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A Borboleta: periódico miscelanico

por Maria Ione Caser da Costa
A Borboleta: periódico miscelanico surgiu na cidade do Rio de Janeiro em 25 de agosto de 1844. Com periodicidade semanal, foi editado pela Typographia de J. E. S. Cabral, que estava situada na rua do Hospício, nº 66, atual rua Buenos Aires, no centro da cidade do Rio de Janeiro.

A coleção da Biblioteca Nacional é composta por quatro exemplares. Os fascículos dois, três e quatro foram lançados em 25 de agosto, 5 e 15 de setembro daquele ano. Cada exemplar possui 16 páginas, e estas são numeradas em ordem sequencial crescente em todos os fascículos, tendo a última página do quarto exemplar recebido o número 64. A pesquisa não encontrou informação sobre ter havido continuação deste título.

No alto da capa, acima do título, aparece a marca do periódico, uma borboleta. Localizada exatamente no centro da página, ela é ladeada pelo número correspondente ao volume, à esquerda e número do fascículo, à direita. Logo abaixo o título, que utilizou para sua composição a fonte egípcia, com serifas retangulares, decoradas com desenhos florais e aramados. Abaixo aparece o subtítulo, escrito com tipos maiúsculos comuns. A seguir, ao lado direito da página, um pequeno poema, sem indicação de autoria, funcionando como epígrafe: “Util, bela, e agradável, A Borboleta hade ser, Os seus leitores verão, Si olhos tiverem para vêr”.

Abrindo um parênteses para o leitor que não é especializado, mas curioso, “serifa” e “tipo egípcio” são, respectivamente, traço ou barra que remata cada haste de certas letras, de um ou de ambos os lados, e, a letra que apresenta desenho uniforme, tendo todos os seus traços a mesma espessura, com serifas retas. Segundo o Dicionário Houaiss da língua portuguesa, do qual a Biblioteca Nacional tem alguns exemplares.

A data, com o dia da semana, ocupa a linha seguinte. Logo abaixo, depois da informação sobre periodicidade e nome da tipografia, e encerrando o cabeçalho, a seguinte informação: “Subscreve-se a 700 rs. mensais, 2$000 rs. por trimestre, e 4$000 rs. por 6 meses, nas casas dos Snrs. A. F. Guimarães rua do Sabão nº 26, e Sabatier, Ouvidor nº 31. Numero avulso 200 rs.”

Um fio duplo separa o cabeçalho do conteúdo da revista.

Prospecto é o título do texto de abertura da publicação. Divulgava os objetivos do periódico, e foi assinado pelo codinome Vale.

Muito vos hade admirar, caro Leitor, vêr aparecer em publico uma Borboleta para metter-se aonde ninguém a chamou, e fallar sem pedir palavra. Parece impossível que ella também queira questionar, e entrar na arena das discussões periodicas,e o que mais é, cassuar com quem está quieto, e, que com ella não se importa, nem dá a confiança de dirigir-lhe a menor palavra. É cousa incrível que uma Borboleta tenha tino para prometer-vos que ninguém se escapará da sua critica, e que, seguindo o trilho do nosso velho Carapuceiro, tambem trabalhará em talhar, e coser carapuças, que se ajustem em todas as cabeças! Como é que póde ser que este maldito bichinho tenha até a habilidade de assistir todas as conversações, e tornar-se para com o Respeitavel, mensageiro das novidades que fôr sabendo?! Como se póde ouvir sem indignação diser uma Borboleta que hade contar, a quem dér-seámassada de atura-la, casos divertidos, novelas e romances, tudo sahido das fabricas mais modernas?!
Finalmente quem póde acreditar que um tão fraco e ridículo insecto, cujas asas se quebram se apenas cahe no laço, e se esfaiscam com um simples esfregar de dedos, crie agora forças, e se apresente dando palestra sobre mil assumptos, falando no serio, e no ridículo, em prosa e em verso, n’um estilo muito vulgar para poder ser entendida por toda especie de gente?! Nada, é caraminhola que não engulimos e que nos custa a crer porém como isto póde acontecer, porque talvez ella seja dominada por alguma entidade magnetica, aconselhamos então a todos que exconjurem esta nova espécie de Borboleta.


Nas páginas d’A Borboleta estão publicados narrativas em capítulos, que os editores chamam de romances, anedotas e casos, sonetos, glosas e charadas. A política do império é assunto privilegiado, com a maioria dos textos trazendo acirradas discussões sobre ela. Não há outras ilustrações além da borboleta, da decoração das letras do título e dos símbolos tipográficos utilizados para a separar as matérias. As críticas e sátiras ao movimento político de então se dão através dos textos literários publicados em suas páginas.

Questões que envolvem a literatura e as artes também tiveram uma atenção especial. Um exemplo é o artigo intitulado O Romance, publicado no dia 05 de setembro na página 36

O romance, considerado como futilidade por algumas pessoas graves, mas cuja falta de bom gosto por isso mesmo se denuncia, é entretanto o resumo fiel dos habitos e costumes de uma nação. Quantas veses o filosopho imparcial embalde busca a verdade na historia, e vai encontra-la no romance? Mil veses o historiador traça a seu geito os factos, dá-lhe outra apparencia, orna-os de outras molduras; enquanto que o romancista, parecendo entregue todo á imaginação, descreve fielmente os costumes da época, e apresenta em seus quadros as virtudes e vícios do seu tempo e povo; e deleitando, mais propende á verdade do que á chamada historia. [...]


Vários são os artigos que apontam para as questões que envolviam as novidades ocorridas na Corte. O fato curioso é o anonimato dos textos. Do mesmo modo são omitidos os nomes dos editores responsáveis. Dentre os poemas encontrados, selecionamos este, publicado no primeiro exemplar da publicação.

Soneto

O que tem sinhasinha? Venha cá,...
Venha ver seu caboclo, seu negrinho
Seu tudo, seu bombom, seu totosinho
Tenha d’elle mais dó, não seja má!

Algum dia fui máo, diga sinhá?
Não fui sempre seu bem, seu cachorrinho
Seus melindres, quitutes, seu bemzinho,
O que tem sinhasinha? Venha cá...

Ah! Façamos as pases, iáiásinha
Que eu nunca lhe fiz mal, ah não fui eu,
Que lhe fui falço não, minha vidinha

Não disse que seu peito era só meu?
Pois então venha cá, minha todinha,
Dê-me um beijo, e um abraço que sou seu.

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