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Música | Kid Morengueira

01 nov 2020

Artigo arquivado em Música
e marcado com as tags Biblioteca Nacional, Kid Morengueira, Moreira da Silva, Samba de Breque

Há vinte anos virou estrela Antônio Moreira da Silva (1902-2000), o Kid Morengueira, rei do samba de breque. Ícone da malandragem carioca nasceu na Tijuca e foi criado no Morro do Salgueiro. Foi motorista de ambulância e funcionário de uma fábrica de meias, costumava dizer que era um “falso malandro”. Seu personagem, de malandro, sem navalha no bolso, só tinha o terno de linho S- 120, sapato bicolor, chapéu Panamá, muito improviso e jogo de cintura.
Começou sua carreira gravando “Ererê” e o “Rei da Umbanda”, em 1931, em parceria com Getúlio Marinho, um bamba do morro do Estácio, mas o sucesso só veio quando participou dos concursos carnavalescos com “Arrasta Sandália”, de Aurélio Gomes e Baiaco (Arrasta sandália aí morena...), “É batucada”,de Caninha e Visconde de Bicoíba, e “Implorar”, de Kid Pepe e Germano Augusto.

O samba de breque, gênero que fez a fama de Moreira, surgiu num espetáculo que fez no Cine Teatro Meyer, no Rio de Janeiro, em 1936. No meio da letra do samba “Jogo Proibido”, um samba em torno dos personagens envolvidos num jogo de chapinha, interrompeu o acompanhamento dos músicos e começou, de improviso, a fazer comentários cheios de humor em torno da letra do samba. O breque foi muito aplaudido e se tornou a sua marca registrada a partir de então.

A esta altura já trabalhava na Rádio Nacional. Foi intérprete de sambas antológicos como “Acertei no Milhar”, samba ícone da malandragem de Wilson Batista que ele eternizou (Etelvina/Acertei no milhar!/ Ganhei quinhentos contos, não vou mais trabalhar/ você dê toda roupa velha aos pobres/ e a mobília podemos quebrar/ (breque) "Isso é pra já, vamos quebrar. Pam, pam, bum, etc..." /Etelvina vai ter outra lua-de-mel /você vai ser madame vai morar no Palace Hotel /eu vou comprar um nome não sei onde/ de Marquês Morengueira de Visconde/ um professor de francês mon amour/ eu vou trocar seu nome pra Madame Pompadour ....).

Na década de 1950 gravou seu maior sucesso “Na subida do morro” e seu primeiro LP ,“O Último Malandro”, com clássicos do seu repertório , entre eles, os “causos” musicados como Chang-Lang - o malandro que tenta comer fiado no restaurante chinês- e “Olha o Padilha”- o malandro que “toma uma dura” do folclórico delegado Padilha, o terror dos boêmios. Nesta época, começa a parceria com Miguel Gustavo, compositor e radialista, com o samba “O conto do pintor”, onde ironiza a pintura moderna. Foi nesta parceria, explorando toda a teatralidade e irreverência da interpretação de Moreira da Silva, que surgiu o Kid Morengueira, um ser imaginário que passou a habitar os sambas do cantor. A primeira aventura do personagem foi em “O Rei do Gatilho”, uma sátira ao faroeste espaguete (bang-band à italiana) e à Hollywood. Outro samba da parceria foi o impagável “Moreira da Siva contra 007”, quase um filme, onde temos um enredo surreal: um triângulo amoroso entre Claudia Cardinale, James Bond e Pelé. Moreira ajuda o companheiro e acaba descobrindo que o plano era o raptar o Pelé para que não jogue contra Inglaterra. Cardinale, é claro, acaba apaixonada por Morengueira.

A despedida de Moreira da Silva foi triunfal. Seu último disco, lançado em 1995, “Os 3 Malandros in Concert” foi uma tremenda gozação com o álbum “3 Tenores in Concert”, de Plácido Domingo, José Carreras e Luciano Pavarotti. A galhofa reunia a nata da malandragem carioca, do samba de breque e do morro representada nas figuras de Dicró (1946-2012), Moreira da Silva e Bezerra da Silva (1927-2005). Na capa, os três trajando elegantes smokings na escadaria do Teatro Municipal, mas sem esquecer o clássico chapéu panamá de Moreira e o bonezinho de Bezerra da Silva. Cinco anos depois Kid Morengueira sai de cena deixando como legado um retrato da malandragem carioca do seu tempo.

(Seção de Iconografia)

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http://memoria.bn.br/DocReader/144428/692