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Hemerodromo da juventude: periodico litterario e recreativo

por Maria Ione Caser da Costa
O primeiro exemplar de Hemerodromo da juventude: periodico litterario e recreativo foi lançado no dia 5 de março de 1861, uma terça-feira, no Rio de Janeiro. Foi impresso na Typographia Pinheiro & Comp, situada na rua do Cano n. 165. Atualmente rua Sete de Setembro, centro comercial da cidade, a rua do Cano desviava as águas da Lagoa de Santo Antônio, atual Largo da Carioca, para o mar.

Nas páginas do periódico não são mencionados os nomes dos proprietários, ou redatores responsáveis. Um sumário, grafado logo abaixo do cabeçalho de cada fascículo, relaciona os artigos, contos e poemas publicados. A maior parte das matérias, todavia, não trouxe assinatura.

A leitura do editorial deixa claro que os responsáveis pela publicação são jovens iniciantes na carreira jornalística, ansiosos por deixarem um legado na área literária. Eis como se desenvolve o primeiro editorial.
N’esta epocha em que a sociedade só vive do positivismo; em que o ouro absorve todas as ideias; em que a descrença e o scepticismo tem feito pender muita fronte esperançosa; n’esta época emfim em que tudo que tende á litteratura é despresado: surge o Hemerodromo da Juventude.

É certamente grande animo – nem há negalo-o d’aquelles que muito obscuros nas lides litterárias, tentam soerguer do lodo do indifferentismo a mais pobre e ignota pagina d’uma litteratura abandonada.

O Hemerodromo da Juventude, nasce de tres jovens de esperança.

Pobres viajores ésdodps no deserto, sem uma luz, sem um guia, não podemos apresentar uma obra perfeita.

Se lançamos um olhar retrospectivo sobre o passado, temos em vista muito futuro perdido, muita gloria fanada e muita esperança morta.

Hemerodromo da juventude se diferenciou dos outros periódicos de sua época pelo número de páginas. De um modo geral, os títulos contemporâneos a ele, apareciam com quatro páginas. Este publicou com oito, se mantendo assim em todos os exemplares. Não apresentou ilustrações.

Inicialmente publicado em datas variadas, na edição do dia 10 de junho, no número 7, seus editores informam passariam a publicar nos dias 10 e 25 de cada mês. O último exemplar preservado na coleção da Biblioteca Nacional é o de número 8, publicado no dia 25 de junho de 1861. Todos podem ser consultados na Hemeroteca Digital. Não há indícios de ter continuado a publicação.

Publicou contos, crônicas e poemas. Os contos e as crônicas apareciam de maneira seriada, com continuação no número seguinte. Nas páginas do periódico também podemos encontrar, em capítulos, o texto em prosa de Casimiro de Abreu, que havia falecido no ano anterior, intitulado “Virgem loura”, e que foi publicado originalmente no Correio mercantil (RJ) no ano de 1857.

Dentre os colaboradores podemos citar Almeida Azambuja, A. Cunha, Antonio Lobo, Bruno Seabra, Casemiro de Abreu, Correa de Menezes, Correa de Moraes, João Barbosa Rodrigues (1842-1909, pseudônimo de Tibiriçá), Ladislau Netto, M. J. Gonçalves Junior, Santos Leal e Zimermann. A seguir o poema “A Filha do mestre Anselmo” de Bruno Seabra, retirado das páginas do Hemerodromo da juventude.

 

A Filha do mestre Anselmo

Mestre Anselmo — sapateiro,

No seu offício o primeiro,

(O primeiro remendão),

Tinha uma filha formosa,

A qual se chamava Rosa,

E era rosa em botão.

 

Como n’um throno assentado

Mestre Anselmo repimpado

Na tripeça  - era um sultão;

Mas, á míngoa de freguezes,

Passava mezes e mezes

Sem remontar um tacão.

 

Um dia o rei da craveira

Nomeia a filha caixeira,

E põe a filha ao balcão:

Acabaram-se os revezes,

Mestre Anselmo tem freguezes,

Já não póde medir mão.

 

De tão grande freguezia

O mundo todo dizia

Ter ganho o mestre um milhão,

Não - que lh’o desse a craveira,

Mas os olhos da caixeira

Que tinha posto ao balcão...

 

A’este justo commento

Por minha vez acrescento,

E tenho a minha rasão;

Mestre Anselmo enriqueceo,

E a caixeira empobreceo

No melhor do seu quinhão!...

 

Quem quiser no seu offício,

De mesquinho benefício,

Ser rico do pé p’ra mão:

Tenha uma filha formosa,

E, como o patrão de Rosa,

É por a filha ao balcão.

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