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Memória | A tradicional Confeitaria Colombo

25 set 2021

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No início do século XX, não era comum que mulheres cariocas frequentassem restaurantes, cafés e muito menos bares. Mas as confeitarias eram locais considerados adequados e a Confeitaria Colombo, a preferida. Mulheres e crianças enchiam os salões no horário da tarde, considerado o horário das famílias. Às cinco e meia, o público mudava. Começavam a chegar os intelectuais, os políticos, as “cocotes” francesas. Nas mesas, o sorvete era substituído pelas bebidas, o barulho tomava conta do ambiente. Quem nos conta isso tudo é Luís Edmundo, ele mesmo um frequentador do local, em seu livro “O Rio de Janeiro do meu tempo”. Fundada em 17 de setembro de 1894 pelos portugueses Joaquim Borges de Meireles e Manuel José Lebrão, em um antigo sobrado da rua Gonçalves Dias, a Colombo rapidamente conquistou a população, se tornou um ponto de encontro, virou música (quem não se lembra dos “velhos na porta da Colombo”?) e resistiu ao tempo. Funcionando no mesmo local até hoje, sua arquitetura e ambiente, com enormes espelhos de cristal e móveis de madeira esculpida permitem uma viagem no tempo até a Belle Époque carioca. “A verdade é que quem escrevesse a história da Confeitaria Colombo – escreveria uma grande parte da história do Rio de Janeiro”.


Em 1894, a Revista Ilustrada publicou um artigo sobre a transformação da rua Gonçalves Dias, que estava se tornando “uma rua chic, uma rua muito concorrida, uma rua da moda, enfim”. Entre as novas casas de luxo, se destacavam lojas de moda e de artigos de viagens, chapelarias e, claro, a Colombo, uma casa “verdadeiramente parisiense”. À época, o estabelecimento era composto, além do restaurante, por uma fábrica de doces, armazém e uma refinaria de açúcar. Em 1898, Meireles se afastou do negócio, ficando como sócio comanditário, e Lebrão assumiu o controle da firma. Este logo mudou a refinação de açúcar e a fábrica de doces para outro local. Em seguida, reformou os salões do interior, transformando o estabelecimento na luxuosa confeitaria em estilo Art-Nouveau que conhecemos hoje. Já em 1900, as melhorias viravam notícia, com as novas vitrines e os salgados expostos em bandejas de cristal. Em 1914, a revista Careta destacava as modificações do estabelecimento com os enormes espelhos trazidos da Antuérpia, emoldurados por frisos de jacarandá e luxuosos móveis. Em 1922, as instalações foram ampliadas com a construção de um segundo andar, onde passou a funcionar um salão de chá, com painéis embutidos nas paredes e uma clarabóia abrindo para o térreo. É desta época também, a instalação dos elevadores, ainda em funcionamento.

Mas a grande popularidade da confeitaria muito se deve à transferência da roda de escritores e poetas liderada por Olavo Bilac, da antiga confeitaria Pascal para a Colombo. A roda de Bilac, da qual faziam parte, entre outros, Emílio de Menezes, Luis Edmundo e Bastos Tigre, transformou o local em centro da vida literária da cidade. A presença dos escritores atraía também frequentadores e era estimulada por Lebrão, que permitia que contas fossem “penduradas” e até mesmo pagamentos fossem realizados com anúncios em versos. Em um desses sonetos escritos nas mesas da confeitaria, Emílio de Menezes se referiu à Colombo como “sucursal da Academia”. Lebrão, que dirigiu o negócio por 18 anos, também costumava comemorar o aniversário da casa com festas memoráveis e fartas e, à época, os literatos diziam que “à 17 de setembro não há ninguém pobre”.

Os companheiros de Olavo de Bilac foram as primeiras figuras públicas a frequentar a confeitaria, mas não os únicos. Por suas mesas passaram Chiquinha Gonzaga, Getúlio Vargas, JK, Villa-Lobos, José Lins do Rego (que, na década de 50, almoçava quase diariamente na confeitaria), entre muitos outros. Por todo o século XX, a Colombo foi ponto de encontro de literatos, jornalistas, cronistas esportivos, músicos e políticos, se transformando numa referência na vida social, literária e política da cidade.

Ao longo do tempo, a Colombo cresceu e se expandiu. Em 1927, a fábrica de doces ganhou um edifício próprio, para fabricação de compotas, geléias e doces de frutas, como as famosas goiabada e marmelada. Em 1934, foi inaugurado um anexo na rua 7 de Setembro, para venda de conservas, charcutaria e bebidas finas. No ano seguinte, a confeitaria lançou a novidade do “almoço ligeiro” e, em 1945, foi inaugurada uma filial em Copacabana.

O prédio da rua Gonçalves Dias foi tombado, em 1983, como patrimônio material pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultura (NEPAC) e, em 2017, como patrimônio imaterial, pelo Instituto Rio Patrimônio da Humanidade.

Confeitaria Colombo em 1914 (Revista Careta, nº 327 – 26/09/1914)