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História do Livro | Aldo Manuzio e as edições de bolso

17 jul 2020

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O surgimento da imprensa e sua disseminação contribuíram para a ampliação do público leitor em toda a Europa, consolidando as tendências apontadas desde o século XIII pelo movimento humanista. A cultura escrita já não estava restrita aos mosteiros, tampouco às universidades: a demanda se estendeu a outras classes da população urbana, principalmente comerciantes e artesãos.

Para atendê-los, os impressores começaram a produzir edições mais baratas, o que já se observava com os livros xilogravados, utilizados para transmitir ensinamentos religiosos. A par de edições luxuosas, finalizadas à mão e que em pouco de diferenciavam dos livros manuscritos, surgiram coleções de volumes menores, com preços que cabiam nos bolsos (ou melhor, nas bolsas) das classes burguesas e que logo se tornaram muito apreciados.

Nesse período, ganhou destaque o nome do italiano Teobaldo Manucci, que passou à História como Aldo Manuzio, ou, em latim, Aldus Manutius (1449 – 1515). No final da década de 1480, depois de estudar em Roma e em Ferrara, Manuzio se estabeleceu em Veneza com uma tipografia, em torno da qual gravitava um grupo de estudiosos do Grego e da cultura clássica. Em 1495 produziu seu primeiro livro, uma edição da gramática grega “Erotemata”, de Constantino Lascaris, e até 1498 publicaria obras de Aristóteles, Teócrito e Aristófanes. As edições eram cuidadosamente cotejadas, a fim de manter sua fidelidade ao original grego. Também foram produzidas obras em Latim, Hebraico e na língua italiana vernácula.

A partir de 1499, Manuzio se deparou com alguns problemas: uma crise econômica, que dificultou o financiamento dos livros, e a morte de Pierfrancesco Barbarigo, sócio e investidor da tipografia. Era preciso encontrar meios de manter a empresa funcionando – e, ao perceber a crescente demanda por livros mais acessíveis, Manuzio decidiu imprimir uma coleção de obras gregas e latinas em pequeno formato. E qual seria esse formato? O chamado in-octavo, que significa “pela oitava vez”. Para produzi-los, imprimiam-se 16 páginas de texto, que eram dobradas três vezes, de forma a obter oito folhas impressas. Manuzio adotou esse método para sua coleção, que incluiu obras de Platão, Xenofonte, Esopo, Horácio, Virgílio e muitos outros clássicos. Adotou, também, um formato de letra, baseado no modelo caligráfico e desenvolvido pelo gravador Francesco Griffo, que permitia mais caracteres por página – um tipo que ficaria conhecido como “itálico” e é largamente utilizado até hoje.

As edições populares de Manuzio agradaram em cheio ao público. Sendo menores e fáceis de carregar, eram muito apreciadas por pessoas que faziam viagens frequentes, como mercadores e alguns funcionários; adotou-se o costume de presentear amigos com livros da coleção. Com isso, as tiragens eram elevadas, chegando a 3.000 exemplares. O sucesso do veneziano encorajou outros impressores a também publicar em pequenos formatos, tanto clássicos latinos como romances de cavalaria e, algumas décadas mais tarde, livros de autores renascentistas.

Aldo Manuzio editou cerca de cento e cinquenta títulos até 1415. Seu trabalho foi continuado pelos cunhados e, mais tarde, por seu filho, Paolo (1512 – 1574), e pelo neto, Aldo, o Jovem (1547 – 1597), especialistas em Latim e em obras latinas. Até 1595, a Tipografia Aldina – identificada desde 1501 por um logotipo que representava um golfinho em torno de uma âncora – foi responsável pela impressão de cerca de 1.000 títulos, contribuindo para a disseminação do humanismo e deixando uma marca perene na História do Livro e da própria cultura.

Veja um dos livros editados por Aldo Manuzio em 1498, contendo as cartas do escritor italiano Angelo Poliziano (1454 – 1494), entusiasta da cultura clássica. O exemplar está incompleto, e não é um dos in-octavo que tornaram famosa a Tipografia Aldina: mede 29 cm. Também é anterior ao uso do itálico e da marca da âncora e do golfinho. O livro provém da Real Biblioteca e está sob a guarda da Divisão de Obras Raras.


http://objdigital.bn.br/objdigital2/acervo_digital/div_obrasraras/or813946/or813946.pdf