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Festas tradicionais | Bumba meu boi (30 de junho)

30 jun 2021

Artigo arquivado em Festas Tradicionais
e marcado com as tags Biblioteca Nacional, Bumba meu boi, Festa Junina, Folclore, Mito

Bumba meu boi, Boi bumbá, Boi de mamão, Boi pintadinho, Boi calemba, estas são algumas, entre tantas outras denominações que constituem o folclore do boi, celebração ocorrida pelo país durante os festejos juninos. A diversidade das denominações expressa os regionalismos e sua riqueza cultural.

O Bumba Meu Boi é conhecido como uma dança, que chega ao Brasil e é adaptada pelas culturas africanas e indígenas. Trata-se de um ato, da representação de uma fábula, cujo personagem-chave, o boi, atua como artefato mítico e elemento cênico central para o desenrolar da trama.

Entre as origens, as influências ibéricas dão conta de uma tradição, que associa os festejos do boi às festas do solstício de verão da Roma Antiga e às colheitas realizadas entre os dias 24 e 25 de junho do calendário romano. Tempos depois, o calendário cristão destinaria as celebrações à São João Batista, protetor do boi.

Existem muitas referências ao folclore do boi com os festejos realizados no sul de Portugal. Há também semelhanças nas celebrações ocorridas em algumas regiões da África. Associações mais remotas apontam para o culto à Osíris, deus da fertilidade e cultivo da terra na mitologia egípcia, sendo o Boi Ápis o seu símbolo totêmico.

Durante a escravidão no Brasil, a ocorrência dos folguedos cumpria importante papel nas sociabilidades dos tempos coloniais. O bumba meu boi e a sua representação mobilizavam as camadas populares, que faziam da dança um passatempo lúdico, os ajudando a suportar as agruras e afastar o banzo causado pela sua condição servil.

O boi-artefato, baila em frenesi, conduzindo os personagens em um jogo cênico que anima os brincantes, e se estende por toda a comunidade. Luís da Câmara Cascudo, no seu “Dicionário do folclore brasileiro” informa a origem africana da palavra bumba (congolês) que significa pancada, golpe, batida.

Muitos são os relatos que apresentam as passagens das primeiras festas no Brasil. Mas, o mais conhecido, data da dominação holandesa em Pernambuco no século XVII. Apelidado “Boi voador”, o episódio remontaria um folguedo ocorrido no Recife antigo.

Também muitas são as versões sobre a lenda do boi. A mais conhecida narra a história de pai Francisco, que, a pedido de mãe Catirina grávida, rouba o boi da fazenda do mestre, para atender a amada, que ansiava comer língua de boi. O plano é descoberto pelo mestre, que condena pai Francisco, salvo com a ajuda de um índio curandeiro, que ressuscita o boi para o alívio de todos.

O mito do boi, a morte e sua ressureição revelam as mandigas, as habilidades e as estratégias praticadas pelos subordinados a fim de assegurar a sua sobrevivência. O envolvimento de personagens negros (pai Francisco e mãe Catirina), branco (mestre, ou amo do boi) e indígena (curandeiro), são, em contrapartida, mobilizados de forma a construir uma fábula forjada, característica da pretensa ideia de unidade cultural da nação.

Como produção narrativa, a criação do bumba meu boi e suas variantes também sinaliza as diferentes vivências fabricadas em termos regionais.

No Maranhão, o bumba meu boi representa a identidade cultural da região. Em 2011 recebeu do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) o título de Patrimônio Cultural do Brasil, e em 2019 conquistou o título de Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO. O folclore do boi está presente em todo estado. São mais de 250 grupos que organizam manifestações dedicadas ao culto do boi.

No norte do país, a famosa disputa de bois bumbás entre Garantidos e Caprichoso, ocorrida em Parintins desde 1965, ganha cada vez mais ares profissionais. Ali se desenvolve um verdadeiro polo cultural e turístico e uma indústria, que vai desde a confecção de indumentárias e instrumentos musicais à produção e comercialização de material audiovisual, engajando a comunidade o ano inteiro.

Da década de 1990 em diante, cresce a participação de mulheres no desempenho de inúmeras funções. Não apenas na confecção de adereços e figurinos, mas também na participação das danças e toadas, tocando instrumentos até então destinados apenas a homens.

Para além da pirotecnia envolvida, o bumba meu boi e suas derivações segue como um conjunto de atividades significativas no cotidiano das comunidades locais, que assim como o carnaval, estruturam e organizam a vida.

O rito do boi bumbá sintetiza sentimentos caros a essas comunidades, que, a cada ano, renovam nos festejos do boi a certeza do valor de brincar.

Na imagem, publicação da Fon fon de 1908, representando um folguedo do boi durante o natal. De acordo com o calendário católico, os festejos do boi se concentram na região norte durante as festas juninas, mas também se comemora durante o natal, precedendo a folia de reis, evento comum, principalmente na região nordeste.