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Opinião

29 out 2015

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e marcado com as tags Ação Popular (AP), Ambientalismo, Arte e cultura, Censura e repressão, Crítica política, Direitos do consumidor, Ditadura civil-militar brasileira, Economia, Fernando Gasparian, Imprensa de resistência à ditadura militar, Imprensa marxista, Jornalismo investigativo, Movimento grevista, Nacionalismo, Partido Comunista do Brasil, Questões agrárias, Questões sociais, Questões trabalhistas, Raimundo Pereira, São Paulo, Sindicalismo

Opinião foi um tabloide político e cultural semanal, lançado no Rio de Janeiro (RJ) em 23 de outubro de 1972 – data de lançamento de edição de nº 0, experimental, com apenas quatro páginas. Tendo se firmado como um dos grandes periódicos de resistência à ditadura civil-militar brasileira, nasceu da fusão de um projeto editorial de Fernando Gasparian, empresário previamente ligado ao governo de João Goulart, e de Raimundo Rodrigues Pereira, editor egresso da revista Realidade. De início, Pereira queria assegurar a presença da redação nas decisões da publicação, desejando deter, juntamente com os outros jornalistas que fariam parte do periódico, 49% das ações da empresa. Gasparian, não acreditando no sucesso de um jornal dirigido por muitos jornalistas, não aceitou a proposta, mas garantiu que mesmo tendo propriedade jurídica sobre o jornal, não pretendia ser o "dono das ideias". Opinião seria, portanto, de propriedade intelectual de quem o fizesse.

Bancado e dirigido por Gasparian e editado por Raimundo Pereira, Opinião galgou grande influência dentre o seleto grupo de jornais políticos do período da ditadura militar. Objetivava questionar a realidade brasileira assumindo uma série de compromissos: defesa das liberdades democráticas, melhor distribuição de rendas, manutenção do patrimônio ecológico, defesa da economia nacional e dos direitos humanos, etc. Além disso, buscava prestigiar alguns intelectuais nacionais em um momento em que grandes órgãos de imprensa fechavam-lhes as portas. Opinião contava com um corpo de redatores fixo e um conselho de colaboradores composto por pensadores de diversos matizes políticos, voltados à defesa da liberdade de expressão.

Raimundo Pereira mantinha contatos secretos com segmentos do movimento Ação Popular (AP) e, mais tarde, com o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), com fins de conduzir ideologicamente o jornal, sem que o conselho editorial e o dono da publicação soubessem. Assim, no editorial da edição nº 0, Opinião apresentava-se como livre de ideologias ou grupos e partidos políticos, sendo apenas defensor dos direitos dos cidadãos, das liberdades democráticas, da cultura e dos recursos nacionais, do consumidor e do meio ambiente.

Vendido nacionalmente em bancas e por assinatura, Opinião trazia artigos, reportagens, ensaios, comentários, charges, ilustrações, fotos, publicidade, entre outras coisas, formando um conteúdo essencialmente analítico e interpretativo. Impresso em sistema off-set em papel de baixa qualidade, tinha cerca de 24 páginas. Chegava às bancas às segundas-feiras, competindo diretamente com a revista Veja. A edição nº 1 vendeu 31,7 mil exemplares, marca que levou à tiragem de 40 mil exemplares já para a sua 3ª edição. Os números posteriores tiveram uma média de vendagem de 29 mil exemplares.

A parte relativa a assuntos nacionais em Opinião dividia-se basicamente em editorias de política, economia, educação e cultura em geral.  O semanário possuía seções nomeadas “Cena Brasileira” e “Gente Brasileira”, onde retratava cenários e indivíduos que raramente ocupavam as páginas dos demais jornais, mas sempre apresentava visões européias e norte-americanas dos conflitos mundiais. Em paralelo, Opinião antecipou-se à grande imprensa em relação a temáticas como ambientalismo e defesa do consumidor, chegando a provocar uma CPI a respeito de abusos no mercado farmacêutico. Por conta de tais atitudes, chegou a contar com o apoio de inúmeros jornalistas da imprensa diária, rompendo com a imagem amadora atribuída à imprensa de resistência, também chamada "naninca" ou "alternativa". Graficamente, o jornal contava com um projeto moderno, de alta qualidade, inspirado em publicações estrangeiras de renome, de onde reproduzia alguns artigos – Opinião chegou a veicular encartes com matérias de Le Monde, apresentando-os como a edição brasileira do periódico francês. Ao aproximar-se destas publicações, o tabloide pretendia constranger eventuais censuras, esperando repercussões internacionais caso fosse reprimido.

Em expediente, inicialmente, o jornal revelava-se dirigido por Fernando Gasparian e Eurico Amado, que, além do editor Raimundo Pereira, contavam com o secretário de redação Antonio Carlos (Tonico) Ferreira e com os editores assistentes Arlindo Mungioli, Flávio Pinheiro, Juracy Andrade, Marcos Gomes e Mário de Almeida (posteriormente, profissionais como Júlio César Montenegro, Bernardo Kucinski, Dirceu Brisola e Maurício Azedo assumiriam novas posições editoriais). Elifas Andreatto assinava seu projeto gráfico; Cássio Loredano, Luís Trimano, Rubens Grilo, Alcy, Chico e Paulo Caruso eram responsáveis por suas caricaturas e ilustrações. Ao todo, Opinião contou com extensa lista de colaboradores e jornalistas, dentre os quais, Nelson Werneck Sodré, Celso Furtado, Antônio Calado, Luciano Martins, Darcy Ribeiro, Millôr Fernandes, Paulo Emílio Sales Gomes, Alceu Amoroso Lima, Fernando Henrique Cardoso, Vladimir Herzog, Paulo Francis, Aloysio Biondi, Jean-Claude Bernadet, Tárik de Souza, Hélio Silva, Paul Singer, Francisco Weffort, Aguinaldo Silva, Marcos Gomes, Teodomiro Braga, Antonio Candido de Melo e Sousa, Francisco (Chico) de Oliveira, Washington Novaes, Gerson Teller Gomes, Paulo Markun, Sérgio Augusto, Luiz Renato Martins, Fernando Peixoto, etc.

Opinião foi reprimido pelo regime militar desde cedo e até seu fim. Antes de seu lançamento, Gasparian havia sido chamado à Polícia Federal para uma advertência. Embora editado cautelosamente, com pouco destaque a matérias de temática delicada e evitando linguagem chula, de dezembro de 1972 em diante o jornal passou a sofrer com a censura prévia, inicialmente com um censor instalado em sua redação. À medida que crescia o prestígio do jornal, aumentavam as pressões externas. Seus chefes de redação e de sucursais eram interrogados frequentemente. Problemas como precariedade das condições de trabalho, discordâncias editoriais, arrocho salarial e atraso no pagamento de jornalistas ainda incentivavam problemas internos no tabloide – em janeiro de 1973 dá-se a primeira crise em sua redação, culminando na saída de editores como Mário de Almeida e Arlindo Munglioli.

Logo antes da impressão do nº 24, no dia 10 de abril de 1973, Opinião recebera a informação de que seria censurado diretamente de Brasília, no gabinete do ministro da Justiça Alfredo Buzaid, tendo seus editores de remeter todo o material composto para a capital federal, para impressão somente após cortes e aprovação. Na ocasião, frente aos prejuízos e atrasos impostos pela nova medida, a 24ª edição foi impressa à revelia da censura, que demorava em liberar autorização para publicação. O episódio acabou rendendo a apreensão de toda a edição e a prisão de Gasparian, Raimundo Pereira e Tárik de Souza, além de mudar o dia de circulação do periódico, que passou das segundas para as sextas-feiras, para que se ganhasse tempo. A partir desse período, cada vez mais textos e desenhos eram cortados e a vendagem do jornal começou a cair. Em consequência, Opinião passou a se identificar mais como jornal de resistência.

Em meio à pressão, a direção do jornal impetrou um mandado de segurança contra o decreto-lei que instituía censura para livros e periódicos. A causa foi ganha, mas a decisão acabou sendo anulada pelo presidente Médici, que baixou um decreto legalizando a censura prévia especificamente em Opinião, com base no Ato Institucional número 5 (AI-5). Paralelamente, o tabloide vivia dificuldades financeiras por conta das apreensões e do veto a matérias publicitárias pagas.

Em meados de 1973, a vendagem de Opinião caiu a 11 mil exemplares. Este número aumentou sensivelmente em seguida, nos primeiros meses do governo Geisel. Neste momento, a abertura política possibilitou a retirada da censura prévia de O Estado de S. Paulo, da revista Veja e do jornal O Pasquim, permanecendo apenas em Opinião, na Tribuna da Imprensa e em O São Paulo, jornal combativo da arquidiocese paulistana. Opinião teve um abrandamento em seus cortes, o que possibilitou um aumento em suas vendas.

Na redação de Opinião, a relação entre Fernando Gasparian e sua equipe editora, capitaneada por Raimundo Pereira, era insustentável, muito por divergências políticas. Pereira, juntamente de Marcos Gomes e a contragosto do diretor, dava ao tabloide facetas partidárias do PCdoB. Em contrapartida, Gasparian não admitia que se criticassem determinados artistas, empresários, políticos e intelectuais nas páginas do jornal. Assim, em fevereiro de 1975, Pereira deixou o periódico com praticamente toda a sua equipe redatora. Outro grupo, não necessariamente ligado a Pereira, sem uma estrita preocupação e comprometimento com políticas partidárias, simplesmente desligou-se de Opinião. Assim, na edição de nº 122, de 7 de março de 1975, o tabloide aparece com novo editor: Argemiro Ferreira.

Na fase Argemiro Ferreira, ainda sob forte censura, o tabloide teve dificuldades para remontar toda a sua equipe de redação. A linha editorial tornou-se politicamente mais branda, ao gosto de Gasparian. Opinião não questionava a multiplicidade das tendências opositoras, colocando-se como veículo de reivindicações mais gerais no chamado período da "distensão".

Em junho de 1975, Opinião passou a editar os Cadernos de Opinião, publicação extraída do conteúdo do jornal, com ensaios e comentários de intelectuais diversos. Para evitar a censura, do 3º ao 11º números, Cadernos de Opinião foi editado com o nome Ensaios de Opinião.

Apesar dos cuidados de Gasparian, a partir de agosto de 1975 a censura volta a endurecer sob o jornal. No entanto, já em abril de 1976, testes feitos pela redação de Opinião trouxeram expectativas de fim da censura prévia: depois que as edições voltavam de Brasília com os cortes, algumas matérias que não haviam sido submetidas aos censores, ou que haviam sido vetadas, eram publicadas normalmente, como se nada tivesse acontecido.

Em julho de 1976, Opinião passou por mudanças ocasionadas pela saída de Argemiro Ferreira da editoração, substituído por Ozeas Carvalho e Genilson Cezar, e pelo controle mais estreito que Gasparian passou a exercer. No final do mês, um novo endurecimento da censura atingiu o jornal: policiais apreenderam a edição nº 195 ainda na gráfica, por conter matérias não autorizadas. Pouco depois, o nº 205 também sofreu apreensão, numa rotina que se estendeu ao longo dos meses seguintes. Novas divergências entre Gasparian e a redação, quanto à orientação do jornal, acentuaram a situação. Por fim, um atentado à bomba promovido pela auto-intitulada Aliança Anticomunista Brasileira atingiu a sede do jornal na madrugada de 15 de novembro de 1976.

Nos meses seguintes, o sufocamento da censura se manteve. Em abril de 1977, o nº 230 trazia um editorial rompendo com a censura, que já não fazia mais sentido. Impressa em uma gráfica diferente da habitual, a edição foi distribuída desobedecendo os cortes da censura (apenas uma parte da tiragem foi confiscada). Assim, o derradeiro nº 231, de 8 de abril de 1977, foi rodado totalmente sem censura, acabando apreendido pela Polícia Federal.

Fontes:

- FERREIRA, Marieta de Morais. In: ABREU, Alzira Alves et al. (Coord.) Dicionário histórico-biográfico brasileiro pós-1930. Rio de Janeiro: Editora FGV; CPDOC, 2001. Vol. IV

- De Fato nº 13, ano 2, de abril de 1977.

- Catálogo de Imprensa Alternativa / Centro de Imprensa Alternativa e Cultura Popular. Rio de Janeiro: Rio ARTE, 1986.

- KUCINSKI, Bernardo. Jornalistas e revolucionários: nos tempos da imprensa alternativa. São Paulo: EDUSP, 2003