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Livros de Aventura | As Viagens Extraordinárias de Júlio Verne

02 dez 2022


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Mais conhecido como um dos pais da Ficção Científica, Júlio Verne também pode ser considerado um autor de livros de aventura, criador de dezenas de histórias empolgantes em meio às quais veiculava o saber científico e lançava questionamentos sobre o futuro.

Jules Gabriel Verne (Nantes, 1828 – Amiens, 1905) era filho de um magistrado e cresceu junto ao porto, o que talvez tenha estimulado seus sonhos e especulações a respeito de terras distantes. Tentou, inclusive, embarcar escondido para a Índia aos 11 anos de idade, mas foi interceptado pela família. Mais tarde, estudou Direito em Nantes e Paris, e por essa época escreveu seus primeiros trabalhos: tragédias em versos, peças de teatro e libretos para operetas. Tornou-se amigo de Alexandre Dumas, filho, que o ajudou a produzir uma peça, e a partir de 1851 começou a publicar novelas de aventura. Entre elas, “Uma Viagem em Balão”, que saiu na revista “Musée des Familles” e é considerada seu primeiro trabalho de ficção científica. Outras histórias e artigos se seguiriam, cimentando a proposta de criar um novo gênero literário, a “novela científica”. Isso foi encorajado por nomes de peso, tanto ligados à Literatura, como os dois Alexandre Dumas, quanto à Ciência, como o geógrafo e explorador Jacques Arago.

Em 1856, Júlio Verne se casou com Honorine de Viane Morel, viúva e mãe de duas filhas. Em 1861 nasceu seu único filho, Michel. No ano seguinte, conheceu o editor Pierre-Jules Hetzel, que planejava editar uma revista de histórias que combinassem ciência e entretenimento. Com ele Júlio Verne firmou um contrato de longa duração, que resultou na série de romances e livros de contos intitulada “Viagens Extraordinárias”. A coleção teve 54 volumes entre 1863 e 1905, os quais, a exemplo do que ocorria com os romances de autores brasileiros, saíam de forma seriada antes de serem publicados em monografia. E, uma vez que Hetzel tinha ligações com editores de outros países, várias dessas obras apareceram quase simultaneamente em versões traduzidas.

Veja um capítulo de “Aventuras do Capitão Hatteras”, que narra uma viagem ao Pólo Norte, publicado no Jornal do Brasil, 1867.

Os romances e contos publicados na série “Viagens Extraordinárias” são narrativas de viagens e de aventura nas quais se inserem informações sobre História, Geografia, Geologia, Astronomia e outros campos científicos. Os cenários são os mais variados, incluindo o espaço sideral de “Da Terra à Lua” (1865), as profundezas do mar, em “20.000 Léguas Submarinas” (1870), e diferentes regiões da Terra. O Brasil é contemplado em “A Jangada”, publicado em 1881, no qual o autor narra uma viagem ao Rio Amazonas a bordo do que descreveu como “um grande trem de madeira”. Para escrever essas histórias, Verne não apenas fez pesquisas criteriosas como realizou viagens -- mas, compreensivelmente, não chegou a conhecer boa parte dos lugares descritos.

Embora a Academia Francesa o tenha rejeitado, a princípio, como “escritor popular, voltado para o entretenimento”, Júlio Verne não tardou a angariar leitores e admiradores em vários países. Muitos editores entraram em contato com Hetzel para comprar os direitos de tradução e dos clichês para reprodução de ilustrações de suas obras. Valéria Cristina Ferreira, da UFG, menciona a compra de ilustrações pela Espanha, Rússia, Inglaterra, Itália, Alemanha, Portugal, Holanda, Turquia, Suécia, Grécia e Áustria, apenas entre 1869 e 1897. No Brasil, o periódico “Leitura do Domingo” adquiriu as ilustrações do romance histórico “Miguel Strogoff” em 1876, mesmo ano em que a Livraria e Editora Garnier publicou a obra no formato livro. A Garnier foi, aliás, responsável pela publicação de 21 dos livros de Júlio Verne no Brasil, que eram traduzidos e impressos no Rio de Janeiro. Ao mesmo tempo, circulavam outras edições em português, destacando-se a da tipografia lisboeta de David Corazzi. As obras eram muito populares entre os jovens, e sua leitura era estimulada pelos pais que desejavam despertar em seus filhos o gosto pela ciência e pelo conhecimento.

Veja uma carta de Euclides da Cunha a seu filho, que estudava em colégio interno, encaminhando livros de Verne para ler no recreio (Divisão de Manuscritos).

Apesar de seu entusiasmo com os avanços da Ciência – chegou a antecipar algumas invenções e sugerir aperfeiçoamentos em aparatos tecnológicos, tais como os escafandros --, Verne estava atento às questões do seu tempo e aos problemas que poderiam surgir para a Terra e para toda a humanidade. Temas como o desejo de liberdade de alguns povos, o colonialismo, o capitalismo e as guerras entre nações aparecem em suas obras. Algumas eram tão pessimistas que foram rejeitadas pelo editor Pierre Hetzel. Ele chegou a flertar com a distopia, como no conto "O Eterno Adão" (publicado em 1910), em que um historiador descobre que a civilização do século XX foi destruída por abalos geológicos. As indagações surgem até mesmo nos livros onde predomina a aventura: em "20.000 Léguas Submarinas", o Capitão Nemo se mostra descontente com os rumos tomados pela civilização, da qual escolhe se isolar a bordo do "Nautilus".

Veja um resumo de “20.000 Léguas Submarinas”, ilustrado por Cícero Valladares, em “O Tico-Tico”, 1934.

Veja uma versão em quadrinhos do romance histórico “Miguel Strogoff, o correio do Czar” no Suplemento Juvenil, 1940.

Júlio Verne morreu em 1905. A série “Viagens Extraordinárias” ainda teve oito volumes publicados de forma póstuma, com várias intervenções feitas por seu filho Michel. Em 1989 saiu pela primeira vez “Paris no Século XX”, escrito na década de 1860, cujo manuscrito original foi encontrado por um bisneto de Verne.

Um dos autores mais difundidos e traduzidos de todos os tempos, Júlio Verne até hoje é lido e amado por leitores de todo o mundo. Além de terem tido inúmeras edições, suas obras foram transpostas para várias mídias. Entre os livros mais adaptados estão “20.000 Léguas Submarinas”, “Viagem ao Centro da Terra” e “Volta ao Mundo em 80 Dias”, cujos cenários, premissas e personagens foram homenageados, revisitados e serviram de inspiração a inúmeros criadores de histórias de aventura, fantasia e ficção científica.



“OTico-Tico”, 1934.