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O Tribunal da Inquisição de Goa através dos manuscritos da Biblioteca Nacional *

12 mar 2014

A Seção de Manuscritos da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro abriga um precioso acervo sobre o Tribunal do Santo Ofício de Goa, que permite o estudo das práticas inquisitoriais no Oriente Português.1

Este acervo sobressai diante do desaparecimento quase completo dos documentos referentes à Inquisição goesa, que teriam sido destruídos no século XIX, conforme Antônio Baião.2 A Biblioteca Nacional acolhe nove volumes encadernados de originais e cópias da correspondência trocada entre o Conselho Geral da Inquisição de Lisboa e a Mesa da Inquisição de Goa, além de breves papais, alvarás régios, provisões, listas de réus e ordens diversas sobre a gestão dos assuntos do Santo Ofício nas terras asiáticas. O conjunto disponível na Seção de Manuscritos da Biblioteca Nacional abrange os séculos XVI a XIX e é composto por aproximadamente 1.600 documentos.3

Este estudo pretende analisar aspectos da atuação da Inquisição de Goa entre a segunda metade do século XVI (quando foi criado o Santo Ofício de Goa) e o início do século XVIII, pois são poucos os autores que se dedicaram a investigar os métodos efetivos da ação inquisitorial – quais foram as práticas adotadas, como os oficiais da Inquisição agiram, em que medida o Santo Ofício interagiu com as populações locais.4 Os manuscritos da Biblioteca Nacional testemunham sobre as práticas inquisitoriais, uma vez que a correspondência entre os inquisidores de Goa e os inquisidores do reino de Portugal revela em que medida as regras de funcionamento do Santo Ofício desviavam-se dos modelos de atuação preconizados, as dúvidas mais recorrentes, os procedimentos utilizados para exercer o controle sobre os domínios tão esparsos do Oriente Português, os segmentos sociais e as instituições que mais colaboraram com a atividade inquisitorial.

A correspondência existente no acervo da Biblioteca Nacional permite também acompanhar a atividade do Tribunal da Inquisição de Goa e compreendê-lo como um dos dispositivos utilizados no esforço de cristianização das populações do Oriente que estiveram sob a influência portuguesa, favorecendo o processo de disciplina social dos habitantes locais. A “disciplina social” refere-se a estratégias
de cristianização e de disciplina da sociedade, à reforma da administração da Igreja, à internalização de valores cristãos, quando ocorre a interpenetração do poder político e da religião no âmbito do Estado Moderno.5 O Tribunal do Santo Ofício foi um dos dispositivos essenciais desse processo de disciplina social, que se efetivava ao penetrar nas consciências individuais, ao fixar nos corações dos cristãos os vínculos de obediência ao Estado e à Igreja.6

A conversão dos povos do ultramar consistia em uma das estratégias adotadas pela Coroa portuguesa na busca da lealdade política de seus súditos, por intermédio de uma identidade pautada na adoção da fé cristã7 e por restrições à promoção social daqueles que não adotassem o catolicismo como confissão religiosa, pois encontrariam restrições à obtenção de privilégios e de cargos no Estado da India. Pretende-se revelar os delitos contra a fé católica que receberam a maior atenção dos inquisidores de Goa e como as práticas culturais e religiosas dos indianos batizados na fé católica suscitaram dúvidas entre os oficiais do Santo Ofício acerca dos procedimentos que deveriam ser adotados.

O estabelecimento e a organização do Tribunal do Santo Ofício de Goa

Antes de tratar dos motivos para o estabelecimento do Tribunal do Santo Ofício em 1560, é preciso analisar o ambiente político e religioso da Península Ibérica nas décadas precedentes. A convivência tolerada entre as três comunidades religiosas (a cristã, a muçulmana e a judaica) que vigorou na Península Ibérica medieval terminava, estando na raiz do estabelecimento do Tribunal da Inquisição em Portugal e Espanha na Idade Moderna. 8 O estabelecimento dos tribunais inquisitoriais na Espanha e em Portugal na Idade Moderna criou condições favoráveis à interferência dos monarcas ibéricos sobre o estes tribunais, pois obtiveram o poder de nomear os inquisidores gerais. 9

Em Portugal, D. João III obteve a aprovação do Papa Paulo III para estabelecer o Tribunal do Santo Ofício em 1536. Na Península Ibérica, os judeus foram forçados a adotar o batismo em massa, transformados em cristãos-novos e considerados suspeitos de manterem suas tradições judaicas ocultamente. A principal razão para que fosse estabelecida a Inquisição na Espanha e em Portugal foi o
controle dos cristãos-novos, suspeitos de dissimularem as suas crenças e os costumes judaicos, mesmo após o batismo católico. Diante das pressões, grupos de judeus partiram de Portugal em direção a outros países europeus e ao ultramar, instalando-se também na Índia, sobretudo na região de Goa e de Cochim.

O estabelecimento do Tribunal do Santo Ofício de Goa, tal como na Península Ibérica, foi justificado mediante a existência da presença judaica, mais precisamente, de cristãos-novos acusados de judaizarem. Houve uma primeira instituição do Tribunal da Inquisição de Goa em 1554, que não se consolidou, pois os dois religiosos que seriam responsáveis por sua fundação logo faleceram, antes de efetivar o estabelecimento do tribunal. A criação do tribunal goês respondeu aos episódios de 1557, uma devassa inquisitorial conduzida pelo tribunal eclesiástico de Goa, em que foram instaurados vinte processos envolvendo cristãos-novos de Goa e de Cochim. 10 A perseguição foi estimulada pela descoberta de blasfêmias contidas em escritos depositados na arca de esmolas do Santíssimo Sacramento no dia de Corpus Christi e pela denúncia contra hereges na caixa de esmolas da igreja do convento de São Domingos. 11

O Tribunal do Santo Ofício de Goa foi instituído em dois de março de 1560. O Tribunal possuía jurisdição sobre todo o Estado da Índia, isto é, sobre os domínios portugueses que se estendiam da costa oriental ao Extremo Oriente. Começou a funcionar no ano seguinte, com a chegada dos primeiros inquisidores de Goa: Aleixo Dias Falcão e Francisco Marques Botelho. Deve ter adotado os regimentos dos tribunais do reino (dos anos 1552, 1613 e 1640, especificamente). Contudo, em 1778, foi produzido um regimento exclusivo para o tribunal goês.12

O Santo Ofício de Goa possuía dois inquisidores, ao passo que os tribunais de Portugal contavam com três e entre os inquisidores de Goa existia uma hierarquia, pois havia o cargo de primeiro inquisidor. Os inquisidores de Goa eram nomeados pelo inquisidor-geral do Conselho Geral da Inquisição de Portugal, que era um tribunal de última instância com poderes sobre os tribunais de distrito (caso dos tribunais de Coimbra, Évora, Goa). Os membros do Conselho Geral de Portugal eram nomeados pelo inquisidor-geral, sendo consultado o rei; o cargo superior de inquisidor-geral era escolhido pelo rei, com nomeação do Papa.

No nível dos funcionários, a estrutura administrativa do Tribunal de Goa assemelhava-se à organização dos tribunais do reino, com os mesmos oficiais: alcaides, promotores, notários e cirurgiões. Esses funcionários eram auxiliados por uma rede de colaboradores voluntários, os familiares e os comissários, que deveriam ser portadores de determinados atributos como a limpeza de sangue, ou seja, não revelar ascendência judaica, muçulmana, negra ou indígena.13

A carreira dos inquisidores do Tribunal do Santo Ofício de Goa era bastante restrita, limitando-se à ocupação de cargos eclesiásticos no Estado da Índia, pois dificilmente os inquisidores de Goa ocupavam posteriormente importantes cargos no reino.14 Mas é preciso considerar que a investidura de funcionários e de familiares na Inquisição concedia distinção social, pois os pretendentes aceitos teriam passado por um processo de habilitação para comprovar que eram naturais do reino, de sangue puro, não haviam sido presos pelo Santo Ofício e sabiam ler.15 Os aceitos pelo Santo Ofício obtinham uma distinção em relação a outras famílias e facções de poder.

Os cargos da Inquisição atraíam pelos privilégios concedidos pelos reis aos seus oficiais e familiares, como a isenção de impostos, obrigações comunitárias, serviço militar ou alojamento de tropas, autorização para uso de vestuário de seda – mesmo não sendo cavaleiro –, licença para porte de armas, admissão de jurisdição privada em grande parte dos crimes e disputas judiciárias.16

A singularidade do Tribunal do Santo Ofício de Goa precisa ser destacada, por não ter existido outro tribunal inquisitorial nos domínios coloniais portugueses, visto que os demais domínios ultramarinos portugueses – na costa ocidental africana, no norte da África, nas ilhas atlânticas e no Brasil – estavam sob o controle do Tribunal da Inquisição de Lisboa, sem a criação de um
tribunal local.

“Misericórdia e justiça”: a perseguição dos delitos contra a fé católica no Oriente Português

Além da singularidade de ser o único tribunal formalmente presente no ultramar português, outro traço marcante da Inquisição de Goa foi o fato de ter ultrapassado a sua jurisdição para julgar cristãos que transgredissem os preceitos da fé católica, pois perseguiu também não-cristãos, caso fossem acusados de induzir os católicos a adotarem práticas “gentílicas”, 17 que consistiam em ações como conceder oferendas aos deuses indianos, trabalhar em obras de pagodes (templos ou ídolos das seitas indianas), cultivar várzeas de hindus, usar “traje gentílico”, portar o corumbi (rabicho na cabeça utilizado pelos membros da casta brâmane), casar à maneira gentílica com profusos ritos.

Deste modo, a Inquisição ampliava o número de atingidos por suas inquirições, ao perseguir inclusive aqueles que sequer teriam passado pelas águas do batismo católico, como os gentios indianos (que mantiveram suas crenças religiosas, sem aderir ao catolicismo). Mas o Conselho Geral de Portugal determinou que os inquisidores de Goa agissem contra os gentios apenas “em caso que lhes conste que persuadem, ou querem persuadir a sua secta aos christãos e tratam de os perverter e fazer idolatrar”.18

Uma consulta apresentada pelos inquisidores de Goa ao Conselho Geral, em dois de abril de 1601, indagava qual o procedimento diante de indianos que adotaram a fé católica e estiveram em “conventículos e pregações dos gentios e dos seus Bragmanes”. 19 Ratificou-se que para serem vítimas da Inquisição era necessário que os gentios seduzissem os cristãos a se afastarem da fé católica, como se torna perceptível ao ser analisado outro caso de dois gentios de Diu, descobertos através da visitação empreendida pelo arcebispo. Estes gentios eram suspeitos de criar uma seita, que afirmava que os homens não deveriam mais comer e beber. O Conselho Geral determinava que se averiguasse se os gentios convenciam os cristãos a professarem a exótica crença, “porque se somente elles os fazião parece que não pertence o caso ao Sancto Officio pois são gentios.” 20

Inicialmente, as perseguições empreendidas pela Inquisição de Goa incidiram especialmente sobre os cristãos-novos acusados de “judaizarem”,21 que eram suspeitos de assistirem à missa e cuspirem durante a exposição do Santíssimo Sacramento, além de serem vigiados para descoberta de indícios de suas antigas crenças e hábitos, sobretudo as interdições alimentares, como não ingerir carne de porco ou só comer carne tratada por rabino ou por um judeu da região de Cochim; tomar beberagem de água e passa branca espremida pelo rabino durante o pôr-do-sol de sexta-feira, que inicia a observância do sábado. 22

Se nas primeiras décadas de atuação do Santo Ofício de Goa os cristãos novos foram os mais perseguidos pela Inquisição de Goa, o número de acusados de serem judaizantes reduziu-se no final do século XVI, pois a perseguição ao gentilismo aumentava gradualmente. 23 Na medida em que os inquisidores se deparavam com práticas locais que desconheciam, evidenciaram as suas dúvidas acerca da classificação dos costumes locais, pois não sabiam se consistiam em indícios de uma crença pagã – seriam ações inócuas que não afetavam a vida dos cristãos do Oriente ou costumes que deveriam ser reprimidos pelos inquisidores?

O inquisidor-geral, D. Pedro de Castilho, pedia para serem feitas as diligências necessárias antes de apresentar o parecer sobre os “que curam com paninhos e cruzes”, mas recomendava a investigação para saber se “há nisto algum pacto com o demônio”. 24 Cita-se como exemplo a insegurança do inquisidor de Goa, que não sabia “como proceder diante do caso de cristãos que morrem em terras de mouros ou gentios, andando vestidos ao seu modo”. Esses cristãos deveriam ser considerados apóstatas? A resposta do Conselho Geral de Portugal considerava que deveria ser tratada como apostasia se os cristãos, além de usarem o vestido de mouro ou gentio, freqüentassem as mesquitas ou os templos hindus, fossem circuncisos, casassem-se com muçulmanas ou gentias e cumprissem as cerimônias típicas de matrimônio. 25 O Conselho Geral de Lisboa pronunciou-se sobre os ritos gentílicos que envolviam “sacrifícios de fogo, sangue”, estabelecendo que os praticantes destes rituais devessem ser acusados pela intenção de cultuar os seus deuses ancestrais.26

Porém, o Conselho Geral de Lisboa recomendava que os indianos que adotassem a fé católica fossem tratados com certa “brandura”, para que não fossem afastados da Igreja. Em alvará de 1576, o monarca revelava o conhecimento sobre os casos de cristãos “que na Índia abandonam a fé católica tornando-se mouros, judeus ou gentios” e daqueles que desejavam se retratar e retornar ao seio da Igreja, mas “o deixão de fazer com temor de minhas justiças”.27 No alvará de 1586, foi publicado um édito da graça para estimular o arrependimento dos cristãos transgressores. O édito concedia um período de até seis meses para se apresentarem ao Santo Oficio, confessarem suas culpas a fim de serem recebidos “com benignidade e misericórdia” pela “santa madre igreja, sem por isso haverem pena e condenação alguma”. Os bens daqueles que se confessassem também seriam poupados, como mais um incentivo para que retornassem à tutela da Igreja. 28 Em 22 de março de 1598, o inquisidor-geral D. Alberto determinou que os inquisidores de Goa recebessem com “misericórdia e caridade” todos os indianos recém-convertidos, logo que confessassem as suas culpas. 29

A leitura dos documentos revela a imagem que os inquisidores possuíam sobre a sua própria atuação e o papel do tribunal do Santo Ofício, enquanto uma instituição centrada na “piedade”, na “misericórdia”, no zelo em busca da remissão das almas dos pecadores. A noção de que o Tribunal da Inquisição assentava seus procedimentos na misericórdia exprime-se no estandarte da Inquisição de Goa, que ostentava o lema “misericórdia e justiça”. Os inquisidores não viam a sua atuação como algo cruel, tratava-se de um trabalho necessário, indispensável. Ademais, Deus não teria sido o primeiro a começar o trabalho de interrogar, quando inquiriu a Adão no Paraíso?30 Porém, os seus maiores críticos alimentaram a “lenda negra” do Santo Ofício, denunciando os aspectos arbitrários da ação inquisitorial e divulgando obras polêmicas com ilustrações que denegriam a instituição, afastando-a da idéia de justiça e de misericórdia. 31

O funcionamento do Tribunal da Inquisição de Goa

As correspondências da Seção de Manuscritos da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro permitem o estudo dos fluxos de comunicação entre os inquisidores de Goa e o Conselho Geral da Inquisição de Portugal. Os fluxos de comunicação nas inquisições do período moderno eram verticais: os inquisidores locais comunicavam-se regularmente com o organismo central, no caso, com o Conselho Geral da Inquisição de Portugal. Os organismos centrais deveriam ser informados sobre as atividades dos tribunais de distrito e das rotinas de tribunais periféricos, como o Tribunal de Goa. O objetivo era tentar controlar a tomada de decisões, especialmente em relação à produção de sentenças. 32 Eram recorrentes as consultas sobre o processo penal, os conflitos de jurisdição entre autoridades civis e eclesiásticas e as disputas pela melhor apresentação pública nos autos-de-fé.

Os inquisidores de Goa atuaram como “olhos dos inquisidores-gerais” que estavam no reino de Portugal, visto que mencionavam as condições da vida religiosa local. Mas as cartas permitiam aos inquisidores de Goa fornecer a sua própria versão dos acontecimentos, podendo favorecer seus protegidos ou denegrir seus inimigos diante do inquisidor-geral. É possível identificar os conflitos entre os inquisidores de Goa e os vice-reis do Estado da Índia. Os inquisidores de Goa queixavam-se ao inquisidor-geral a respeito do tratamento dispensado pelos vice-reis, que foram acusados de
não tratarem os inquisidores com toda a deferência esperada. Em Goa, os inquisidores desejaram a excomunhão do vice-rei, o que foi proibido pelo Conselho Geral de Portugal em 1598, devido ao escândalo que poderia suscitar tal ação. 33

Problemas associados à etiqueta eram comuns em tribunais periféricos, por estarem distantes do poder central e mais suscetível a conflitos estatutários. 34 Tais embates eram recorrentes em situações de representação do poder e da autoridade, como nos autos-de-fé, ocasião em que ocorriam disputas em torno da disposição do assento do vice-rei do Estado da Índia e do arcebispo de Goa. O Conselho de Geral escreveu aos inquisidores de Goa sobre o desejo do Arcebispo exibir-se nos autos da fé sentado em cadeira de espaldar e com sitial – assento usado em atos solenes por indivíduos importantes.35 Em 25 de agosto de 1635, o inquisidor Antônio de Faria Machado recomendava que fosse explicado ao vice-rei do Estado da Índia que o lugar em que esperava aparecer no auto da fé era “muito mais alto do que costumavam seus antecessores” e com um dossel por cima.36

Os autos-de-fé da Inquisição de Goa consistiriam em experiências visuais apoteóticas, que deveriam sensibilizar os habitantes locais. Tudo deveria impressionar, esperando atrair os neófitos e os gentios. Havia a preocupação com os detalhes da representação dos autos-de-fé e a busca por exaltar o papel dos eclesiásticos. 37

As representações de poder associadas ao Tribunal tornam-se um aspecto relevante da pesquisa sobre o Santo Ofício na medida em que os ritos, seqüência de atos ordenados e repetitivos, dotados de um caráter transcendente para os agentes inquisitoriais que os realizavam, revelavam muito sobre a ordem social e institucional. O sistema ritual da Inquisição com as publicações de éditos, a apresentação dos condenados nos autos de fé era marcado por uma etiqueta que indicava as relações hierárquicas no interior dos tribunais. O papel dos símbolos de poder seria ainda maior no Oriente que no reino, como uma necessidade de reiterar a autoridade de diversos níveis da estrutura administrativa do Estado da Índia. 38

A Inquisição buscou a colaboração do Arcebispado de Goa, das ordens religiosas e da população local para controlar os corpos e as almas dos habitantes do Estado da Índia.39 Acerca da relação entre inquisidores e membros de ordens religiosas, era recorrente o uso do clero regular letrado (membros de ordens religiosas) como revedores. O inquisidor-geral Pedro de Castilho ordenou que as livrarias fossem visitadas por revedores40 do Santo Oficio e demais religiosos letrados do clero regular, em 20 de fevereiro de 1606. 41 No mesmo ano, a Mesa da Inquisição de Goa escolheu o jesuíta Flamínio Calvo e o franciscano Paulo da Trindade como revedores. 42 Quatro anos depois, recomendava que os missais utilizados na Índia fossem similares ao missal romano e que a revisão fosse feita por jesuítas e dominicanos.43

Além da utilização de membros das ordens religiosas, a Inquisição serviu-se de certos expedientes para ampliar a sua área de abrangência, como as visitas de inspeção a livrarias, bibliotecas, navios e tipografias. O Conselho Geral do Santo Ofício mencionou a existência de bíblias “impressas em espanhol pelos holandeses”, nas quais “meterão muitas das suas heresias com pretexto de as levarem a este Estado da Índia e a semearem nelle”. O Conselho recomendou a execução de diligências “para que os livros e as idéias hereges não se alastrem pela Índia”. 44

As visitas inquisitoriais consistiam em instrumentos excepcionais de ação do Santo Ofício. As visitas poderiam ser efetuadas para investigar o comportamento e as crenças da população, mas também para acompanhar o funcionamento da burocracia e o cumprimento das tarefas. O visitador era investido por uma comissão do inquisidor-geral e prestava juramento ao Conselho Geral, a quem reportaria o resultado de suas investigações. As visitas inquisitoriais ao Tribunal de Goa ocorreram em 1583, 1591, 1608 e 1632.45 Os comissários nas fortalezas da Índia e as visitas inquisitoriais ampliavam o raio de ação do tribunal goês.

As correspondências indicam como a população local auxiliou o Tribunal da Inquisição de Goa, como os “naiques” do Santo Ofício. A expressão naique foi primordialmente usada para designar membros de milícias que alegavam descender da casta guerreira kshatriya, porém adquiriu o sentido de oficiais de diligências que atuaram nas diferentes instituições do Estado da Índia (na Índia, em Macau e na costa oriental africana).

O episódio que envolveu Manuel Colaço, “naique do Santo Ofício”, revela as pretensões dos naiques que esperavam garantir a influência sobre os moradores de Goa (aparentemente, abusando dos poderes que lhe foram conferidos, atuando como uma espécie de “cacique” local). Os naiques almejavam desfrutar dos privilégios concedidos àqueles que ocupavam cargos no Santo Ofício. O conhecimento destes privilégios pelos naiques parece bastante claro, do mesmo modo que a tentativa de se aproveitar de uma poderosa instituição do Estado da Índia, uma vez que o tribunal que poderia atuar como o algoz dos naiques teria sua função invertida: tornara-se uma armadura que lhes fornecia proteção, que lhes distinguia da população comum oprimida.

Manuel Colaço envolveu-se em uma briga pelo usufruto de palmares, na primeira metade do século XVIII. Irascível, Manuel Colaço prendeu os irmãos indianos Manoel e Paulo em uma árvore e os espancou. Os indianos que levaram pancadas de Colaço eram vigias e criados do contratador dos direitos dos coqueiros, Antônio João de Albuquerque. Depois da confusão, Manuel Colaço fez uma petição ao vice-rei, D. Rodrigo da Costa, “a fim de não ser punido em outro juízo mais que no da Inquisição”.46 Colaço esperava garantir o privilégio dos oficiais e dos colaboradores da Inquisição, que consistia em ser julgado exclusivamente pelo Santo Ofício e não por outro tribunal. Iniciou-se uma querela em torno de quem deveria julgar o naique: a Inquisição ou o ouvidor geral do crime.

O ouvidor geral do crime rejeitava a possibilidade de Manuel Colaço ter seu delito julgado pelos inquisidores de Goa, alegando que “o Nayque de que se trata não he dos officiaes continuos da Inquisição nem dos expressamente nomeados” no alvará de D. Henrique de 18 de janeiro de 1580. Neste alvará, prosseguiu o ouvidor, não estaria mencionado o ofício de “naique” com isenção do pagamento de tributos e com jurisdição privativa. O ouvidor mencionava que os privilégios contidos no alvará eram restritos aos “ officiaes que forem contínuos” e não se aplicavam aos naiques, que assumiam uma função extraordinária, “destinado para servir com o Comissario de Salsete em terra distincta, e separada da cidade de Goa”. 47

O ouvidor amparou-se no episódio dos naiques que serviam ao comissário de Macau, em que depois de várias controvérsias foi estabelecido que nenhum dos naiques gozaria do privilégio do foro da Inquisição, “por não serem officiais contínuos”. Como classificar estes naiques no âmbito da estrutura inquisitorial? Certamente não se tratavam de oficiais certificados do Santo Ofício, pois não seriam aprovados no processo de habilitação. Bruno Feitler menciona que os comissários extraordinários podiam ter origens sociais simplórias e mesmo sangue impuro, mas os comissários certificados, por serem representantes oficiais da Inquisição, precisavam ser irrepreensíveis.48 Os naiques assumiam, portanto, funções extraordinárias, auxiliando os comissários. Os inquisidores de Goa apresentaram parecer favorável aos privilégios reivindicados pelo naique Manuel Colaço. Os inquisidores de Goa afirmavam que fosse considerado:

“o requesito de merecimento da parte do privilegiado na pessoa do Nayque [...] porque como a maior parte dos presos contra os quais em grande número se procede na dita Inquisição são Mouros, e Gentios de várias seitas, línguas, e nações, e os Nayques que se elegem para o dito effeito são peritos nellas, ficão sendo precisamente necessários ao Santo Ofício para servirem de intérpretes, e sem elles he impossivel o processar-se e expedirem-se as causas, tomar denunciações, e perguntar testemunhas49

Os privilégios concedidos aos oficiais e familiares do Santo Ofício estavam associados a um critério de limpeza de sangue. Porém, os inquisidores de Goa consideravam justo estender estes privilégios aos naiques por seus “méritos”, pelos seus serviços como intérpretes e no controle das populações locais, pois os naiques “assistem aos Comissários fora da cidade de Goa”, fazendo muitas diligências entre os gentios. Segundo os inquisidores, os naiques estavam “sempre promptos” e sempre vigiavam para que “não fação pagodes, nem venhão gentios a ensinar nem exercer seos depravados ritos, e perverter aos vassalos de Sua Magestade”.

Por fim, os inquisidores de Goa explicaram a razão dos naiques serem utilizados pelo Santo Ofício, que “os occupa na falta de familiares brancos”. Os familiares brancos, principalmente os que são “familiares do número”50, desfrutavam de privilégios do foro sem terem ocupação atual, sendo portanto justo que os naiques “por estarem promptos quando forem chamados” recebessem os mesmos privilégios.51 Em linhas gerais, a participação dos naiques revela a existência de grupos locais que apoiaram a atividade da Inquisição de Goa.

A Inquisição e o controle da consciência

Os tribunais inquisitoriais modernos podem ser compreendidos como instituições que buscam disciplinar as consciências, de modo que a história destas instituições estaria vinculada à história das práticas e do sentimento religioso. 52 A análise da consciência como elemento fundamental para compreender o funcionamento da Inquisição foi apontada por Adriano Prosperi, que demonstrou como o Santo Ofício recorreu ao sacramento da confissão para exercer o controle sobre a sociedade, pois, apesar dos confessores não terem sido obrigados a denunciar aqueles que se confessavam, faziam perguntas esperando extrair maiores informações e indícios de cúmplices na prática do pecado. No “Manual de Confessores” atribuído ao franciscano da frei Rodrigo do Porto, encontra-se a recomendação ao sacerdote que “deve com diligência escoldrinhar a consciência do pecador [...] assi como o médico a enfermidade, o juiz a causa. Porque ho que o penitente cala preguntando ho revela.”53

O funcionamento da Inquisição da Goa dependia da colaboração dos habitantes locais, devendo estimular sentimentos que levassem a população a cumprir o papel de bons cristãos, tal como denunciar os suspeitos de delitos contra a fé católica. As denúncias deveriam ser feitas para “descarregar” as consciências, torná-las livres e facilitar a salvação das almas. Seria um dever do
bom cristão praticar a denúncia, incitada através dos editais da fé. A leitura dos editais da fé deveria despertar o medo e o sentimento de culpa, de modo que a delação serviria para “descarregar” o peso da consciência e para cumprir a obrigação cristã de salvar a alma do próximo, mediante a denúncia de suas transgressões. A delação não deveria produzir um sentimento de culpa naquele que denunciava, pois seria a garantia de se livrar deste sentimento.

Os pregadores que faziam sermões de abertura das visitas inquisitoriais deveriam estimular o “zelo”, a “caridade” para que as pessoas denunciassem os culpados de delitos contra a fé e a moral cristã. Deste modo, torna-se essencial verificar o teor dos sermões proferidos no âmbito da ação inquisitorial em Goa como dispositivos usados para penetrar nas consciências individuais.

Os sermões proferidos nos autos-de-fé glorificavam a atividade inquisitorial, recorriam a temas de polêmica antijudaica e incentivavam a confissão e delação dos delitos contra a fé católica. Frei Gaspar de Amorim, da Ordem de Santo Agostinho, pregou em auto-de-fé realizado em 26 de agosto de 1635 em Goa, cujo tema central era apresentar os castigos àqueles que não teriam seguido o caminho do Evangelho anunciado pelos apóstolos, “os quais caminhos manquejam os judeus, e hereges”. Frei Gaspar afirmava que o objetivo do sermão era demonstrar os erros dos pecadores “que neste autos estão presentes mancos em a fé”.54

A primeira parte do sermão apresentava a resistência judaica em aceitar o Messias e as suas conseqüências. O confisco dos bens, o cárcere e ser consumido pelo fogo (os suplícios do passado e do presente) eram apresentados como cumprimentos de profecias anunciadas no Antigo Testamento. Além dos judeus, frei Gaspar Amorim tratou de outros “mancos” na fé, os hereges. A heresia seria para o pregador “a peste da alma”, sendo imenso o papel do “tribunal da saúde”. Os cidadãos deveriam colaborar com a salvação das almas: “sabendo que há algum não só ferido senão indiciado de peste, o denuncie logo aos juízes da saúde”. A Igreja Católica para evitar que este mal fosse disseminado “tem o tribunal da saúde que é o do Sancto Officio”, que tem por juízes os inquisidores e como “casa de saúde” o cárcere da Inquisição. 55

Frei Gaspar de Amorim convocou a participação de todos os fiéis na luta contra a heresia, não devendo ser encoberto nenhum suspeito, “ainda que seja vosso irmão vossa mulher, ou hum amigo que amais”. 56 O papel dos inquisidores seria retirar o herege do convívio entre cristãos, conduzindo-o aos cárceres para ser “curado deste mal”, mas aqueles que não forem curados “sejão consumidos em fogo”. 57 O sermão de frei Gaspar Amorim exemplifica a outra face da Inquisição, que consistia em tentar penetrar nas consciências individuais, através das admoestações contidas em sermões que seriam lidos por ocasião dos autos-de-fé ou da apresentação de éditos.

A análise das correspondências entre o Conselho Geral de Lisboa e a Mesa da Inquisição de Goa existentes no acervo da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro propicia a identificação das práticas inquisitoriais no Oriente Português, quais os expedientes utilizados pelo Santo Ofício de Goa para controlar os corpos e as consciências de habitantes que ocuparam domínios tão esparsos que se estendiam do litoral oriental africano até Macau.

Notas

1 Após a viagem de Vasco da Gama, que aportou em Calicute em 1498, os portugueses enviaram embarcações e empreenderam conquistas e negociações nas regiões banhadas pelo Índico. Em 1505, foi instituído o “Estado da Índia”, expressão que caracterizou o conjunto de diferentes domínios portugueses que se estendiam desde a costa oriental africana até o Extremo-Oriente. Em 1510, Afonso de Albuquerque conquistou a região de Goa, que se tornou a capital do Estado da Índia. Ver: THOMAZ, Luiz Filipe. De Ceuta a Timor. Lisboa: Ed. Difel, 1994.

2 Informação extraída de BAIÃO, António. A Inquisição de Goa. Tentativa de história de sua origem, estabelecimento, evolução e extinção. Lisboa: Academia das Ciências, 1945, v. I. Sobre as fontes inquisitoriais, no Arquivo Nacional da Torre do Tombo encontram-se os fundos “Conselho Geral do Santo Ofício” e “Inquisição de Lisboa”; na Biblioteca Nacional de Lisboa: Coleção das mais célebres sentenças das Inquisições de Lisboa, Évora, Coimbra e Goa (microfilme F.2349 e F. 5096); Coleção de listas impressas e manuscriptas dos autos de fé públicos e particulares ocorridos entre 1540 e 1820 (microfilme F.2545); Coleção dos autos de fé e listas das pessoas que forão penitenciadas pela Inquisição de Portugal (microfilme F.1438 e F. 1439). Há a documentação impressa em: BAIÃO, António. A Inquisição de Goa. Correspondência dos inquisidores da Índia (1569-1630). Coimbra: Imprensa da Universidade, 1930, v. II.

3 Anais da Biblioteca Nacional – Vol. 120 (2000) – Rio de Janeiro, 2006, p.10-12. Os documentos mencionados encontram-se na Seção de Manuscritos e são os códices com notação de 25,1,001 a 25,1, 009.

4 FEITLER, Bruno. Nas malhas da consciência: Igreja e Inquisição no Brasil. São Paulo: Alameda: Phoebus, 2007, p.10. O autor destaca como o funcionamento do Santo Ofício institucionalizou-se através de suas próprias práticas, ultrapassando as normas definidas nos regimentos da Inquisição.

5 PALOMO, Federico. “ ‘Disciplina christiana’ :Apuntes historiográficos en torno a la disciplina y el disciplinamiento social como categorías de la historia religiosa de la alta edad moderna”. Cuadernos de Historia Moderna, Universidad Complutense. Madrid, no. 18, 1997.

6 PROSPERI, Adriano. Tribunali della coscienza. Inquisitori, confessori, missionari. Torino: Einaudi, 1996, p. XI- XII.

7 RAMINELLI, R.“Império da Fé”. In: João Fragoso; Maria Fernanda Bicalho ; Maria de Fátima Gouvêa, (Org.). Antigo regime nos Trópicos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001, v. , p. 225-247.

8 BETHENCOURT, Francisco. “A Inquisição” In AZEVEDO, Carlos Moreira (dir.). História Religiosa de Portugal. Lisboa: Círculo dos Leitores, 2002, v. 2, p.95-131; CARDAILLAC, Louis. Toledo, séculos XII-XIII. Muçulmanos, cristãos e judeus. Lisboa : Terramar, D.L. 1996.

9 BETHENCOURT, Francisco. História das Inquisições: Portugal, Espanha e Itália, séculos XV- XIX. São Paulo: Companhia das Letras, 2000, p.292-293.

10 Na região, havia os “judeus pretos” que se instalaram em Cochim e falavam a língua local malayalam e os “judeus brancos”, oriundos da Europa, sobretudo Holanda e Espanha.

11 CUNHA, Ana Cannas da. A Inquisição no Estado da Índia. Origens (1539-1560). Lisboa: Divisão de Publicações dos Arquivos Nacionais/ Torre do Tombo, 1995.

12 TAVARES, Célia Cristina da Silva. “Santo Ofício de Goa: estrutura e funcionamento” In Vainfas , Lage & Feitler (org). A Inquisição em cheque: temas, controvérsias, estudos de caso. Rio de Janeiro: Eduerj, 2006, p.48.

13 FEITLER, Bruno. Nas malhas da consciência: Igreja e Inquisição no Brasil. São Paulo: Alameda: Phoebus, 2007, p.10; BOXER, C. R. O império marítimo português. Lisboa: Edições 70, 2001, p. 183.

14 Como exceção, o inquisidor Bartolomeu da Fonseca depois de regressar de Goa, tornou-se inquisidor de Coimbra, membro do Conselho Geral e conselheiro de Filipe III. BETHENCOURT, F. História das Inquisições.. São Paulo: Companhia das Letras, 2000, p.130.

15 FEITLER, Bruno. Nas malhas da consciência: Igreja e Inquisição no Brasil. São Paulo: Alameda: Phoebus, 2007, p. 90; BETHENCOURT, Francisco. História das Inquisições. São Paulo: Companhia das Letras, 2000, p. 137.

16 BETHENCOURT, Francisco. História das Inquisições: Portugal, Espanha e Itália, séculos XV- XIX. São Paulo: Companhia das Letras, 2000, p.139.

17 BOSCHI, Caio. “Estruturas eclesiásticas e Inquisição” In BETHENCOURT, Francisco e CHAUDHURI, Kirti. História da expansão portuguesa. Lisboa: Círculo dos Leitores, 1998, p.429-452.

18 Biblioteca Nacional, 25,1,001, n.107. Adiante, a notação utilizada para se referir ao acervo da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro será BN.

19 BN, 25, 1, 001, n.107.

20 BN, 25,1,001, 158 e 162.

21 TAVIM, José Alberto Rodrigues da Silva. “A Inquisição no Oriente: século XVI e primeira metade do século XVII”. Mare Liberum, nº 15, p.17-31.

22 CUNHA, Ana Cannas da. A Inquisição no Estado da Índia. Origens (1539-1560). Lisboa: Divisão de Publicações dos Arquivos Nacionais/ Torre do Tombo, 1995.

23 LOPES, Mª de Jesus dos Mártires. op.cit., p.107-136, junho, 1998.

24 BN, 25,1,002, n.091. Escrito em 15/02/1612.

25 BN, 25, 1,001, n.278. Ver também BNRJ, 25,1,003,n.061.

26 BN, 25, 1, 004, n.043.

27 BN, 25, 1, 003, n.038; BN, 25, 1, 003, n.059. Em 20 de março de 1587, o inquisidor-geral, o cardeal Alberto, afirmava que “foy muito bem feito não consentirdes que as justiças seculares se entremetessem em tomar as fazendas dos que se lançam com os gentios e mouros, julgando-os por apostatas, que o julgar se se apartarão da ffé, ou não apartarão pertence ao sancto officio e não a outro juízo algum”. BN, 25,1,003,n.065.

28 BN,25,1,003,n.059

29 BN, 25, 1, 001, n.089.

30 Adriano Prosperi. op.cit, p. 159.

31 Uma das obras que favoreceu a divulgação da imagem negativa do Santo Ofício de Goa foi a “Narração da Inquisição de Goa” (Leyden, 1657) de Charles Dellon, seu ex-prisioneiro. A tradição liberal e democrática também contribuiu para construção da imagem violenta da Inquisição. Contudo, tais afirmações não devem ser entendidas como uma postura revisionista que edulcora a ação do tribunal da inquisição. Sobre a imagem negativa construída pelos grupos sociais mais perseguidos pela Inquisição, ver: BETHENCOURT, Francisco. História das Inquisições..., p.335-378.

32 BETHENCOURT, História das Inquisições..., p.39.

33 BN, 25,1,001, 158 e 162

34 BETHENCOURT, Francisco. História das Inquisições..., p.80.

35 BN, 25,1,001, n.133, 134 e 138

36 BN, 25,1,004,n.032

37 BN, 25, 1,001, n.107.

38 TAVARES, Célia Tavares da Silva. Jesuítas e inquisidores..., p. 169.

39 Consultar a obra de Célia Tavares para a análise da relação entre a Inquisição de Goa e a Companhia de Jesus, sobretudo a heterogeneidade de posições dos jesuítas diante da ação inquisitorial. TAVARES, Célia Cristina da Silva. Jesuítas e inquisidores em Goa: A cristandade insular (1540-1682). Lisboa: Roma Editora, 2002.

40 Os revedores ou qualificadores estavam encarregados do exame dos livros e comunicação aos inquisidores sobre a existência neles de proposições contrárias à fé católica.

41 BN, 25, 1, 002, n.010.

42 BN, 25, 1, 004, n.040.

43 BN, 25, 1,002, n.068.

44 BN, 025,1,001,065 e 067. Escrita em Lisboa, em 5/4/1603.

45 O primeiro visitador foi frei Gaspar de Melo. Em 20 de março de 1591, o inquisidorgeral cardeal Alberto instituiu a visita de todos os tribunais do reino, incluiu o Tribunal de Goa e nomeou o provincial dos jesuítas, Pedro Martins, como visitador. Em 1608, a visita do Tribunal de Goa ficou a cargo de seu arcebispo, D. Aleixo de Menezes; na de 1632, o visitador era o inquisidor de Lisboa, Antônio de Vasconcelos, quando o primeiro inquisidor de Goa (João Delgado Figueiredo) foi acusado de mais de cem infrações. Ver BN, 25, 1, 003, n.078; BETHENCOURT, Francisco. História das Inquisições..., p.192-194.

46 BN, 25,1, 005, n.215.

47 BN, 25,1, 005, n.215

48 Bruno Feitler. op.cit, p.134.

49 BN, 25,1, 005, n.215.

50 WADSWORTH, James E. “Os familiares do número e o problema dos privilégios” In VAINFAS, LAGE & FEITLER. A inquisição em xeque. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2006, p.97-112.

51 BN, 25,1, 005, n.215.

52 PROSPERI, Adriano. op. cit. p.228-229.

53 PORTO, Frei Rodrigo do. Manual de confessores e penitentes: em ho qual breve e particular, e muy verdadeiramente se decidem, e declara quase todas as duvidas, e casos, que nas confissões soe ocorrer... Coimbra: Joao da Barreyra & Joao Alvares, 1549. Consta na Seção de Obras Raras da Biblioteca Nacional.

54 AMORIM, Frei Gaspar de In Sermões dos autos de fé pregados nas cidades de Lisboa, Coimbra, Évora e Goa. Lisboa: Antonio Alvarez, 1637, tomo III, fl.1. Consta na Seção de Obras Raras da Biblioteca Nacional.

55 Idem, 14v.

56 Idem,, fl. 14v-15, 37.

57 Além de dedicar-se aos judeus e hereges, frei Gaspar de Amorim tratou de enfermidades “menores” (comparadas com as duas primeiras), que seriam as superstições e feitiçarias, assim como a sodomia.

* Patricia Souza de Faria é Doutora em História (UFF) – Bolsista da Biblioteca Nacional

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