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A Cançoneta: publicação quinzenal (jornal da família)

por Maria Ione Caser da Costa
A Cançoneta veio a lume no dia 08 de março de 1902, um sábado, na cidade do Rio de janeiro. O redator proprietário era Ernesto de Souza, enquanto Julio de Freitas Junior respondia pela função de “redactor secretario”.

A publicação é editada em oito páginas medindo 38 cm x 22 cm. Foi impresso na Typographia A Tribuna, localizada na rua do Ouvidor, nº132, no centro da cidade do rio de Janeiro.

O título aparece na parte superior, como de praxe na maioria dos periódicos. Os tipos são de traços grossos, inspiração art nouveau e montados de um modo assimétrico, com cada letra tocando ou se superpondo à seguinte. A primeira letra, o C, em caixa alta, serve de moldura para um desenho meio busto de mulher, que aparece com o rosto voltado para frente, encarando o leitor, e o colo em torção direcionado para o lado, destacando um ombro desnudado pelo decote do vestido. Atrás da letra N, aparece a figura de um pássaro de bico entreaberto, como que cantando. Num primeiro olhar, ele parece pousado numa das cinco linhas da pauta musical que forma o fundo da composição. À esquerda da pauta, uma clave de sol e, na metade direita dela, algumas notas. Completando a imagem, sempre no segundo plano, há uma ramo com flores e folhas que se espalham sob os sinais musicais e serve de pouso para a ave.

Toda aquela complexa composição do título, parece apoiada numa estranha espécie de vaso estilizado, cujas bordas e base seriam formadas pela continuidade daquele galho que aparece no título, que ocupa o lado esquerda da página, quase até a base. Toda a imagem, vaso e título, tem a forma de um L invertido. O interior do tal vaso é decorado com desenhos de meio corpo de homens paramentados de chapéus e cartolas. Um deles tem um charuto na mão. Abaixo de tudo isso, aparece o expediente, com o nome dos redatores, os valores para adquirir o periódico e o endereço provisório da redação.

O valor avulso de A Cançoneta era de 400 rs, a assinatura mensal valia 4$500 e a anual, 9$000. A redação estava localizada no nº 74 da rua do Ouvidor, um endereço provisório. Todas as informações são compostas em tipos e filigranas de inspiração art nouveau.

A capa e as páginas são divididas em três colunas. Na capa, a imagem descrita ocupa uma delas. Nas outras duas está o Cartão de visita, poema de apresentação do novo periódico, assinado por A Redação. Nele, os editores brincam e homenageiam os grandes periódicos impressos que circulavam naquele momento.

Cartão de visita

Dão licença?...
- A CANÇONETA –
Sou por alcunha A FACEIRA.

Modesta, simples, ligeira,
Risonha, leve e faceta.

Caso estejam de veneta,
Verão, á folha primeira,
A cor da minha bandeira
Nas tintas da taboleta.

Ao JORNAL, vôvô da gente,
O veterano da imprensa,
Pedir eu venho contente
A bença;

Á vovozinha GAZETA
Nossa querida vóvó,
Reclamos p´ra que haja chêta...
E... só.

Ao velho PAIZ guerreiro,
Republicano sizudo,
Do modo mais prazenteiro
Saúdo.

Com o devido acatamento,
Trago ao JORNAL DO BRAZIL
Meu modesto cumprimento
Gentil.

Ao CORREIO intemerato,
Entre os correios bemvindo,
Sem discurso ou espalhafato,
Eu brindo.

Á NOTICIA infatigavel,
Em fórma de saudação,
Um aperto assas amável
De mão.

Beijos á TRIBUNA envio,
Ufano por seus favores.
Para a CIDADE DO RIO
Flores.

E do COMMERCIO a GAZETA
Não passe sem allusão.

Aos demais d’A CANÇONETA
Cumprimenta

A Redação

No mesmo tom que o poema da página anterior, o editorial de lançamento que aparece na página dois, explica “O que vem fazer” A Cançoneta: nele o leitor fica definitivamente informado que o jornalzinho não tratará de política, assunto para grandes jornais como o Jornal do Commercio. Ela, “simples, pequenina, modesta, em sua camisolinha de chita”, não quer saber desses assuntos. A escolha que faz é claramente galhofeira.

- Política?! Ih, que medo! Mamãi disse que é tal qual o papão de cima do telhado, que não deixa a gente dormir socegada.
Não quer saber da vida de ninguém, Si a carne é boa, come; si tem aposthemas, não come, põe no lixo; si o Presidente vem de S. Paulo, tome o trem; si de Nictheroy, tome a barca; si da China... é a mesma cousa. O Cambio sobe? Vá subindo. Desce? Vá descendo. O deputado fala bonito? Muito bem. Não diz nada? Melhor ainda. O povo não quer mais presidente, nem cambio, nem deputado... tambem serve. Querem queimar dinheiro em papel, fundir o metálico, ou não querem nada d’isso? Muito direito em qualquer hypothese. O que a Cançoneta não póde deixar de fazer com inteiro empenho é divertir seus leitores...


Ao final enumera todos os assuntos e tipos de leitura que o leitor poderá encontrar em suas páginas, com o propósito de trazer alento e diversão a todos “Versos engraçados, Monologos espirituosos, Contos, Anedoctas, Charadas, Enigmas, Poesias cômicas, Modinhas alegres, Conselhos de família, Receitas diversas, Cançonetas”.

Na Biblioteca Nacional podem ser consultados dois exemplares de A Cançoneta. O primeiro da coleção e o terceiro, que foi publicado em 15 de abril daquele ano.

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