoção de um sistema de governo representativo, baseado numa monarquia constitucional. Nacionalista, o Compilador às vezes protestava veementemente contra a administração colonial portuguesa. Transparecendo as preocupações do padre Viegas com a educação pública, o impresso ainda pregava pela criação de uma universidade na província. Posturas assim, progressistas e indignadas, fariam contraste à linha que a Abelha do Itaculumy seguiria, mais moderada.

Publicado três vezes por semana, às segundas, terças e quartas-feiras, o jornal pioneiro de Minas Gerais vinha ainda com transcrições de periódicos do Rio de Janeiro e notas oficiais. Todavia, era considerado um meio de incentivar a participação popular na vida pública. A folha dava espaço para colaborações enviadas por leitores, incluindo denúncias de maus tratos a empregados e a simples divulgação panfletária. Os nomes dos colaboradores, nesses casos, deveriam ser divulgados no jornal, mas, caso houvesse pedido de sigilo, os mesmos eram reconhecidos em papel separado, que era mantido em poder do editor – caso houvesse ordem judicial, solicitando o nome do correspondente. Assim, muitos dos textos do Compilador Mineiro saíam com os pseudônimos “Puro Mineiro”, “Bom Mineiro” ou “O Anti-Constitucional”, por exemplo.


O Compilador Mineiro de 1823