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Lorenzo Perosi e o Brasil

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"Maestro Perpetuo": A obra musical de Perosi

por Thiago Plaça Teixeira
1. Gêneros musicais. Lorenzo Perosi compôs vinte e dois oratórios, sendo doze deles – os mais célebres – entre 1897-1907 e dez entre 1909-1950. Quanto às Missas, tem-se registro de cerca de cinquenta e quatro obras, mas vinte delas se perderam ou delas restaram somente fragmentos. Os motetos, para formações vocais diversas, totalizam cerca de trezentas e quarentas peças, incluindo-se aqui antífonas, salmos, hinos, sequências, Magnificats e outras formas litúrgicas. Há ainda cerca de vinte outras obras vocais, principalmente hinos religiosos em italiano, não destinados às funções litúrgicas. No âmbito da música puramente instrumental, encontram-se vinte e seis obras orquestrais (concertos para clarinete, piano, violino, suítes orquestrais etc.) e trinta e quatro obras de câmara, dentre as quais três trios, dezessete quartetos e cinco quintetos, entre outras.[1]

2. Anos de Veneza.[2] O período em que Perosi residiu em Veneza, entre 1894 e 1898, foram muito frutuosos do ponto de vista musical, compondo a maioria de suas obras futuramente mais famosas. Durante 1894, compõe sua primeira missa de fama mais duradoura, a Missa Davidica, dedicada a seu amigo Don Davide Albertario. Duas semanas após sua estreia como diretor da Cappella Marciana, Perosi apresenta pela primeira vez sua Missa Patriarchalis, a quatro vozes, dedicada ao Cardeal Sarto, na festa da Imaculada Conceição (8 de dezembro de 1894). Em 1895 é publicado o volume Centonum, uma coleção de cem pequenas obras de uso litúrgico para órgão, a maioria com escrita harmônica a quatro vozes, para ser executado em órgão ou harmônio, com ou sem pedais.

Em 1896, Perosi compõe sua mais famosa Missa, a Missa Pontificalis para três vozes (S-T-B). Do mesmo ano é a sua Missa Eucharistica, para quatro vozes (A-T1-T2-B), dedicada a seu amigo Pe. Francesco Saverio Engelhardt. Do período veneziano procedem também suas outras missas mais célebres: Messa da Requiem (três vozes masculinas) (1896), Messa Cerviana (1898), Missa in Honorem Ss. Gervasii et Protasii (1899), Missa Te Deum Laudamus (1899), Missa Benedicamus Domino (1900) e Missa Secunda Pontificalis (1906).

Em Veneza, havia um menino no coro com bela voz e grande talento musical, Ferruccio Menegazzi (1883-1897). A ele, Perosi compôs algumas obras para uma ou duas vozes. Quando Menegazzi morreu, ainda jovem, Perosi ficou bastante abalado e a ele dedicou três obras: o moteto Beati qui lugent, a sua Messa da Requiem (para coro masculino a três vozes e órgão) e a cantata In Coena Domini.

 3. Melodie Sacre e primeiro oratório.[3] Os pequenos motetos a uma ou duas vozes de Perosi foram agrupados e publicados em uma série de quatorze volumes chamada Melodie Sacre, entre 1897 e 1910. Os primeiros quatro volumes contêm somente motetos de Perosi e os subsequentes, alguns dele em meio a obras de outros autores. São peças sacras como Ave Maris Stella, Tota Pulchra, Ave Verum Corpus, Laudate Dominum, Ecce Panis Angelorum etc.

Em 31 de março de 1897 na Basílica de San Marco, Perosi conduziu a estreia de In Coena Domini, sujo subtítulo é Cantata alla Bachiana. Tornou-se tal obra o primeiro movimento de uma trilogia que Perosi daria o nome de La Passione di Cristo secondo San Marco. A trilogia completa, considerada o primeiro oratório de Perosi, foi estreado em Milão a 2 de dezembro de 1897 na Chiesa di Maria delle Grazie. Por meio deste primeiro oratório, Perosi alcançou grande fama e estabeleceu contato com a casa editorial Ricordi e com importantes personalidades musicais da época, como Boito e Verdi.



Fig. 5 – Interior da Basílica de San Marco, em Veneza, onde Perosi conduziu a estreia de In Coena Domini, em 1897, em registro oitocentista do fotógrafo Carlo Naya. Fonte: Acervo da Fundação Biblioteca Nacional.

4. Grandes oratórios.[4] Em 1898, Perosi compõe três oratórios. Em 20 de março, estreia La Trasfigurazione di Cristo no Palazzo delle Esposizioni em Veneza. Alguns meses depois, apresenta La Risurrezione di Lazzaro no Teatro La Fenice de Veneza, obra muito aclamada na época, vindo a ser apresentada, inclusive, no Metropolitan Opera House de Nova York, em 1899, em Buenos Aires e na Rússia. Em dezembro de 1898, Perosi conduziu La Risurrezione di Cristo, que veio a ser possivelmente seu oratório mais famoso, estreando-o em Roma, na Chiesa dei Ss. Apostoli, com um público de aproximadamente cinco mil pessoas, incluindo cardeais e nobres.

Em 1899, Perosi escreve apenas um oratório, mas um dos seus mais célebres: Il Natale del Redentore, estreado na Catedral de Como em 12 de dezembro de 1899. Nos oito anos seguintes, Perosi escreveu outros sete oratórios: L’Entrata di Cristo in Gerusalemme e La Strage degli Innocenti, estreados em 1900 sob a direção do próprio compositor no Salone Perosi; e Mosè, também de 1900, regido por Arturo Toscanini. Em 1904 são estreados Stabat Mater, Il Giudizio Universale[5], apresentado no Teatro Costanzi[6] de Roma, e Dies Iste, dedicado a S. Pio X.[7] Em 1907 tem-se o último grande oratório de Perosi: Transitus animae, apresentado na Sala Pia do Castel Sant’Angelo em Roma. Após tal obra, muitos problemas de ordem física e mental, afetarão o compositor. Nos quarenta e um anos seguintes (1909-1950), Perosi escreverá outros dez oratórios, menos conhecidos.



Fig. 6 – Primeira página de matéria da Revista da Semana acerca do célebre maestro Arturo Toscanini (1867-1957), que regeu a estreia do oratório Mosè, em 1901. Com o curioso subtítulo de “o evangelista da música”, este perfil do artista traz uma série de fotos de uma tournée do maestro com a orquestra da NBC pelo interior dos EUA. Fonte: Acervo da Fundação Biblioteca Nacional.

Apesar de ter escrito também várias obras instrumentais, será sobretudo por suas missas, motetos e oratórios que Perosi se tornará reconhecido e admirado mundialmente.

 

[1] Para lista de obras de Perosi cf. RINALDI, 1967.

[2] CIAMPA, 2006, p. 108-116.

[3] CIAMPA, 2006, p. 112-114; 122.

[4] CIAMPA, 2006, p. 143-147.

[5] Há uma gravação de 1950 pela Rádio Vaticana desse Oratório conduzido pelo próprio compositor e contando com três grandes cantores italianos da época: Marcella Pobbe, Gianna Pederzini e o grande tenor Beniamino Gigli.

[6] “O futuro santo, Papa Pio X, estava no Costanzi para a première de Giudizio. Totalmente cativado, ele foi aos bastidores após o concerto e disse ao seu amigo compositor: ‘você me deixou passar uma hora no paraíso’.” (CIAMPA, 2006, p. 145, tradução nossa)

[7] Foi cantado por Gigli ainda menino em sua cidade natal, Recanati, sob a direção do Maestro Quirino Lazzarini, grande admirador da música de Perosi.

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