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História do Livro | A Typographia Universal dos Laemmert

27 mar 2021

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Uma das casas impressoras de maior destaque a se estabelecer no Rio de Janeiro, na primeira metade do século XIX, foi a dos irmãos Edward e Heinrich Laemmert.

Mais conhecidos pelas formas abrasileiradas de seus nomes -- Eduardo e Henrique –, os irmãos nasceram no Ducado de Baden, Alemanha, filhos de um pastor protestante. Eduardo, que trabalhara numa tipografia em Paris, foi o primeiro a vir para o Rio de Janeiro, onde passou algum tempo à frente da filial de uma loja francesa até abrir a sua própria, a Livraria Universal. Em 1837 regressou à Europa para comprar máquinas impressoras e, no ano seguinte, fundou, com o irmão Henrique, a firma E. & H. Laemmert, voltada para o comércio de livros e partituras musicais.

Ainda em 1838, os irmãos inauguraram a Typographia Universal e passaram a fazer suas próprias edições. Desde o início, o empreendimento foi um sucesso: no início da década de 1860, a tipografia contava com mais de cem empregados, uma oficina de encadernação e trabalhava com máquinas movidas a vapor.

Veja um catálogo da livraria dos irmãos Laemmert, possivelmente de 1859 ou 1860, pertencente ao acervo da Divisão de Obras Raras. Os livros anunciados também são vendidos noutra loja, localizada em Salvador.

Segundo Laurence Hallewell, autor de “O Livro no Brasil”, por essa época a firma dos Laemmert havia publicado cerca de 400 títulos, incluindo periódicos. Um dos mais conhecidos é o semanário “Correio das Modas” (1839-1840), que trazia artigos sobre moda, bailes, teatro e variedades e contava com colaboradores tão ilustres como Martins Pena e Gonçalves Dias.

Veja o Correio das Modas na Hemeroteca Digital.

As publicações mais conhecidas da Typographia Universal são as Folhinhas e o Almanak Laemmert.

As Folhinhas eram edições populares, de pequeno formato e grandes tiragens, que todos os anos eram reimpressas com informações atualizadas; já eram publicadas no Brasil desde 1824 por editores como Ogier e Plancher, e continuaram a sê-lo por vários outros, tais como Francisco de Paula Brito. As dos irmãos Laemmert surgiram em 1839 e tinham temas variados. Ana Laura Donegá, em pesquisa da FAPESP, afirmou que a primeira parte das folhinhas trazia informações sobre o redator, calendários, uma retrospectiva do ano anterior, enquanto a segunda metade tratava de assuntos específicos; estes determinavam o título daquela edição e iam desde saúde e ciência até anedotas e textos de ficção moralizantes. A publicação fez tanto sucesso que, na década de 1860, tinha atingido a tiragem de 100.000 exemplares, além de merecer citações numa crônica de José de Alencar e no romance “A Carteira de Meu Tio”, de Joaquim Manuel de Macedo.
Por sua vez, o Almanak Laemmert, lançado em 1844, pretendia, nas palavras dos editores, poupar o tempo gasto pelos leitores a descobrir onde se encontravam casas comerciais, missões diplomáticas, escritórios de advogados e outros estabelecimentos. Sua primeira edição trazia extensas listas de membros da família real, detentores de títulos de nobreza, funcionários públicos, bem como os endereços de várias instituições culturais, lojas e indústrias. As edições seguintes foram ampliadas com outras informações, e o Almanak cresceu não apenas em volume – chegando a alcançar mais de mil páginas – mas também em formato, passando dos 10 x 15 cm iniciais para 14 x 22 cm. Com cerca de 400 assinantes em algumas edições, no final do século XIX circulava em todo o Brasil, e também teve citações ilustres: por Machado de Assis, em “Iaiá Garcia”, e num conto de Monteiro Lobato, publicado em seu livro “Urupês” (1918).

Veja o Almanak Laemmert em suas edições de 1891 aos anos 1940. Os editores já eram outros, mas o nome se mantinha.

Conhecidos por seu tino comercial, os irmãos Laemmert investiram na publicação de romances populares, inicialmente apenas traduzidos, como “Carlos Magno e os Doze Pares de França” e as obras de Eugène Sue. Quando o mercado se mostrou favorável, passaram a publicar também autores brasileiros. Algumas vezes se associavam a outros editores e livreiros, como ocorreu em 1845, quando se uniram a Paula Brito e outros comerciantes para anunciar uma subscrição que financiaria nova edição de “A Moreninha”. Por outro lado, mantiveram ao longo de décadas uma rivalidade com a Livraria Garnier, instalada na mesma rua do centro do Rio de Janeiro, que funcionou a partir de 1844.

Eduardo Laemmert se retirou dos negócios em 1870, ao passo que Henrique trabalhou até 1884, ano de sua morte. A empresa se manteve em atividade até 1909. Ao deixar definitivamente a edição de livros, sua produção, segundo Hallewell, totalizava 1.440 trabalhos de autores brasileiros e mais de 400 obras traduzidas de quatro idiomas, sobre os mais diferentes assuntos. Assim, os irmãos Laemmert e sua Typographia Universal deixaram uma marca perene na história do livro no Brasil.


Ilustração de Correio das Modas.