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A Chrysalida: periódico dedicado ao bello sexo

por Maria Ione Caser da Costa
A Chrysalida: periódico dedicado ao bello sexo teve seu primeiro exemplar lançado na Cidade de Salvador em 1879. É o único exemplar existente no acervo da Biblioteca Nacional. Não apresenta data exata de sua publicação. A designação cronológica impressa logo abaixo do título é “anno 1, 1879, serie 1, num. 1.”

O valor para fazer a assinatura era de 500 réis para a série com quatro números. Foi impresso pela Typographia de Gama & Filho, situada na rua das Flores, nº 99.

O editorial oferece a lisura e o refinamento que devem ser dedicados à mulher, gênero então chamado de “sexo frágil”.

Mais um capeão estrenuo, mais um lidador constante das idèas acaba de surgir à luz da publicidade.
Dedicado ao bello sexo, à MULHER, em cujo coração reima a seiva dos mais grandiosos sentimentos, este periódico, cuja romagem começa agora no escabroso caminho da imprensa, procurará, quanto estiver a seu alcance, unir o util ao agradavel.
Concorrendo, por sua vez, para a instrucção e educação da MULHER, convencendo-a de que na sociedade tem ella de representar os mais delicados e importantes papeis, o nosso modesto periódico, despindo-se d’esses palavrões que são verdadeiros edifícios de neve plantados sobre o ar, esforçar-se-ha por deleitar as suas leitoras com belas producções, que mais falem á imaginação e ao coração do que ao entendimento.


O editorial não é assinado, bem como não apresenta os nomes dos responsáveis pela publicação. Na sequencia são detalhados os rumos que A Chrysalida pretente pautar as suas matérias, e finalizam perpetuando a figura da mulher, mencionando destacadas personagens femininas da antiguidade que são modelos arquetípicos da mulher ideal: Aspasia de Mileto (470-410 a.C.), Phrine (séc. 4 a.C.), a poetisa grega Sapho (séc. 7 a.C.), e a pensadora e matemática Hypathia de Alexandria (370 d.C.).

A nossa tarefa è, por certo, árdua e espinhosa; mas o bello sexo bahiano, cujo coração é uma torrente de carinho, indulgencia e amor, tornar-nos-ha debaixo de sua valiosa protecção, animando-nos e estimulando-nos, afim de que possamos attingir ao fim que temos em mira.
A nossa Chrysalida será, pois, o órgão das Senhoras bahianas, e n’ellatão mimosas perolas da sociedade poderão, a seu bel prazer, patentear os bellos e sasonadosfructos de sua inspirada intelligencia, de sua vasta erudicção e de seus sentimentos amorosos.
E, d’est’arte, poderão ellas ser contadas no numero das Saphos, das Corinnas, das Aspasias, das Phrynès e de tantas outras, que doiraram o cèo da littetatura universal.
Eis o que deseja a nossa Chrysalida.


As matérias vêm assinadas por Maria do P. B. M. Osorio, que publica o folhetim Lágrimas e saudades; Padre Francisco B. de Souza o conto O somno de Adão; e as notícias e poemas são colaborações de Dr. Barboza Nunes, D. Georgina Carvalho, D. Adelia Josephina de C. Fonseca, Pereira da Costa e Brazilino Dias.

A última página é composta por anúncios, classificados, propagandas e receitas, sendo dividida em três colunas. Dentre os anúncios apresentados, um chama a atenção ao anunciar os serviços da d. Leonor Henriqueta Alvares Santos, apresentada como primeira dentista do país. O aviso pode ser confirmado em uma pequena nota na primeira página do Correio da Bahia do ano anterior, dia 20 de junho de 1878.

O poema abaixo, assinado por um nome de mulher, ilustra a publicação.

Martyrio

Prossegue mundo em teu febril delírio,
Ri desdenhoso ao escutar meu canto!
Que importam màgoas d’um atroz martyrio
Se o labio rindo nos encobre o pranto?

Que importam chagas, se encondidas n’alma,
Embora fundas, não as vê ninguém?
Que vale a angustia que ninguém acalma
Gemido ou queixa que se perde além?!...

Entrei no mundo com a mente cheia
D’aureas esp’ranças n’um porvir sereno:
Hoje sou folha que no ar volteia,
Desperto e choro por meu sonho ameno!

Sou a palmeira que o mesquinho fado
Arranca ao berço, e outro paiz lhe dá;
Se a prende ao solo paternal cuidado,
Chora as raízes que ficaram lá.

Sombra perdida que no mundo existe,
Imagem triste de phantasma errante,
Vivo! Estou viva, se o viver é isso,
Mas não importa, seguirei avante!

Avante sim, que após fatal procella,
Vejo no espaço para mim brilhar
Limpidos raios de formosa estrella
Que ha de meus passos com amor guiar.

Prosegue mundo em teu febril delírio
Ri desdenhoso ao escutar meu canto!
Que valem mágoas d’um atroz martyrio
Se hei de sorrindo occultar meu pranto?!

D. Georgina Carvalho

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