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A França no Brasil | La France au Brésil

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Auguste Glaziou

Enquanto os mestres da missão cultural francesa que a convite de Dom João VI foi ao Rio de Janeiro em 1816, J. B. Debret, Grandjean de Montigny, Taunay,… passaram para a história como os grandes agentes da implantação de um estilo francês no Rio de Janeiro, no início do Império, enquanto sábios e naturalistas como Ferdinand Denis e Auguste de St. Hilaire, juntamente com outros viajantes, ajudaram a criar um imaginário brasileiro na França, Auguste Glaziou (1828-1906) ficou esquecido, apesar da imensidão de uma obra de quarenta anos (1858-1897).

Ele foi aquele que iria deixar, de forma duradoura, a sua marca na paisagem urbana do Rio de Janeiro – capital do Império e em seguida da República –, como paisagista e diretor dos parques e jardins da cidade. Botânico intrépido, ele iria também dotar o Museu Nacional de História Natural de Paris com um quarto das ricas coleções da flora brasileira que lá estão reunidas e colaborar com os mais célebres botânicos de seu tempo, em particular Von Martius e seus sucessores, para a realização da Flora Brasiliensis, terminado um ano após a sua morte.

Auguste Glaziou era um autodidata que adquirira uma formação de jardineiro e de horticultor na Bretanha e logo em seguida em Paris, onde frequentara como “ouvinte”, no Jardin des Plantes, as aulas do célebre botânico e naturalista Brongniard, com quem manteve uma relação epistolar quando de sua estadia no Brasil.

Mas é em Bordeaux, durante os cinco anos que precederam sua ida para o Rio de Janeiro, que ele teve a ocasião de participar da obras de embelezamento da cidade junto a M. C. Durieu de Maisonneuve, botânico com o qual ele se inicia nos trabalhos de aclimatação de plantas tropicais e a J. P. Barillet Deschamps, também um horticultor autodidata, cujas estufas e sementeiras inspiraram seus trabalhos no Brasil. Ainda que longe de Paris, Glaziou não deixou de acompanhar, graças às revistas Illustration e Revue horticole, as realizações de Deschamps nos grandes parques de Paris (Parc Monceau, Buttes Chaumont, Bois de Boulogne, …) onde este trabalhou a serviço do Barão Haussmann.

Após um começo difícil, suas obras chamaram a atenção do deputado F. J. Fialho, encarregado pelo imperador Pedro II de implantar uma política urbana moderna, e de Félix Taunay, um conselheiro próximo ao Imperador, com quem Glaziou adquiriu a educação e boas maneiras que lhe faltavam. Ele ganhou a confiança de D. Pedro II, que por sua vez lhe incumbiu, em uma cidade de ruas estreitas, ainda muito portuguesa, a concepção de espaços públicos e de parques que se inspiravam no exemplo de Paris.

Tendo reformado o único parque público do Rio de Janeiro, o Passeio Público, e concebido o parque do Palácio do Catete (atual Museu da República), em 1860, Glaziou chefiou projetos de maior envergadura : o jardim do palácio da princesa Isabel (1862), o parque da residência imperial, a Quinta da Boa vista (1870-1878) e os jardins do Campo de Santana (1870-1880).

Muitos outros pequenos jardins desapareceram com a urbanização implementada no século XX. Suas realizações são numerosas em cidades como Petrópolis, Nova Friburgo, Juiz de Fora, assim como nas ricas residências dos barões do café no Vale do Paraíba Glaziou usou seus conhecimentos botânicos para privilegiar a introdução das espécies vegetais nativas, graças a um arranjo hábil de um vasto repertório botânico que incluía também espécies exóticas em paisagens recompostas, demonstrando, aliás, um perfeito domínio de sistemas hidráulicos, drenagem e arquitetura.

Os artifícios criados em seus jardins : enrocamentos, grutas, pontes, cascatas, fontes, as esculturas francesas provenientes das fundições do Val d’Osne, tudo isso é reflexo das realizações dos parques de Paris, mas com a preocupação de privilegiar a natureza tropical brasileira. Ele foi também o responsável pela organização dos jardins do pavilhão brasileiro da exposição universal de Paris em 1889, junto à torre Eiffel.

Sua grande obra foi o reflorestamento dos morros da Tijuca, hoje classificados como reserva da biosfera pela Unesco, iniciado em 1861 e cuja supervisão ficou a seu cargo, como diretor dos parques e jardins, de 1869 a 1897. A vegetação instalada por Glaziou, ao mesmo tempo paisagista e botânico, é o reflexo da natureza da floresta original, a Mata Atântica, onde ele ia buscar as plantas nativas com a preocupação constante de valorizar e preservar a biodiversidade da floresta de origem.

Isto não excluía as pesquisas estéticas, os espaços investidos de paisagem (praças, rotundas, fontes, esculturas) hoje finalmente em fase de restauração. Glaziou foi considerado por Burle Marx como seu precursor e o inventor do jardim tropical brasileiro. Ele deixou uma obra precursora no domíno da ecologia, do desenvolvimento urbano durável que inspira os paisagistas e urbanistas do século XXI confrontados a uma acelerada urbanização.

O Museu Nacional de História Natural de Paris, após ter realizado a digitalização do herbário de seu mestre, A. de Saint Hilaire, prepara-se agora para fazer o herbário virtual das coleções de Glaziou, o que permitirá que sua obra fique à disposição de todos os apaixonados pela botânica.


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