BNDigital

Periódicos & Literatura

< Voltar para Dossiês

Hermeto Lima

por Maria do Sameiro Fangueiro
Nasceu em Belém do Pará, em 1875, e morreu no Rio de Janeiro, em 1947. Foi poeta, jornalista, cronista e historiador. Formou-se em Direito.Ele é um dos personagens sobre os quais a história oficial pouco se detém. A partir de alguns documentos existentes no acervo da Biblioteca Nacional, entretanto, é possível pontuar o trabalho de um erudito que, na passagem do século XIX para o XX e nos anos seguintes, participou da vida social e política na capital federal, publicou livros, crônicas e ensaios e articulou para que seus escritos circulassem. Um jornalista que escreveu regularmente na Revista da Semana.

Em 1898, publica Estalagmites, pela tipografia Aldina, do Rio de Janeiro. O livro de poemas é saudado nas páginas da Gazeta de Petrópolis. O articulista da ocasião apresenta o artista, mas o critica duramente, talvez por não entender a transição por que passavam os modelos poéticos da época. Anota o que seria uma inspiração em Guerra Junqueiro e Raimundo Correia, dois autores centrais no debate estético que anunciava a modernidade. Os comentários chegam a sugerir que a obra estaria melhor estruturada em romances, trovas e vilancetes e não em sonetos, como fez o autor. O próprio Hermeto Lima se encarregou de enviar a obra para a Biblioteca Nacional, como atesta um cartão endereçado ao diretor da instituição, devidamente guardado no acervo de manuscritos.

Em 1906, o poeta editaria um novo livro, com o título de Iris, sobre o qual não foram encontrados quaisquer sinais no acervo da Biblioteca Nacional, nem em outras bibliotecas públicas.
A sua atividade como jornalista na Revista da Semana é intensa na década de 20, continuando na seguinte de modo mais esporádico. Os assuntos são os mais variados. Em 29 de novembro de 1924, por exemplo, o tema é a Praça Marechal Floriano, centro dos poderes legislativo e judiciário da república. A matéria traça um panorama sobre as mudanças da área, desde quando era conhecido como Largo da Mãe do Bispo, passando a ser Largo da Ajuda e, depois, Praça Ferreira Viana.Apresenta os edifícios de seu entorno, as características deles e comenta sobre personagens e acontecimentos ligados ao local, até chegar ao movimento que resultou na colocação da estátua do general presidente que deu o nome atual da praça. A Biblioteca Nacional é privilegiada nas duas páginas da crônica: aparece no texto e tem uma das fotografias que a ilustram é tirada das escadarias do edifício.

Na edição da Revista da semana, de11 de junho de1927, o cronista publicaMúsicos Ambulantes, registrando a memória daquele tipo de arte na cidade. Os primeiros músicos desse tipo teriam sido os escravos e seus descendentes. Depois deles, os imigrantes italianos, vindos para o Brasil a partir de 1880, trouxeram o estilo e a musicalidade peninsular para as ruas, através dos realejos, que se tornariam verdadeira moda. Mais tarde, apareceriam os realejos com macacos, que dançavam ao som do instrumento. Depois, faria sucesso o “homem do urso”, com a fera devidamente domesticada dançando e fazendo malabarismos. Num certo momento, um grupo de portugueses cegos ocuparia o espaço das ruas. Nos dias que corriam, escreve o cronista, acidade modificada e modernizada deixaria pouco espaço para esse tipo de artista. Nem mesmo os artistas que faziam serenatas teriam lugar, conclui, em linhas melancólicas.

O nome de Hermeto Lima assinaria os acréscimos sobre o Brasil e Portugal, da História Universal, do italiano CesareCantu, obra publicada no país pela editora Livraria João do Rio, em 1932. Apareceria também como coautor de História da polícia, publicada em três volumes, entre 1939 e 1944, pelas Oficinas Gráficas de A Noite, obra classificada como rara, dos dias atuais.
Um interesse em assuntos polêmicos se reflete em trabalhos individuais. Em 1913, publicaria O suicídio no Rio de Janeiro e, em 1914, O alcoolismo no Rio de Janeiro, ambas editadas pela Imprensa Nacional. Exemplo da movimentação do autor para ter suas obras editadas é a sua carta para Domingos José Jaguaribe Filho (1848-1921), membro destacado do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil, avisando do lançamento do ensaio sobre o suicídio e pedindo ajuda para a edição do texto sobre alcoolismo, pleito aparentemente bem sucedido.

Em 1921, apareceria o livro Os crimes célebres do Rio de Janeiro, produzido pela Empresa de Romances Populares. O prefácio é de Evaristo de Moraes (1871-1939), advogado famoso, historiador e um dos fundadores da Associação Brasileira de Imprensa. Sete anos depois, Geografia da Mãe Preta, seria lançado pela Editora João do Rio, empresa que formou um catálogo de publicações bem variado, inclusive com algumas polêmicas e críticas. Importante notar que a edição do livro de Hermeto é posterior ao falecimento do importante jornalista Paulo Barreto (1881-1921), nome civil de João do Rio. Em 1929, A prostituição no Rio de Janeiro apareceria no catálogo da Editora Saverio Fittipaldi, mesmo grupo de empresários da editora do livro anterior.

Um dos poemas mais conhecidos de Hermeto Lima é Santa, citado por Andrade Muricy e outros historiadores de literatura, publicado em obra guardada no acervo da Biblioteca Nacional, ainda não digitalizada.



Santa

Essa que passa por aí, senhores,
de olhos castanhos e fidalgo porte,
é a princesa ideal dos meus amores,
a mais franzina pérola do Norte.

Contam que, numa noite de esplendores,
a essa que esmaga o coração mais forte
hinos cantaram e jogaram flores
as estrelas, em mágico transporte.

Acreditais, talvez, ser fantasia!...
eu vis direi que não... Em certo dia,
quando ela entrou na festival capela,

eu vi a Virgem mergulhada em pranto,
e o Cristo de Marfim fitá-la tanto,
como se fosse apaixonado dela!

Em: A Rosa. anno 2,n.34,set.1908

Parceiros