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Literatura | Joseph Conrad, o romancista do mar

03 ago 2020

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Joseph Conrad (nascido Joseph Konrad Korzeniowski na Rússia polonesa em 1857) morreu subitamente de ataque cardíaco há 96 anos, em 3 de agosto de 1924, em sua casa de campo de Bishopsbourne, próximo a Canterbury (Inglaterra). Tinha 66 anos, trinta dos quais passou navegando e outros trinta escrevendo.

Familiarizado com os tufões do mar da China e as águas de todos os mares, Joseph Conrad, antigo comandante de navios, fez-se novelista da Grã-Bretanha, inopinadamente, para os outros e para si mesmo, à volta dos trinta e cinco anos. Até hoje, livros seus como O coração das trevas, Lord Jim, O agente secreto e Linha de sombra continuam a intrigar críticos e cativar leitores, por sua estranha poesia e pela profunda investigação do sentido trágico da existência humana.

O mar foi o maior inspirador e o principal cenário de seus romances e contos. Sua literatura, como escreveu Otto Maria Carpeaux em A Cinza do Purgatório, é a tentativa desesperada de iluminar as trevas, para pôr em ordem o caos e o poderoso símbolo deste caos é o mar, metáfora da vida humana. Neste sentido, um homem que nasce cai num sonho como se cai no mar (Ver Hamilton Nogueira, Síntese da visão do mundo e da ética de Conrad).

Conrad converteu o mar numa moral. Fez questão de compreendê-lo como a encarnação do caráter de prova suprema para a hombridade do homem. Em sua concepção, o mar tem o privilégio de magnificar a coragem, pois só a luta desigual dá a medida de nossa grandeza, a fronteira última da bravura humana. Nele estão os limites das situações limítrofes em que exercitamos nossas ignoradas reservas de heroicidade. Por isso, seus heróis, transfigurados e surpreendidos pelo estrépito das potências naturais, revelam o conteúdo singular de seu temperamento, aquela concentração de elementos morais que fazem com que um Lord Jim, um Marlow, um Almayer sejam mais do que simples marinheiros, mais do que meros comparsas de um romance de aventuras marítimas, mas verdadeiros homens (Ver Ascendino Leite, O Universalismo de Joseph Conrad). O visível na prosa conradiana é a disposição do homem em assumir, seja em que circunstância for, o lugar que lhe compete na luta contra as intempéries da existência. Seus romances exaltam a nobreza dos sentimentos e o senso do dever mesmo em face da adversidade.

Conrad foi o romancista que viu o mar como o grande educador do homem: encerrando todas as possibilidades de vitória ou de derrota. Escuridão e grandeza lutam pelo domínio da alma humana. Recorde-se do conto "Juventude", onde o escritor anglo-polaco põe as seguintes palavras na boca do Capitão Marlow: "há viagens que parecem encomendadas para ilustração da vida, que podem tornar símbolo da existência."

Na perseguição dos escaninhos da alma humana, o respeitado estilista da língua inglesa, a despeito de sua origem polonesa, foi um observador perspicaz e penetrante da condição humana nas situações mais comuns e mais extremas. E por maior que tenha sido a preocupação de situar os acontecimentos de suas narrativas fora do plano religioso, não admitindo qualquer código de ética que não tivesse as suas raízes senão na consciência de cada indivíduo, a verdade é que a marca cristã, católica, transparece a cada instante nas suas obras, por maior que seja o seu esforço para apagá-la. (Cf. Hamilton Nogueira, Síntese da visão do mundo e da ética de Conrad)
Quando Conrad faleceu, seu amigo Richard Curle, pôde vê-lo morto: "Seu rosto era inimaginavelmente nobre e belo. Todos os estragos e todo o sofrimento tinham-se apagado dos seus traços, onde se inscreviam uma serenidade e um desprendimento profundos."

Em 15 de novembro de 1981, o Suplemento Literário do Estado de São Paulo publicou uma entrevista imaginária com Joseph Conrad, elaborada por Rubens Teixeira Scavone. Nela, o romancista do mar expõe as linhas que sustentam a trama de suas narrativas: http://memoria.bn.br/DocReader/098116x/10140