BNDigital

Histórias da Nova Holanda

< Voltar para Dossiês

O comércio de escravos de Maurício de Nassau

por Mark Ponte
Em 8 de agosto de 1643, o capitão do navio De Princesse, Reijer Adriaensz Schagen, foi ao escritório do tabelião Henrick Schaeff, no Herenmarkt, bem atrás da Casa da Companhia das Índias Ocidentais. Schagen havia acabado de retornar de uma viagem a Angola e ao Brasil, na qual foram comercializados africanos escravizados. A declaração prestada, a pedido da Companhia das Índias Ocidentais, tratava do comércio ilegal de escravos feito pelo conde Maurício de Nassau, o mais famoso governador do Brasil Holandês e construtor da Mauritshuis, na Haia.

A partir da chegada do conde Maurício de Nassau como governador do Brasil Holandês, após uma hesitação inicial, a Companhia começou a se envolver amplamente no comércio de escravos, a fim de fornecer mão-de-obra para os engenhos de cana-de-açúcar instalados no Brasil. Sob o governo de Maurício de Nassau, fortalezas na costa da África, onde pessoas escravizadas eram comercializadas, foram conquistadas a partir do Brasil. Elmina foi conquistada em 1637 e São Paulo de Luanda em 1641.


Imagem para fora: Journael, orte historiaelse descrição de Matheus vanden Broeck

Maurício de Nassau é conhecido na Holanda, mas principalmente no Brasil, como um governante esclarecido. Levou artistas, como Frans Post e Albert Eckhout, e cientistas, como Willem Piso, para o Palácio de Friburgo, na cidade nomeada em sua homenagem, Mauritsstad. Um enorme jardim foi construído ao redor do palácio, repleto com mais de mil árvores (frutíferas) e inúmeros animais da África e do Brasil.

O fato de ele também estar pessoalmente envolvido em assuntos obscuros, como o comércio de escravos, fica evidente nas declarações registradas em uma ata de 8 de agosto de 1643. Em setembro de 1642, o navio estava atracado no porto de São Paulo de Luanda, em Angola, conquistado pela Companhia em 1640, para negociar seres humanos. Lá o capitão, como declarou um ano depois ao tabelião em Amsterdã, recebeu ordem para:

“por conta de sua Excelência, conde Johan Maurits de Nassau, governador no Brasil, como disseram expressamente, levar no supracitado navio um grande lote de negros, que, segundo o Comissário Moetth, foram comprados e trocados para sua excelência.”


Detalhe da vista do palácio de Vrijburg, c. 1636-1644. Jan van Brosterhuyzen, depois Frans Jansz Post, 1645-1647 (Rijksmuseum)

Um total de cinquenta e cinco africanos escravizados foram embarcados no navio. Após a chegada ao Brasil, eles foram retirados do navio e levados de barco à corte de Maurício de Nassau. Se o governador negociou essas pessoas, ou se foram colocadas para trabalhar no Palácio de Friburgo, não fica claro na ata notarial. O que se sabe é que o trabalho no palácio era feito por um grande cortejo de criados, entre os quais dezenas de africanos escravizados e turcos, estes últimos vindos de um navio norte-africano sequestrado por franceses, em 1640, e levado para o Brasil.

Não é o único documento que liga Maurício de Nassau ao comércio de escravos. Um ano antes, em 1642, ele solicitou à Companhia que pudesse participar por conta própria do comércio de escravos. Em 19 de março de 1642, seu pedido é discutido pelos Heren XIX, os diretores da Companhia. Maurício de Nassau solicitou “por sua própria conta e risco, comprar entre quatrocentos e quinhentos negros no Reino de Angola, e por sua própria conta e risco, transportá-los para o Brasil.” Não se sabe se Nassau recebeu essa permissão, mas a ata no arquivo notarial mostra que ele, em 1642, participou diretamente no comércio de escravos.

O frei português Manoel Calado, que durante algum tempo teve bom relacionamento com Maurício de Nassau, escreveu sobre o envolvimento de Nassau com o contrabando de pessoas escravizadas. Segundo ele, por iniciativa do comerciante Gaspar Dias Ferreira, foi feito em 1643 um plano para contrabandear pessoas e vendê-las no Brasil. Com uma tripulação mista de holandeses e portugueses, o capitão Antônio Machado partiu para Cabo Verde em uma embarcação de bandeira falsa para negociar seres humanos. Uma parte dos africanos escravizados foi vendida a proprietários de engenhos de açúcar no sul de Pernambuco, outros no Recife.


Fontes

Declaração, Reijer Adriaensz, 8 de agosto de 1643 (Verklaring, Reijer Adriaensz Schagen, 8 augustus 1643)

Manuel Calado, O Valeroso Lucideno, e triumpho da liberdade : primeira parte... dedicada ao Excelentissimo Senhor D. Theodosio, Principe deste Reyno, e Monarquia de Portugal, 1668

Parceiros