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Acervo da BN | Abelha do Itaculumy: sobrevoando as Gerais sem ferrão

16 out 2020

Artigo arquivado em Acervo da BN
e marcado com as tags 1820, Imprensa Mineira, Independência do Brasil, Minas Gerais, Ouro Preto

O padre e artista visual José Joaquim Viegas de Menezes deixou duas marcas na história da imprensa brasileira. A primeira completa 200 anos em 2020: foi quando o clérigo, pelos conhecimentos que adquirira em Portugal, instituiu na então Vila Rica (hoje Ouro Preto), na época capital da província de Minas Gerais, juntamente com o artífice português Manuel José Barbosa Pimenta e Sal e alguns operários, uma das primeiras tipografias brasileiras, pioneira nas Alterosas. Cerca de três anos depois, publicou ali o primeiro periódico redigido e impresso em Minas, o Compilador Mineiro, a partir de 13 de outubro de 1823 – esta sendo, afinal, sua segunda marca. Tendo desencadeado a fundação de outras folhas locais, esse jornal não durou muito: após publicar sua 29ª edição, de 9 de janeiro de 1824, foi suspenso, dando lugar à Abelha do Itaculumy, impresso na mesma oficina criada por Viegas de Menezes – a chamada Imprensa Patricia – a partir de 12 de janeiro de 1824, com o objetivo expresso de substituí-lo.

Tendo durado mais de um ano na ativa, a Abelha chegou a ser, muitas vezes, erroneamente considerada o primeiro periódico mineiro – talvez porque tenha ofuscado o Compilador, um tanto inconveniente para a historiografia oficial. A Abelha foi, afinal, muito mais longeva que o jornal que a antecedeu, publicada até 11 de julho de 1825. Explica-se: se a pauta política do Compilador Mineiro focou, sobretudo, as discussões dos princípios constitucionais que agitaram o cenário político daquela época, polemizando e sendo favorável à adoção de um sistema de governo representativo, baseado numa monarquia constitucional, em tempos em que a Independência mal se consolidava, esse tipo de postura não se repetira na Abelha do Itaculumy, mais moderada. Nesse sentido, enquanto aquele periódico protestava veementemente contra a administração colonial portuguesa, em tons claramente antilusitanos, este buscava amenizar escaramuças entre brasileiros e colonizadores, “mineiramente”, na base do “deixa disso”. Uma abelha sem ferrão, talvez.

A Abelha, afinal, se voltava à publicação de comentários sobre o momento político de então, à divulgação de notícias da corte e de outras províncias, à publicação de artigos oficiais, ao noticiário estrangeiro, à reprodução de material de outras publicações, entre outras coisas. Vendida nas lojas do coronel Nicolau Soares do Couto e do capitão João de Deus Magalhães Gomes, deixou de ser publicada quando, em meados de 1825, a tipografia histórica que a editava, até o momento propriedade de Barbosa Pimenta e Sal, foi vendida. Logo em seguida, a mesma casa impressora passou a publicar o periódico que seria o sucessor da Abelha – e, de certa forma, “neto” do Compilador: o jornal O Universal, que, redigido por Bernardo Pereira de Vasconcellos, politico e jurista graúdo a ponto de influenciar os rumos do Brasil imperial, foi veiculado por cerca de 17 anos. Mas essa história fica para outro dia.