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A Madrugada: periodico litterario e recreativo dedicado ao Euterpe Club

por Maria Ione Caser da Costa
A Madrugada foi um periódico lançado no Rio de Janeiro, em 11 de janeiro de 1902, quando era ainda Capital Federal. Recebeu o subtítulo de periodico litterario e recreativo dedicado ao Euterpe Club.

Publicação mensal, foi impressa pela Typographia Macedo & Rohe, que estava localizada na rua do Hospicio, 93, atual rua Buenos Aires.

No acervo da Biblioteca Nacional estão apenas dois exemplares. O primeiro, mencionado acima, e o segundo, publicado no dia 13 de fevereiro daquele ano. Não foram encontrados outros números nas bibliotecas pesquisadas.

A Madrugada teve como redator secretário Manoel Ferraz e o redator gerente foi Antonio Nepomuceno de Araujo. Como auxiliar de redação estava Annibal Ferreira, e Gaudencio Cardoso era o redator chefe.

Em matéria de capa do primeiro exemplar, um artigo de página inteira é dedicado ao gerente, Antonio Nepomuceno de Araujo, com sua foto centralizada. A matéria é assinada pelo redator chefe, Gaudencio Villarinho Cardoso. O texto inicia com letra capitular funcionando como elemento decorativo:

Não venho trazer ao centro um personagem elevado. Se estampo no primeiro numero d’A Madrugada a effingie de Antonio Nepomuceno de Araujo é apenas para render uma homenagem ao mérito, ao sublime dedilhador ardente das bellissimas lettras que tanto o extasiam!


No artigo são encontrados alguns de seus poemas e também informações sobre o jeito que Nepomuceno tinha para escrever, comparando-o ao “estylo do mavioso poeta das ‘Primavéras’ o merencório Casemiro de Abreu”.

No artigo seguinte, que tem o título de A nossa estrada, os redatores informam a intenção do periódico:

Não é um facho de grandesa, aureolado por soberbos Genios, que desponta na madrugada de hoje, na radiante arena do jornalismo.
Como vêdes, é um pequenino periódico litterario e recreativo, que se patenteia humilde e modesto, sem vislumbre de ostentação. [...]
O nosso programma é único e exclusivamente litterario. As nossas columnas jamais abrirão terreno para polemicas, ellas vêm sem côr política e... nunca obedeceremos á critica malévola porque a vemos nos labios dos egoístas e dos invejosos. [...]
Aos nossos collegas da imprensa respeitosamente os cumprimentamos, pedindo benevolencia para os iniciantes. [...]


Depois de se apresentarem para seus leitores numa reflexão sobre quem são e como deverão agir, os redatores fazem uma pausa e passam a explicar os motivos que os levaram a escolher o extenso subtítulo:

Estavamos neste ponto quando nos convidaram para irmos á primeira matinée do EUTERPE-CLUB.
Quando lá chegamos, uma brilhante pleiade de rapazes, distinctos sócios e amigos nossos, nos receberam de um modo Cortez em amistosos amplexos fraternos!
Tendo elles sciencia de que momentos antes tínhamos fundado A MADRUGADA em primeira reunião, pediram-nos que dedicássemos a mesma ao EUTERPE-CLUB e que d’elle fossemos sócios.
Ante de uma manifestação tão ardente vibrada pelos impulsos do enthusiasmo não vacillamos em acceder ao honroso pedido que muito nos confundiu.
Esperamos, porém, que os nossos amaveis consócios nos auxiliem com as suas preciosas assignaturas e dedicação; não para levarmos a nossa idéa ao magestoso throno da Gloria! – porque essa é muito caprichosa – mas sim, para que tenhamos a suprema ventura de darmos uma longa vida cheia de sorrisos encanadores, á nossa esperançosa MADRUGADA, tela querida dáquelles que adoram a Arte!
- Eis tudo o que almejamos!


O segundo exemplar também tem em sua matéria de capa uma homenagem a Manoel Ferraz, o redator secretário de A Madrugada, assinada por Belmiro Rosas, “um illuminado moço de 19 anos” que talvez por causa de sua pouca idade, “nos revela pouca segurança de estylo. Apezar do seu estylo ser ambíguo”.

Este é mais um periódico que seus proprietários se colocam como ensaístas, ou mesmo como aprendizes de uma tarefa que não lhes cabe, mas que objetivam aprender, o jornalismo.

O Euterpe-Club não tinha à época sede própria. Uma nota ainda no primeiro exemplar de A Madrugada informa que “os valentes Euterpistas estão estacionados no Cassino Español”.

Uma notícia sobre a criação do Euterpe-Club foi divulgada no Jornal do Brasil do dia 14 de dezembro de 1901, na página 3, final da sexta coluna e início da sétima, confirmando que o Clube em questão não tinha sede própria.

A Madrugada publicou poemas, crônicas e notícias sobre a situação do clube. Seus colaboradores foram Alfredo Neri Ferreira, Annibal Ferreira, Aurea Pires (1876-1949), Baptista Franco, Belmiro Rosas, David Thomaz, Gaudencio Cardoso, Leopoldino Guimarães, Manoel Ferraz, Miguel Monteiro, Nepomuceno de Araujo, Olga J. Guimarães, Rodolpho Machado, Trajano Barbosa e Uliz.
A seguir um poema de Aurea Pires com o título Magua infinita5, publicado na página quatro do primeiro exemplar.

Magua infinita

Quando eu parti, minh’alma aberta em chagas
Partio tambem, seguindo a minha sina,
- Corri florestas, solitárias tragas,
Buscando allivio á dor que me domina.

E depois de rever longínquas plagas,
Onde brinquei quando era pequenina:
Olhando o mar, que as transparentes vagas
Entornava na praia alabastrina;

Depois de ver cidades populosas,
Palacios, cathedraes maravilhosas,
Jardins floridos como eu nunca vi:

Voltei, sentindo o mesmo horror ao mundo,
Trazendo n’alma o mesmo mal profundo,
A mesma angustia que levei d’aqui!

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