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Diário de Notícias (Rio de Janeiro, 1930)

10 nov 2015

Artigo arquivado em Hemeroteca
e marcado com as tags Aliança Liberal, anticomunismo, Carlos Lacerda, Cecília Meireles, Censura e repressão, Comércio, Crítica política, Departamento de Imprensa e Propaganda, Ditadura civil-militar brasileira, Economia, Getúlio Vargas, Jânio Quadros, João Goulart, Jogo do bicho, Liberalismo econômico, Orlando Dantas, Questões trabalhistas, República Velha, Revolução Constitucionalista de 1932, Revolução de 1930, Rio de Janeiro, Segunda Guerra Mundial, Tenentismo, União Democrática Nacional

O Diário de Notícias foi um matutino de tamanho standard lançado a 12 de junho de 1930 no Rio de Janeiro (RJ), por três jornalistas egressos de O Jornal, dos Diários Associados: Orlando Ribeiro Dantas (o regente da iniciativa e diretor da nova folha), Nóbrega da Cunha e Alberto Figueiredo Pimentel Segundo. Inicialmente propriedade de uma sociedade anônima presidida por Manoel Magalhães Machado, com Aurélio Silva como secretário, o periódico surgiu moderno e arrojado, contextualizado na guinada que consolidou a estrutura empresarial na imprensa brasileira. Após se firmar como um dos mais importantes diários do jornalismo brasileiro, tendo apoiado e, sobretudo, combatido a política de diversos governos distintos, ocasião em que se mostrou ambivalente, circulou até novembro de 1976, após falhar em seu projeto de colher dividendos ao adotar uma linha favorável ao governo militar instaurado com o golpe de 1964.

Surgido com redação, oficinas e administração no nº 154 da Rua Buenos Aires, o Diário de Notícias se inscrevia no conturbado contexto político de 1930, momento de “convalescença da alma nacional”, segundo seu editorial de estréia, “sacudida pela campanha presidencial mais alentadora de quantas já se feriram no cenário político do Brasil”. Ou seja, quando as eleições presidenciais de março deram a vitória a Júlio Prestes, situacionista representante da República Velha. Logo vindo a integrar a agitação no debate junto à opinião pública ao aderir à causa opositora, da Aliança Liberal, como fez boa parte da imprensa, em sua declaração de princípios o jornal vinha disposto a lutar contra as oligarquias, visando à transformação social pela reforma e pela substituição de estruturas de governo. Simpático ao tenentismo e sem se comprometer com os partidos políticos então existentes, o Diário de Notícias sustentava bandeiras liberais como a defesa do voto secreto, a anistia a crimes políticos e a reestruturação da justiça. Grandes questões sócio-trabalhistas do momento também mereceram a atenção do diário, que, indo contra a política oficial, colocava-se a favor de uma legislação que melhorasse a situação do operariado: fazendo questão de separar suas teses do bolchevismo, combatido com ânimo em suas páginas, clamava pela estipulação de um salário mínimo e de jornadas de trabalho, além de garantias sobre acidentes de trabalho e aposentadoria.

No plano econômico, em seus momentos iniciais o periódico defendia o livre jogo de oferta e procura como regulador de mercado e de preços, combatendo a monocultura – apontada como responsável pela crise econômica – e apresentando sugestões de diversificação na produção nacional e de fomento às forças agrárias. Nesse sentido, sobretudo, o jornal atacava a política de valorização do café, atribuindo à mesma a própria crise de superprodução. Além disso, o Diário de Notícias era contra a existência de tarifas aduaneiras – argumentando que com elas o Brasil não ganharia mercados externos, que deixavam de se abrir em retaliação aos altos valores.

Como bom representante da Aliança Liberal, o Diário de Notícias recebeu a alcunha de “jornal da Revolução” de 1930. Os acontecimentos que antecederam a eclosão do movimento liderado por Getúlio Vargas ganharam destaque em suas páginas, muito através de reportagens e editoriais de primeira página – como já em sua edição nº 1 – e em sua coluna “Movimento revolucionário”, que visava esclarecer ao grande público tanto os ideais liberais quanto a fragilidade do governo.

Devido à sua inclinação política de oposição, ao cabo de poucos meses após sua fundação o Diário de Notícias começou a sofrer represálias. No dia 3 de outubro de 1930 o jornal citou boatos sobre a perturbação da ordem em Belo Horizonte, que de fato levaria à Revolução de 1930. No dia seguinte, véspera da decretação do estado de sítio, Orlando Dantas foi chamado à polícia, para prestar esclarecimentos e receber instruções – o conteúdo do diário, assim, passou a ser submetido à censura. Mas sua linha não mudou.

À deposição de Washington Luiz em 24 de outubro, o matutino atingiu a tiragem de 168 mil exemplares (marca impressionante em vista dos iniciais seis mil exemplares) com a manchete “O Brasil despertou de um grande pesadelo – o Brasil está livre da politicalha de ódios e vinganças”. A partir desse momento o jornal veio com quatro edições, que se esgotavam rapidamente. No entanto, os tempos que se aproximavam não seriam de tranquilidade para o diário: assim que a junta revolucionária assumiu o governo, o jornal não tardou em mostrar suas restrições quanto ao governo provisório. Segundo seus editoriais, era ao líder tenentista Juarez Távora a quem a presidência da República devia ser entregue. O Diário de Notícias, então, preferiu adotar uma posta fiscalizadora da nova situação, esperando para ver como Getúlio Vargas se sairia na chefia do governo, dando-lhe voto de confiança.

Na proporção em que avaliava o desempenho dos interventores estaduais indicados pela junta governativa, a folha expunha um programa de governo a seu ver ideal, composto por ações que deveriam assegurar reformas administrativas, educacionais e jurídicas no país. Em 14 de novembro de 1930 a folha sugeria que Vargas adotara uma faceta tirana e publicava tal programa em sua primeira página, com 19 itens, a serem cumpridos em 1931: revogação das leis que julgava antidemocráticas; reforma educacional, com a criação de um Código Nacional de Educação; reforma do judiciário; nova divisão dos estados; construção de uma nova capital no Planalto Central, defesa da indústria e do funcionalismo público, etc. Todavia, o item que estava em primeiro lugar nessa lista seria o responsável pelo primeiro grande embate do Diário de Notícias com o governo pós-1930: a convocação de uma Assembléia Constituinte. Quando o matutino se engajou em campanha pela constituinte que garantisse a volta da legalidade ao governo brasileiro – de fato, o diário foi o primeiro da imprensa a defender a causa –, e para piorar suas relações com o poder, foi conveniente ao jornal se mostrar simpático à Revolução Constitucionalista de 1932, vista como legítima frente aos anseios democráticos do povo brasileiro. O desdobramento de tais episódios foi duro para o diário: censura rígida por parte dos órgãos de repressão.

Assim que a Assembleia Nacional Constituinte foi instalada em maio de 1933, o Diário de Notícias, após breve e rara comemoração, passou a empenhar-se na oposição à candidatura de Vargas à presidência da República, apoiando Antônio Augusto Borges de Medeiros para o cargo. A vitória da continuidade levou a folha à descrença quanto aos rumos do Brasil, subjugado à ditadura. Ainda no plano político, nesse período, o Diário de Notícias, fiel representante do liberalismo, mostrava-se avesso a movimentos como a Aliança Nacional Libertadora (ANL) e a Ação Integralista Brasileira (AIB) – ambos, em verdade, apesar de antagônicos entre si, eram vistos como pretextos para a manutenção de um regime fechado por parte de Vargas.

A luta contra o governo voltou a se intensificar quando da aproximação das eleições presidenciais marcadas para 1938. Naturalmente, o Diário de Notícias se situou à oposição, apoiando o ex-governador paulista Armando Salles de Oliveira, da União Democrática Nacional (UDN), sem deixar de atacar José Américo de Almeida, o nome indicado pela situação. Destacava-se em suas páginas, nesta época, uma preocupação com os conflitos sociais no Brasil, posto que estes pudessem adiar as eleições. Tais temores, afinal, não se mostraram infundados: em 10 de novembro de 1937 Getúlio Vargas outorgou nova Constituição ao Brasil, iniciando o Estado Novo sob a alegação de falência dos partidos políticos e ameaça comunista à República. Com o novo regime, a restrição às liberdades e o acirramento de ânimos, Orlando Dantas foi preso – apenas como advertência. Ao seu jornal só restou uma opção: a reprodução do discurso presidencial e da nova Carta.

Por um lado, figuras da UDN se aproximavam e mantinham fortes relações com o Diário de Noticias – pode-se afirmar que sua linha doutrinária era pautada por Otávio Mangabeira, Adauto Lúcio Cardoso, Osório Borba, Eduardo Gomes e Eduardo do Prado Kelly, muito influentes no jornal. Por outro, sabe-se que em mais de uma ocasião políticos da base varguista tentaram comprar as ações de Orlando Dantas, majoritárias, na sociedade anônima que detinha o matutino, sem sucesso. Quanto ao período, aliás, Nelson Werneck Sodré, citando depoimento Freitas Nobre no livro “História da imprensa no Brasil”, afirma:

Os jornais passaram (...) por gosto ou a contragosto, a servir à ditadura. (...) O DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda) distribuía verbas a jornais e emissoras: “Jornais enriqueceram e jornalistas se corromperam, o quanto era possível enriquecer-se e corromper-se”. Entre os jornais empresariais, raríssimos foram os que não se corromperam. Constituiu exemplo digno de lembrança o caso excepcional do Diário de Notícias, do Rio, em que Orlando Ribeiro Dantas manteve atitude de compostura. (p. 439)


Em consequência a essa atitude, o Diário de Notícias sofreu uma piora em sua saúde financeira, acumulando dívidas que datavam da época de sua fundação. Mesmo assim, a folha se firmava como o principal órgão de imprensa de oposição na capital, mantendo, em 1939, a liderança nacional em circulação entre jornais matutinos – era um grande sucesso entre leitores de classe média. O jornal tinha forças para recusar a “ajuda” do governo, e, mesmo assim, se embrenhar em uma campanha contra a renovação do contrato da Loteria Federal, onde certas cláusulas beneficiavam concessionárias em detrimento do Tesouro. Em 1940, aliás, deixaram de ser publicados anúncios de famosos cassinos cariocas, iniciando-se uma campanha moral contra o jogo.

Sob forte censura, o periódico resistiu como pôde ao DIP, negando-se a tratar de assuntos repassados pelo mesmo e focando seu noticiário em acontecimentos internacionais. Isso, aliado ao seu histórico liberalismo e ao agravamento da Segunda Guerra Mundial em 1941, assuntos amplamente coberto em suas edições, levou o Diário de Notícias a se posicionar ao lado dos países Aliados. O jornal destacava as manifestações populares que pediam o ingresso do Brasil ao combate às potências do Eixo, sobretudo quando embarcações brasileiras foram atingidas por submarinos alemães no Oceano Atlântico, em 1942. Em agosto desse ano, com a declaração de guerra brasileira, tanto o governo quanto a folha viram-se, ironicamente, lado a lado. E o cerco da censura diminuiu.

O lento processo de redemocratização oriundo da participação do Brasil na Segunda Guerra começou, enfim, a se fazer sentir no Diário de Notícias. Já em 1943 o jornal colocou em pauta o chamado “Manifesto dos mineiros”, documento de oposição ao Estado Novo, posicionando-se favoravelmente ao mesmo. Em 1945 a folha já estava praticamente restabelecida em seu lugar de fiscalizadora do governo, avaliando a conjuntura política do período sem deixar de colocar em cheque a probidade da gestão de Vargas frente à redemocratização. No início desse mesmo ano, o matutino decidiu apoiar a candidatura do brigadeiro Eduardo Gomes, da UDN, ao pleito presidencial. A eleição de Eurico Gaspar Dutra, da coligação entre o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e o Partido Social Democrático (PSD), sustentado por Vargas, acabou sendo vista como imaturidade do povo para o exercício da democracia.

Dutra, por sua ligação com o governo anterior, foi recebido criticamente pelo Diário de Notícias, que não deixou de elogiar algumas medidas encaradas como benéficas pelo jornal: caso de certas medidas econômicas – sobretudo aquelas que favorecessem a aproximação brasileira com o capital norte-americano –, do combate ao comunismo e da criminalização do jogo do bicho. Tal linha política, que poderia ser vista como moderada, se esvaiu quando das novas eleições para a sucessão presidencial: momento em que uma nova candidatura de Getúlio Vargas começou a ser articulada. O editorial publicado a 29 de outubro de 1949 deixava claro que a antiga rixa com o Estado Novo ainda estava acesa: ali, Vargas era tratado como ex-ditador, fascista, incompetente e criminoso, em suma, “o inimigo número um da democracia brasileira”. Assim, a candidatura de Eduardo Gomes voltou a ser a opção do Diário de Notícias. A nova derrota udenista foi atribuída a atos de fraude, discurso sincronizado entre o partido e o periódico.

Durante o último mandato de Vargas o Diário de Notícias exerceu sua mais aguerrida oposição – chegando a publicar na íntegra o chamado “inquérito Miguel Teixeira”, sobre corrupção no governo Dutra, envolvendo o Banco do Brasil e grandes empresários. Em paralelo, curiosamente, Werneck Sodré relembra importante postura do matutino na época – sobretudo quanto à sua postura liberal de aproximação do Brasil com o capital estrangeiro, de preferência o norte-americano. Ali, cita-se o trecho de um discurso do deputado Euzébio Rocha pronunciado na Câmara em 1953 denunciando as relações de dependência financeira de órgãos da imprensa para com a Standard Oil do Brasil, onde, segundo Rocha,

Há pouco mais de um ano, a Standard Oil do Brasil mobilizou todos os seus recursos de propaganda e desencadeou forte campanha no sentido de obter para si a exploração das nossas reservas de petróleo. O Diário de Notícias, porque repudiasse em editoriais e em artigos de colaboradores aquelas pretensões antinacionais, foi sumariamente suprimido da programação de publicidade daquela importante empresa. (p. 498/499)


Com esta nova fase a pleno vapor – o Diário de Notícias se vangloriava então como “O matutino de maior tiragem na capital” –, um baque atingiu a folha de forma a gerar um verdadeiro divisor de águas em sua história: em 1º de fevereiro de 1953 morria Orlando Dantas, seu fundador e proprietário majoritário. Apontada como uma das causas do declínio que extinguiria com o matutino pouco mais de vinte anos depois, a perda automaticamente deixou os herdeiros de Dantas em seu posto: assumiam então sua viúva, Ondina Portela Ribeiro Dantas, e seu filho, João Portela Ribeiro Dantas. Mesmo assim, no expediente do matutino, o nome do fundador permaneceu como o do presidente da Sociedade Anônima Diário de Notícias, ao lado de M. Gomes Moreira e de Aurélio Silva, respectivamente o tesoureiro e o secretário do grupo.

A partir de 1953, apesar da ausência de Orlando Dantas, o Diário de Notícias manteve sua linha de oposição ferrenha a Vargas – este era, em verdade, um tema permanente em suas páginas, com grande e óbvio destaque ao atentado da Rua Toneleros, contra o líder de oposição Carlos Lacerda, datado de agosto de 1954. Quando do incidente, a folha publicava diariamente notícias, artigos e editoriais exigindo a punição dos responsáveis pela morte do major-aviador Rubens Vaz, que acompanhava Lacerda no momento em que fora alvejado. Conforme Gregório Fortunato, chefe da guarda pessoal de Vargas, era incluído na lista de acusados, o Diário de Notícias pedia ainda a renúncia do presidente – ver o editorial “O protetor dos criminosos”, publicado a 20 de agosto de 1954 –, apontado como responsável não só pelo assassinato, mas por todos os males pelos quais o Brasil atravessava.

Com a divulgação dos inquéritos e dos interrogatórios feitos na Base Aérea do Galeão, o acirramento da crise política e o suicídio de Getúlio Vargas, o Diário de Notícias novamente ofereceu um voto de confiança ao novo presidente empossado, Café Filho, para que se restabelecesse a ordem no país. No entanto, a postura do matutino manteve-se basicamente a mesma, já que nesse momento lutava contra os herdeiros políticos da Era Vargas. Foi nesse sentido que nas eleições presidenciais de 1955 o jornal reiterou seus laços com a UDN apoiando a candidatura de Juarez Távora e combatendo Juscelino Kubitschek de Oliveira, lançado pela coligação PSD-PTB. No desfecho de mais uma derrota nas urnas, o diário da família Dantas acabou se engajando na campanha que visava impedir a posse de JK, tanto sob o pretexto de que o candidato eleito não teria alcançado maioria absoluta de votos quanto sob a alegação de fraudes na apuração. No entanto, em breve a situação levaria o matutino a uma mudança de opinião. Segundo Marieta de Morais Ferreira, em verbete sobre o Diário de Notícias no “Dicionário histórico-biográfico brasileiro pós-1930”, no contexto que geraria o contra golpe de 11 de novembro de 1955,

O jornal encampou assim as declarações políticas do coronel Jurandir Bizarria Mamede advogando a anulação das eleições presidenciais, declarações essas que constituiriam o estopim para a intervenção militar do general Henrique Teixeira Lott visando garantir a posse dos candidatos eleitos. Nessa ocasião o Diário de Notícias ficou muito entrosado com os militares e passou a dar grande cobertura a todos os eventos ligados às forças armadas, chegando a criar uma coluna especializada, um noticiário de interesse dessa categoria. Diante da deposição em 11 de novembro de 1955, de Carlos Luz, que ocupava interinamente a presidência, pelas tropas do Exército, o Diário de Notícias declarou que fora "implantada no país uma situação legal. Revelavam-se golpistas efetivos os que nos acusavam de golpistas potenciais". (p. 1.851)


No degringolar da crise, a partir do início do mandato de Kubitschek, em janeiro de 1956, o diário foi voltando à carga. O otimismo de João Dantas, à época, era perceptível: em 1957 o jornal empreendeu um negócio arriscado: comprou o maquinário, a sede e o acervo do jornal O Mundo e da revista Mundo Ilustrado, de Geraldo Rocha. Sua redação, que funcionava no nº 11 da Rua da Constituição, passou no mês de novembro a um prédio de sete andares na Rua do Riachuelo, nº 114.

A nova linha oposicionista do Diário de Notícias calcava-se principalmente no fato de JK ser visto como uma figura comprometida com figuras que participaram do Estado Novo – significando grave falha na renovação do quadro político brasileiro –, entre outras coisas. Marieta de Morais Ferreira destaca a urgência de revitalização política no Brasil, segundo o Diário de Notícias, naquela época:

Visando contribuir para esse objetivo, em junho de 1958, por ocasião do seu 28º aniversário, o jornal lançou um manifesto intitulado “Um estudo sobre a revolução brasileira”. A partir da publicação desse documento, o matutino passou a apresentar novas propostas em relação ao ideário que sempre norteara sua conduta política. Dentre os vários tópicos colocados, começou a ser delineada uma linha política nacionalista que consistia na articulação de três pontos: limitações para o capital estrangeiro, eliminação da clemência para com as finanças internacionais e industrialização independente. Paralelamente, o jornal lançava uma proposta de modernização do campo através de uma reforma agrária que permitisse a integração das populações rurais e tornasse viável a criação de uma classe média rural. Para a concretização dessas propostas, o Diário de Notícias não sugeria caminhos ou fórmulas políticas, limitando-se ao seu tradicional antigetulismo ferrenho. (p. 1.851)


“Um estudo sobre a revolução brasileira” foi elaborado por uma equipe comandada por José Artur Rios e, além do que a autora destaca, propunha a nacionalização de indústrias de base e das empresas de rádio e televisão, bem como um programa de educacional de massa, para combater o analfabetismo.

Para o Diário de Notícias, enfim, apesar de já ter defendido esta ideia em 1931, a construção de Brasília era desnecessária, já que outros setores demandavam recursos com maior urgência. No mais, o presidente foi ainda acusado de má administração econômica, corrupção e aventureirismo. Seu ministro da Guerra, Henrique Lott, também era alvo especial do periódico – algo que chegou a lhe valer um processo. Com a posse de Lott no Ministério da Aeronáutica, como interino, em novembro de 1958, o jornal publicou uma matéria intitulada “Crise na FAB”, onde afirmava que oficiais da corporação não haviam comparecido à cerimônia de posse por oposição à indicação do ministro. Lott acabou pedindo providências ao Ministério da Justiça, alegando que o diário deturpava fatos em serviço de um motim que visava subversão armada, e foi atendido: o Diário de Notícias fora enquadrado na Lei de Segurança Nacional. No entanto, meses depois, o Supremo Tribunal Federal determinou a inaplicabilidade da Lei no caso, levando às prescrição do processo.

O Diário de Notícias finalmente apoiou um candidato à presidência da República que sairia vitorioso quando optou por Jânio Quadros, do Partido Trabalhista Nacional (PTN), ao pleito de 1960. Como viesse de fora dos esquemas políticos tradicionais, este era visto como o nome ideal para pôr em prática o programa detalhado em “Um estudo sobre a revolução brasileira” – o próprio candidato chegou a receber uma cópia do mesmo, das mãos de João Dantas, que se revelava praticamente um cabo eleitoral de Quadros. O jornal, então, deu apoio integral à candidatura de tal maneira que chegou a aplaudir a postura do presidenciável de procurar reatar as relações diplomáticas do Brasil com países comunistas, visando abertura de novos mercados. Logo após a posse, em janeiro de 1961, surgiram divergências: o Diário de Notícias não concordava com a escolha do novo ministério por julgá-lo contra as necessidades brasileiras e incompatível com o próprio presidente. Mas, mesmo assim, o jornal veio a defender as grandes questões colocadas pelo governo, principalmente no plano econômico e no planejamento de uma política externa independente – chegando mesmo a ver com bons olhos a condecoração de Ernesto “Che” Guevara por Quadros.

A breve fase governista do Diário de Notícias, ao contrário do que possa parecer, não rendeu bons frutos ao mesmo. Sua linha política tradicional, de oposição, tinha naturalmente se transfigurado, e os gastos com a construção de uma nova sede agravara a situação financeira do periódico. Na crise de identidade, com a renúncia de Jânio Quadros, em agosto de 1961, o Diário de Notícias não só defendeu a posse do vice-presidente João Goulart como apoiou suas propostas para as reformas de base – caindo em contradição, portanto, com seu histórico antigetulismo. O afastamento entre o jornal e o governo Jango só se deu com o surgimento do movimento político-militar responsável pelo golpe de 1964. Na ocasião, o matutino, ironicamente, mostrava-se aliviado com o fim de um governo que não obedecia a Constituição sob o pretexto das reformas.

Da mesma forma que com a Revolução de 1930, os anseios do Diário de Notícias para com os desdobramentos do golpe civil-militar não foram atendidos. Conforme o governo recém-instalado ia tomando suas primeiras atitudes, o jornal ia se aproximando da oposição. Durante a gestão de Castelo Branco, seu noticiário fez eco ao discurso crítico de Carlos Lacerda, outra figura pró-golpe e naquele ponto na oposição, sendo simpático à ideia de construção de uma “frente ampla” que também contaria com Juscelino Kubitschek e João Goulart. No governo Costa e Silva o matutino ainda se opôs à legalização do jogo do bicho, encabeçada pela primeira dama, Yolanda, postura que lhe rendeu desprestígio junto ao poder. O Diário de Notícias acabou sob intervenção dos órgãos de repressão, a partir de 1970.

Ao longo desses percalços, a crise do periódico começava a se fazer mais visível. A fragilidade da empresa levou ao surgimento de inúmeros boatos sobre sua venda a certos grupos econômicos. O jornal, em verdade, estava praticamente falido. Afinal, em 1970, por U$ 500 mil João Dantas o passou às mãos do deputado Ricardo Fiúza, em negociação articulada pelo ministro da Fazenda Delfim Netto. O grande fator motivador da transação foi a boa vontade do presidente Emílio Garrastazu Médici para com o Diário de Notícias, folha a qual se acostumara a ler, na mocidade. A transferência da titularidade ocorreu somente em 1972, tendo o jornal ficado, nesse intervalo de dois anos, sob intervenção de um funcionário de Netto.

Olímpio de Campos, representante do grupo TAA, ligado ao governo, assumiu a empresa em julho de 1974. Campos procurou reformular o Diário de Notícias como folha pró-governo militar, mas sua iniciativa apenas deu uma sobrevida ao jornal, suspenso definitivamente no final de 1976. Sua edição derradeira foi a de nº 14.747, do dia 10 de novembro daquele ano.

Ao longo de sua existência, o Diário de Notícias contou com colaboradores e jornalistas de calibre. Além da importante marca que Cecília Meireles deixara na seção “Diário escolar”, o matutino contou com Mário de Andrade, Augusto Frederico Schmidt, Álvaro Moreira, Alceu Amoroso Lima, Luís da Câmara Cascudo, Afonso Arinos de Melo Franco, Josué de Castro, Sérgio Buarque de Holanda, Rachel de Queiroz, Graciliano Ramos, Gilberto Freyre, Jorge de Lima, Rubem Braga, Otto Lara Resende, Agripino Grieco, Afonso Arinos, Guilherme de Figueiredo, Luís da Câmara Cascudo, Viriato Correia, Eneida de Morais, Pomona Politis, Villas-Boas Corrêa, Gustavo Corção, Alves de Souza (editorialista, antigo proprietário do jornal O Paiz), Joel Silveira, Maria Lúcia Amaral, Adonias Filho, Edson Lobão, Fernando Segismundo, João Batista Ramos, Maurício Vaitsman, Hélio Rocha, J. C. Heitor, José Dias, Gilvandro Gonçalves Gambarra, Fernando Leite Mendes, Adail José de Paula, Hélcio Martins, Nilson Viana, Hélio Fernandes, Pedro Bloch, Mário Barata, Ibrahim Sued, Luiz Luna, Edson Braga, Vanderlino Nunes, Rui Medeiros, Aurélio Lacerda, Barbosa Nascimento, Orlando Nóbrega, Osório Borba, Heráclio Salles, Prudente de Moraes Neto, Sales Neto, Expedito Quintas, Luiz Macedo, René Amaral, Mílton Pinheiro, Mário Vale, Osvaldo de Castro, Ítalo Vivone, Idalício Mendes, Nilo Dante, Tobias Pinheiro, Raul Giudiccelli, Ana Maria Funke. Hugo Dupin, Campanella Neto, Carlos Newton, Jussara Martins, Roberto Moura, Carlos Barbalho, Alberto Nunes, Íris Ágata, Agenor Soares de Moura, entre vários outros.

Fontes:

- Acervo: edições do nº 1, ano 1, de 12 de junho de 1930, ao nº 14.747, ano 46, de 10 de novembro de 1976.

- FERREIRA, Marieta de Morais. Diário de Notícias. In: Dicionário histórico-biográfico brasileiro pós-1930, vol. 2. Coord. ABREU, Alzira Alves de... [et al.]. Rio de Janeiro: Editora FGV; CPDOC, 2001.

- LEITÃO, César. Apontamentos históricos do Diário de Noticias (30º aniversário). Rio de Janeiro: Editora do Diário de Notícias, 1960.

- Rio de Janeiro (Cidade). Secretaria Especial de Comunicação Social. Diário de Noticias: a luta por um país soberano. Cadernos da Comunicação. Série Memória. Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro: A Secretaria, 2006.

- SODRÉ, Nelson Werneck. História da imprensa no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966.