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O Sol – a luz da razão positivista

por Irineu E. Jones Corrêa (FBN), Luzia Ribeiro de Carvalho (IC Faperj – bolsista)
O Sol é um periódico ilustrado e manuscrito, produzido na cidade de Curitiba. Ele é montado em duas folhas separadas, formando quatro páginas numeradas. Suas medidas são 23x32 cm.
A Biblioteca Nacional guarda o exemplar de número um e, no atual estágio da pesquisa, não é possível saber se houve outras edições.

Está em bom estado de conservação. Na primeira página há um borrão de tinta no canto superior esquerdo que, entretanto, não impede a leitura do conteúdo. A mancha não prejudicou a integridade dos elementos do cabeçalho. Ela desceu até a metade da coluna esquerda do editorial, sem prejudicar a leitura do texto. Há uma pequena mancha na margem e uma palavra na coluna direita foi levemente borrada. Não houve prejuízo no verso do papel, provavelmente por ser mais encorpado e de maior gramatura, embora produzido em pasta de madeira, como a grande maioria dos periódicos da época.

A técnica de ilustração do jornalzinho é cuidadosa e detalhista. Logo no cabeçalho, há o desenho de um sol, do qual emanam os raios e as sombras. As letras do título estão centralizadas e em primeiro plano em relação à figura. Dois triângulos nas laterais completam o espaço do cabeçalho. No da direita, lê-se a expressão “pela razão o mundo é nosso” e no da esquerda, “união libertária”, duas expressões positivistas.

As colunas de texto são divididas por linhas ornamentadas variando os motivos em cada página. Os espaços do expediente, onde estão informados data, local e propriedade também são demarcados pelo mesmo tipo de adorno. A composição formada pelo cabeçalho e o conjunto do expediente ambos sustentados pela linha que divide o texto em duas colunas sugere o frontispício e o átrio de um templo clássico, estética apreciada tanto por positivistas quanto por maçons.
A caligrafia empregada na preparação do jornal é variada e apresenta diversos estilos de letras, o que poderia indicar várias mãos escrevendo a publicação.

O Sol busca promover a luta através razão. O texto de apresentação informa que a sua proposta é a de incentivar os colaboradores do periódico, os membros da união universal, para que façam a diferença na sociedade. Os conteúdos de valor para a mente humana devem deixar de lado as banalidades que “desorientam o ser humano”. A alegoria do astro rei invoca a função de levar a luz e a razão aos que “se deixam vencer pelos desastrosos vícios”. Luis S. Bastos, autor do editorial, foi músico na cidade de Curitiba.

Pórtico, poema subscrito por A. Silveira, completa o espaço deixado na segunda página pelo longo editorial. Esse poeta é Aureliano Azevedo da Silveira (1879-1928), famoso caricaturista e ilustrador curitibano, do início do século XX. No finalzinho dessa edição, aparece a promessa de que o próximo número seria ilustrado por ele. O seu trabalho aparece em várias revistas que estão no acervo da Biblioteca Nacional. O artista e sua obra são apresentados no ensaio Aureliano Silveira Entre Prensas, Penas e Nanquins, de Rosane Kaminski, que faz parte do livro O Paraná pelo caminho: histórias, trajetórias e perspectivas.

Na terceira página, uma história curta, intitulada A quem eu sei... e assinada pelo mesmo Luis Bastos conta um sonho em que a cada nascer do sol, há uma renovação das esperanças. A história é ilustrada por um desenho em cores. Na mesma página há uma pista sobre a data em que o periódico foi produzido, julho de 1903.

A última página apresenta duas matérias, “Cúmulos”, um anedotário, e “Noticiário”, sobre as movimentações dos membros da União e sobre os assuntos já pautados para o próximo número.

Entre os vários sinais e símbolos positivistas e maçons que o periódico invoca, chama a atenção a questão da datação, última parte do cabeçalho. Aparece nele 05 do VI de 093. Para calcular a correspondência entre o ano civil e o ano positivista deve-se levar em conta que o Calendário positivista foi proposto por Augusto Comte em 1849. Seria formado por 13 meses, com 28 dias cada e com um dia adicional comemorativo ao final, totalizando 365 dias. O primeiro ano no novo calendário é 1789, ano da Revolução Francesa.

A Biblioteca Nacional guarda em seu acervo o livro escrito por Comte e traduzido por Raimundo Teixeira Mendes (1855-1927): Calendário positivista; precedido de indicações sumárias sobre a teoria positiva do calendário. A religião positivista no Brasil foi fundada em torno de 1880 por seguidores do filósofo francês Auguste Comte. “O amor por princípio e a ordem por base; o progresso por fim”. A frase aparece no frontispício das igrejas fundadas sob a ordem positivista, sendo essa uma das mais conhecidas frases de Comte. Faz parte da história do Brasil através do lema de nossa bandeira. Na divisão de iconografia da Biblioteca Nacional, é possível encontrar uma imagem do primeiro templo fundado, que foi na cidade do Rio de Janeiro.


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