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Literatura | Nelson Rodrigues, um dos mais polêmicos intelectuais brasileiros do século XX

23 ago 2021

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Escritor, dramaturgo, cronista, Nelson Falcão Rodrigues, foi um dos mais polêmicos intelectuais brasileiros do século XX. Filho e irmão de jornalistas, além de romances, contos e peças, escreveu para a imprensa por toda a vida, de folhetins à crônica esportiva. Começou sua carreira aos 13 anos, em A Manhã, jornal fundado por seu pai, Mario Rodrigues e, ao longo dos anos escreveria também para O Globo, O Jornal, Última Hora, Jornal dos Sports, Correio da Manhã, Manchete, entre outros, e foi nas crônicas dos jornais que eternizou personagens como “Sobrenatural de Almeida”, a “grã-fina de nariz de cadáver” e a “estagiária de calcanhar sujo”. Diversos desses textos podem ser acessados e lidos nas coleções da Hemeroteca Digital.

Nascido em Recife, em 23 de agosto de 1912, Nelson se mudou com a família ainda pequeno, aos 4 anos, para o Rio de Janeiro. Quando tinha 13 anos, em 1925, seu pai, o jornalista Mario Rodrigues, fundou o jornal A Manhã. Ali, o adolescente Nelson começou a trabalhar como repórter policial. A experiência, dizia ele, foi essencial para sua formação e influenciou toda a sua obra posterior. À revista Manchete, declarou, em 1966: “como repórter de polícia, adquiri um material de Balzac que iria, mais tarde, transpor para o teatro, o conto, o romance e a novela”. Foi também em A Manhã que Nelson Rodrigues, aos 15 anos, publicou seu primeiro texto de ficção, “A Tragédia da pedra”.

Após perder o controle acionário de A Manhã, Mário Rodrigues fundou o diário Crítica e foi na redação deste jornal que Nelson presenciou uma das maiores tragédias da sua vida. No final de 1929, o jornal publicou, em primeira página, uma matéria sobre a separação de um casal, com insinuações sobre o adultério da mulher. Ofendida, a acusada invadiu a redação com uma arma procurando por Mario Rodrigues e, na ausência deste, atirou em seu filho, Roberto Rodrigues, que não sobreviveu. Mario Rodrigues, deprimido, faleceu poucos meses depois. O jovem Nelson presenciou o assassinato e a agonia do irmão mais velho, acontecimento que influenciaria sua vida e sua obra. Em 1966, escreveu: “Eu vi tudo. Ele foi mortalmente ferido sem uma palavra. A mesma bala matou dois: Roberto, no dia seguinte, e dois meses mais tarde, meu pai. (...) O que senti, no dia do tiro, influiu em todo o meu teatro. De vez em quando, já velho, fico meio alado e me ponho a pensar: - Neste momento, alguém está assassinando alguém”. A morte do pai deixou a família em situação financeira instável e os anos de dificuldades deixaram de herança a tuberculose que acometeu Nelson e matou seu irmão Joffre.

Em 1932, Nelson Rodrigues começou a trabalhar no jornal O Globo, onde foi editor do suplemento O Globo Juvenil. Na década de 40, o autor começou a se dividir entre o jornalismo e o teatro e escreveu suas primeiras peças. Em 1941, lançou “A Mulher sem pecado” e, em 1943, o grande sucesso “Vestido de Noiva”. Tragédia que se passa em três planos – realidade, memória e alucinação -, “Vestido de Noiva” foi considerada um marco e uma revolução no teatro brasileiro. Ao todo, Nelson escreveria dezessete peças teatrais, se firmando como um grande dramaturgo, reconhecido por grande parte da crítica e dos diretores e atores da época, apesar das polêmicas sobre suas obras e problemas com a censura. Suas peças seriam, ao longo dos anos, também adaptadas para o cinema com sucesso, como, por exemplo, “Beijo no Asfalto”, “Bonitinha mas ordinária” e “Engraçadinha”.

O sucesso de “Vestido de Noiva” o levou para os Diários Associados, como redator e cronista de O Jornal. Neste diário, Nelson Rodrigues publicou, em 1944 e assinando como Suzana Flag, o folhetim “Meu destino é pecar”. O imenso sucesso do folhetim triplicou a venda do jornal e Nelson assinaria como Suzana Flag mais três histórias ao longo da década: “Escravas do Amor”, ainda em 1944 e “Núpcias de fogo”, em 1948, ambos em O Jornal; e “Minha vida”, publicada em 1946 na revista A Cigarra. Porém, Suzana Flag não foi o único pseudônimo feminino do escritor. Em 1949, ele assinou como Myrna a coluna “Myrna escreve”, em O Diário da Noite que, em sua estréia, traria o mote “não se pode amar e ser feliz ao mesmo tempo”.

Mas foi em Última Hora, jornal de Samuel Wainer no qual passou a trabalhar após sair dos Diários Associados, que Nelson Rodrigues publicou, diariamente, seu maior sucesso jornalístico: a coluna “A Vida como ela é”. Com o subtítulo “tragédia, drama, farsa e comédia”, a coluna foi publicada de 1950 a 1961. Em suas memórias, publicadas no Correio da Manhã em 1967, o autor diria que a coluna “era sempre a história de uma infiel” e contaria: “Quando saí da Última Hora e acabei A Vida Como Ela É, o telefone não parava. Homens e mulheres queriam saber se não ia sair mais e por que”.

Apaixonado pelo futebol, o tricolor Nelson Rodrigues foi também um grande cronista esportivo. Em suas crônicas, imortalizou o Fla X Flu e eternizou personagens. Iniciou no Jornal dos Sports, de seu irmão Mário Filho e, em 1955 criou, com os irmãos Augusto e Paulo, a revista semanal Manchete Esportiva, onde era o principal redator e assinava uma coluna de crônica esportiva. Na década seguinte, Nelson trabalhou também na primeira mesa-redonda de futebol da televisão brasileira, a “Grande Resenha Esportiva Facit”, na TV Globo.

Escritor prolífico, que trabalhava compulsivamente mesmo contrariando ordens médicas, Nelson Rodrigues, que já tinha superado cinco enfartes, faleceu na manhã de 21 de dezembro de 1980, de complicações cardíacas e respiratórias. Foi enterrado com a bandeira do Fluminense Futebol Clube cobrindo seu caixão.


Nelson Rodrigues, Revista Manchete, 1968.