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CICLO III - Retomada dos estudos dantescos no Ressurgimento e as traduções de suas obras no Brasil


Em 1840, Giuseppe Mazzini retomou a decisão de comentar a Divina Comédia deixada incompleta pelo poeta Ugo Foscolo, assim como foram seus comentadores Vincenzo Gioberti, Cesare Balbo, Aurelio Saffi, Niccolò Tommaseo, isto é, muitos expoentes da elite do “Ressurgimento” italiano se dedicaram a estudar Dante, reforçando mais uma vez a figura do poeta como um mito, passando de “pai da língua italiana” ao “pai da nação italiana”. Mazzini, por exemplo, irá ver em Dante o precursor da unidade nacional. Naturalmente, o patriotismo do Ressurgimento produz uma série de interpretações com finalidades políticas e, justamente por isso, nas primeiras décadas do século XIX, surgem inúmeras publicações de e sobre Dante. Em 1887, uma lei institui uma cátedra dantesca na Sapienza, Universidade de Roma, e muitos intelectuais estimularam Giosuè Carducci para ser seu mentor. No entanto, o poeta a recusa numa carta endereçada a Adriano Lemmi, publicada
na “Gazzetta dell’Emilia”, em 23/09/1887. Michele Coppino, então Ministro d’Istruzione, não satisfeito com a não formação da cátedra, decidiu criar um ciclo de leituras dantescas, e, agora, Carducci o convite para realizar a primeira leitura, em 8 de janeiro de 1888. E não por acaso, a primeira tradução integral da Divina Comédia para o português, realizada pelo Barão da Vila da
Barra, publicada postumamente em 1888, surge nesse contexto. A partir de então, outras traduções serão publicadas em nosso país, como o espectador pode ver na presente exposição.


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Flaxman, John (1755-1826). Composizioni concernenti la Divina Commedia di Dante Alighieri Parte II del Purgatorio. Karlsruhe (Alemanha): W. Creuzbauer, [18--].
Ao trecho do Canto II do Purgatório – em quatro diferentes idiomas – corresponde à imagem em que Dante e Virgílio são entornados pelas almas. O momento idílico é o resultado da extrema simplicidade obtida pela essencialidade das linhas que caracteriza o neoclassicismo ao qual Flaxman pertence.

LASSALE, Émile (1813-1871). Episódio do Inferno. Litografia feita a partir de uma pintura de Eugène Delacroix. Paris, 1859.
Émile Lassale, pintor e litógrafo, inspirou-se em La Barque de Dante, pintura realizada por Delacroix, em 1822, e considerada uma das melhores interpretações do poema dantesco. (Canto III do Inferno – Dante e Virgílio atravessam o rio Aqueronte no barco ao qual se agarram os danados).

ALVES, Castro (1847-1871). Francesca da Rimini. Desenho à lápis a partir da pintura sobre o mesmo personagem de Ary Scheffer (1795-1858).
A inspiração na literatura é uma caraterística da arte romântica. A maneira escolhida pelo poeta brasileiro para retratar a personagem dantesca foi baseada na pintura de Ary Scheffer. Ambos olham Francesca da Rimini – colocada por Dante enquanto adúltera, no Canto V do Inferno (v.73-75) – com a mesma indulgência e ardor romântico.

INFERNO

DORÉ, Gustave (1832-1883). In: ALIGHIERI, Dante. L’Enfer avec les dessins de Gustave Doré. Paris: Hachette, [1868].
Na última fase do romanticismo, assiste-se ao grande sucesso de numerosas edições da Divina Comédia produzidas em diversos países e línguas, com as ilustrações de Gustave Doré. O virtuosismo técnico do artista interpreta a dramaticidade dantesca através o uso de repentinos contrastes luminosos, onde é perceptível a influência da fotografia, como no caso de Minos (Inferno, c. V. v. 4). Trata-se do terrível juiz que destina aos mortos o lugar no Inferno que lhes compete, em função dos pecados cometidos.

PURGATÓRIO

DORÉ, Gustave (1832-1883). In: ALIGHIERI, Dante. Le Purgatoire [et le Paradis] avec les dessins de Gustave Doré. Paris: Hachette, [1868].
Ao desenhar o caminho de Dante e Virgílio pelo Purgatório, Gustave Doré se serve da construção de planos com diferentes luminosidades, constituídos por nuvens, que representam a passagem da obscuridade do Inferno à plena luz do Paraíso (Purgatório, c. XVI, v. 34-36).

PARAÍSO

DORÉ, Gustave (1832-1883). Reprodução da gravura sobre Dante e Beatriz no Paraiso. In: ALIGHIERI, Dante. Divina Comédia. Tradução de José Pedro Xavier Pinheiro. São Paulo: Ed. Edigraf, 1958.
Gustave Doré sabe usar as técnicas da litografia para obter cenografias de grande efeito. Nesse caso, a composição é centralizada. A área criada pelos raios luminosos no céu é alinhada às silhuetas de Dante e Beatriz, retratadas de costas e colocadas em destaque no primeiro plano. No feixe de luz, se destacam pelo esplendor, as almas que descem para falar com Dante, além de outras, cuja distribuição contribui à coreografia da festa (Paradiso c. XXI v. 40-42).

VOLKMAN Ludwig (1870-1947). Iconografia Dantesca: le rappresentazioni figurative della Divina Commedia. Firenze; Venezia: L. S. Olschki, 1898.
Essa publicação representa uma das primeiras obras que enfrenta, de forma crítica, o processo ligado à interpretação da ópera poética em função dos eventos históricos e das relações da iconografia com os diversos movimentos inerentes à história da arte. Até hoje, os estudos de Volkman permanecem como uma referência fundamental para quem pretende estudar esse assunto. Na Alemanha, desde Goethe, existiu sempre um grande interesse por Dante Alighieri, como demonstram as numerosas publicações existentes sobre o assunto.

BALBO, Cesare (1789-1853). Vita di Dante. Firenze: Felice Le Monnier, 1853.
Edição doada à Biblioteca Nacional por Miguel Lemos. O livro é dividido em Libro I – Dante in pátria – e em Libro II – Dante in esilio. O editor, Felice Le Monnier, escreve uma advertência ao leitor: “Não podia a Biblioteca Nazionale [de Florença] permanecer desprovida de uma obra tão famigerada como é a presente obra do Sr. Cesare Balbo; tanto mais porque já faz algum tempo que se encontrava fora de comércio.” Foi publicada pela editora Felice Le Monnier, em 1853, em Florença.

CARDUCCI, Giosuè (1835-1907). L’opera di Dante. Bologna: Nicola Zanichelli, 1888.
Em 1887, uma lei instituiu uma cátedra dantesca na Sapienza, Universidade de Roma, e muitos intelectuais estimularam Giosuè Carducci para ser seu mentor. No entanto, o poeta a recusou numa carta endereçada a Adriano Lemmi, publicada na Gazzetta dell’Emilia, em 23/09/1887. Michele Coppino, então Ministro d’Istruzione, não satisfeito com a não formação da cátedra, decidiu criar um ciclo de leituras dantescas e, agora, Carducci aceita o convite para realizar a primeira leitura em 8 de janeiro de 1888. A edição traz sua conferência, publicada em Bolonha pela Nicola Zanichelli, no mesmo ano.

CROCE, Enrico. Carta d’Italia. Illustrativa della Divina Commedia di Dante Alighieri. Genova, 1875.
A parte da península retratada no mapa refere-se às cidades relacionadas à vida de Dante ou aos lugares por ele mencionados. No âmbito do processo que levou à unificação do país, esse documento revela o sentido simbólico de arquétipo então atribuído à Itália do poeta.

ALIGHIERI, Dante. A Divina comedia fielmente vertida do texto pelo Barão da Villa da Barra. Rio de Janeiro: Imp. Nacional, 1888.
Primeira tradução em língua portuguesa, realizada por Francisco Bonifácio de Abreu (1819-1887), o Barão da Villa da Barra, médico, parlamentar e poeta brasileiro. O volume traz ilustrações de Jean-Édoaurd Dargent (1824-1899), dito Yan’ Dargent, pintor e ilustrador francês. Representa a primeira edição da Divina Comédia traduzida e editada no Brasil. Na capa está o brasão imperial e, no interior, a dedicatória do editor Carlos Mariani ao Imperador Pedro II.

Bilhete postal. Ano de 1921, 6° centenário de Dante na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.
Nessa ocasião, a Biblioteca Nacional organizou uma série de palestras e uma exposição biblio-iconographica com catálogo, editado pela Oficina Graphica, da mesma Biblioteca, em 1925.

Fon Fon. Rio de Janeiro, 10 de setembro de 1921. Capa – VI centenário de Dante.
Fon Fon dedica o numero 37 da revista à comemoração do divino poeta, começando pela própria capa, onde é retratado o poeta seguido por Virgílio. No interior da revista, um artigo de João do Norte reconstrói a vida de Dante, ilustrada por fotografias do túmulo e da capela funerária de Dante, em Ravena e do Mosteiro de Fonte Avellano onde, segundo a tradição, Dante teria escrito a Divina Comédia.

Revista da Semana. Rio de Janeiro, 10 de setembro de 1921. Capa – número comemorativo do VI centenário de Dante.
Na capa do número comemorativo do VI centenário de Dante, encontra-se uma livre interpretação do afresco existente em Florença, Dante, Firenze e i tre regni del poema de Domenico de Michelino, assinada por Fabian Rio. Uma foto colorida dessa ilustração utilizada na capa pertence ao acervo da Biblioteca Nacional. Ao apresentar o grande poeta no interior da revista são escolhidos diferentes aspetos do personagem: sua aventurosa vida, o perfil orgulhoso do florentino, o discutido aspecto físico através dos históricos retratos, para terminar com a Beatriz paradisíaca.

ALIGHIERI, Dante. Divina Commedia. Ilustrações de Amos Nattini (1892-1985). Genova: Casa Editrice Dante, 1915-1920.
Edição em três volumes realizada entre 1915 e 1920, pelo pintor e ilustrador Amos Nattini, italiano nascido em Gênova. Em 1915, Nattini expõe na Permanente de Milão as três primeiras ilustrações acompanhadas do canto XII, do Inferno; canto XXVII, do Purgatório e canto XXXIII, do Paraíso. Ele produziu 100 ilustrações e os três luxuosos volumes foram impressos pela Casa Editrice Dante, em 1000 cópias numeradas.

INFERNO

A ilustração se refere ao círculo do Inferno, onde os tiranos, na mira dos centauros, espalham-se na água. A mancha vermelha laranja predomina sobre as outras cores (Inferno, canto XII 103-106). O divino poema assume, na ilustração de Nattini, surpreendentes efeitos cromáticos na procura do então ideal de beleza.

Nessa ilustração do Inferno (canto XIV, vv. 40-42), encontram-se os violentos contra Deus, a natureza e a arte sendo atingidos por uma chuva de fogo. Nattini demostra técnicas inovadoras no uso da aquarela cuja composição chega a anular o preto e branco.

Após a visão sombria do Inferno, ligada ao drama pela pena, a luminosidade vai crescendo no Purgatório. A ilustração se refere ao Canto X, no qual as almas curvas sob o peso de enormes pedras purgam o pecado da soberba. No desenho e tratamento dos corpos é possível perceber uma aproximação ao clima estético da época, influenciado pelo pensamento do poeta Gabriele D’Annunzio (1863-1938).

No canto XXIX aqui representado, Beatriz explica a Dante como foram criados os Anjos. As cores ficam mais claras ao absorver máxima luminosidade. A luz se identifica com Beatriz e com a espiritualidade religiosa. A interpretação artística de Nattini, embora inspirada nos clássicos do Renascimento, encontra as raízes de sua dimensão fantástica no Decadentismo e no mito do esteticismo.

Faz parte integrante dos álbuns a elegante capa de couro com um requintado design. No centro dessa, está esculpida, em baixo relevo, uma porta em arco. Seu acesso é assinalado por uma simbólica escada que muda de sentido em cada álbum, parece descer no Inferno e subir no Purgatório, até chegar ao Paraíso.