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A Navalha: semanario critico, chistoso e litterario

por Maria Ione Caser da Costa
“Mais um alistado para o exercito da imprensa” – Com esta frase e dando destaque às palavras “alistado” e “exército”, a publicação A Navalha: semanario critico, chistoso e litterario inicia o editorial de seu número de lançamento. Era o dia 11 de setembro de 1875.  Publicado em Recife, seu primeiro exemplar saiu pela Typographia do Jornal do Recife, e os seguintes pela Typographia Industrial.

A seguir, a continuação do editorial com título homônimo, que não foi assinado:

 
A Navalha apparece, não significando o effeito de um sorteio, mas sim, uma praça voluntaria.

Valente ou fraca, destemida ou medrosa, vem ella com o uniforme da imprensa tomar o seu posto na fileira.

A sua missão é a missão da imprensa, - e guarda avançada desta, procederá sempre segundo os preceitos da disciplina.

Em sua marca civilisadora, a Navalha terá muitas vezes de repousar. Ai daqueles que ficarem de frente para o gume afiado de sua folha.

O significado do objeto de nome homônimo, navalha, de acordo com o dicionário on line é “objeto afiado de corte”.  E é nessa motivação que os editores se pautam: cortar afiadamente, navalhar, no sentido figurado, qualquer pessoa que venha cometer atos impensados ou, de acordo com ponto de vista próprios, violar e/ou transgredir regras de boa conduta. Isto se confirma no primeiro artigo. Com o título ‘Navalhadas” o editor informa que “atrever-me-hei a navalhar aquillo que a minha bem intencionada consciencia repellir”.

Além das tão anunciadas navalhadas aos fatos e às notícias da época, A Navalha também publica em suas páginas poemas, charadas e uma seção chamada “Folhetim”. Nela os comentários aparecem assinados pelos pseudônimos A Tarde, A Noite ou A Vista.

Com quatro páginas cada exemplar, não apresentou ilustrações e foi diagramado em duas colunas que eram divididas por um fio simples.

Não é possível informar os nomes dos editores de A Navalha. Seus textos são assinados por pseudônimos e não fazem menção aos responsáveis pela publicação. Mas nota-se um cuidadoso esmero dos editores ao receberem as publicações que então circulavam. Era costume, naquela época cada editor encaminhar aos seus pares, o exemplar de sua autoria. E os exemplares recebidos pelos editores de A Navalha eram mencionados em número a ser lançado, como forma de agradecimento.

Os editores, são generosos ao agradecer o envio da nova publicação, descrevendo nas páginas d’ A Navalha, palavras incentivadoras: “Temos ás mãos o interessante Jornal das Familias, correspondente ao mez de Novembro, é que nos foi ofertado. É editor desta importante e util publicação o Sr. B. L. Garnier, que não tem poupado esforços para engrandecer a nossa literatura. Agradecemos o mimo e retribuiremos com a nossa Navalha.”

Uma nota ao final de cada fascículo informava que A Navalha podia ser assinada nos seguintes endereços: rua do Imperador nº 65, rua Barão da Victoria nº 59, rua Imperatriz nº3 e Praça do Conde d’Eu nº3. E para estes locais os interessados também poderiam enviar suas colaborações. Cada fascículo avulso era vendido ao preço de 300rs e a assinatura mensal valia 1$000.

Outros colaboradores “amolam” suas navalhas nas páginas do periódico: Dubois, Odilon, Jayme, Elibert, Minor, Mozar. Também são encontrados naquelas páginas poemas de Castro Alves (1847-1871), Teixeira de Carvalho, e Theophilo Dias (1854-1889).

A Biblioteca Nacional possui 12 exemplares de A Navalha, o último datado de 27 de novembro de 1875. Todos estão digitalizados, entretanto alguns exemplares apresentam sinais de mutilamento, faltando pedaços. Estão restaurados, porém de forma errônea, pelos critérios de restauração que conhecemos nos dias atuais. A cada pedaço de folha faltoso no periódico, foi colado um outro papel, com gramatura diferente, preenchendo as falhas.

A seguir uma poesia “do talentoso e sempre lembrado poeta brazileiro Antonio de Castro Alves, que pelo mimo e belleza que encerra publicamos”. Assim os editores homenagearam o poeta.

 

Anceios

Oh! pallida Madona de meus sonhos,

Bella filha dos serros do Engaddi!

Vem inspirar os cantos do poeta,

Rosa branca da lyra de Davi.

 

Todo o amor que em meu peito repousava,

Como o orvalho nas noites ao relento,

A’ teu seio elevou-se como as névoas,

Que se perdem no azul do firmamento.

 

Aqui, além, mais longe, em toda a parte

Meu pensamento segue o passo teu!

Tu és a minha luz, sou tua sombra,

Eu sou teu lago, se tu és meu céu.

 

À tarde, quando chegas á janella,

A transa solta onde suspira o vento,

Minh’alma, te contempla de joelhos,

A’ teus pés vai gemer meu pensamento!

 

Lá no theatro, ao som das harmonias,

Vendo-te a fronte altiva e peregrina,

Eu apertava o peito murmurando,

Oh! mata-me de amor, mulher divina!!

 

Inda hontem, á noite, no piano

Os dedos teus corrias no teclado.

E  ás carícias dessas mãos lindas,

Suspirava e gemia apaixonado.

 

Depois cantaste a ária suspirosa:

Veio n’alma accender-me mais desejos;

Dir-se-ia que essas notas eram doces

Como o sussurro de amorosos beijos.

 

Oh! diz-me, diz-me que ainda posso um dia

De teus labios beber o mel dos céus,

Que eu te direi, mulher dos meus amores,

Amar-te inda é melhor do que ser Deus!!...

 

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