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A Cidade do Turvo

22 jul 2014

Artigo arquivado em Hemeroteca

“A Cidade do Turvo: Orgão Republicano Federal” foi um dos muitos periódicos criados nas últimas décadas do século XIX, em inúmeras cidades brasileiras, inclusive do interior, com a finalidade de divulgar os ideais republicanos; ou - como foi o caso desse semanário, fundado criado na Cidade do Turvo, no Sudoeste de Minas Gerais - de aderir à nova forma de governo implantada no país em 15 de novembro de 1889.

Já no primeiro número, lançado em 12 de abril de 1890, o semanário proclamava, em longa e substanciosa apresentação, sua identidade republicana, sem ignorar, no entanto, a preocupação com as questões locais:

“O apparecimento d’A Cidade do Turvo á luz da publicidade não é um acontecimento, mas um facto que nada tem de estranhável depois dos gloriosos acontecimentos do dia 15 de Novembro do anno passado (...). (...) deliberamos, adherindo sem reservas ás novas instituições, prestar-lhes o nosso fraco, mas sincero e dedicado auxilio, tornando-nos assim úteis a patria. (...) depois das grandes e conhecidas difficuldades com que, no interior sempre luta um jornal, entra hoje A Cidade do Turvo na arena jornalística sempre prompta a patrocinar os reaes, legítimos e vitaes interesses do paiz, mas ensarilhando as suas armas e não se immiscuindo nas lutas pessoaes, estéreis e inglórias, senão atrophiantes do progresso e melhoramentos das localidades. (A Cidade do Turvo, 12 abr. 1890, Ano I, nº 1, pág. 1.)

A defesa da República e de suas decisões foi praticamente unânime em seus primeiros anos. Casamento civil, instrução pública, federalismo foram alguns dos temas mais debatidos e defendidos no periódico. Como nos trechos seguintes, em que o jornal sustentava a importância respectivamente da educação pública e do casamento civil:

“Pedir a instrucção para o povo, consagrar-lhe as maiores fadigas e pensamentos, é dedicar-se a causa da patria e da humanidade. Quando o povo brazileiro souber ler, o Brazil será a primeira nação da América do Sul; terá imprescriptiveis direitos à um logar na communhão das nações as mais civilisadas, o vasto e brilhante horizonte se abrirá aos destinos d’esta nossa querida pátria.” (A Cidade do Turvo – 27 set. 1890 – Ano I, nº 21, pág. 1.)

“É preciso que as pessoas de bom senso vejam que o casamento civil em nada offende as crenças religiosas de quem quer que seja; a lei quer pôr todos os cidadãos em perfeita igualdade de condições, e para isso estabelece unicamente para os effeitos civis, que a prova da legitimidade do casamento é fornecida pela auctoridade civil, livre a cada um o direito de obedecer aos impulsos de sua consciência, no modo de santificar, a união que contrahe.” (A Cidade do Turvo, 19 jun. 1890, Ano I, nº 9, pág. 2.)

A Cidade do Turvo tinha também seção literária, onde publicava em capítulos obras de autores nacionais e estrangeiros, como Flores do bem e Os três caminhos do francês Catulle Mendés; O Pyrilampo, do Cônego Shmidt, e Mater, de Coelho Netto. Mais tarde o jornal criou seu “Folhetim”, cujo primeiro título publicado foi O Leproso d’Aosta, de Xavier de Maistre. Também foram publicados Diva e A Pata da gazella, de José de Alencar; Ir a Roma e não ver o Papa, de Alexandre Dumas, com tradução de Pinheiro Chagas, entre outros.

Ernesto de Azevedo e Isidro Pereira de Azevedo foram os primeiros editores do jornal. Mas em março de 1892, este último deixou o posto por ter sido nomeado juiz de Direito da comarca de Cidade do Turvo. Em 10 de abril, Ernesto de Azevedo também saiu, sendo substituído por Francisco Alves Nogueira, que figuraria como editor-gerente até 1895.

A partir de 1893, o jornal ajudou a engrossar as críticas vindas de todo o país ao governo de Floriano Peixoto (1891-94), principalmente depois da eclosão da Revolta da Armada em 1893:

“Cercado do apoio da opinião pública quando subiu ao poder, por um golpe de estado, o vice-presidente da República, marechal Floriano Peixoto, que se fosse preparado para a alta administração do paiz, se tivesse lata comprehensão de sua enorme responsabilidade, e se tivesse pouca orientação política podia ter consolidado as novas instituições, mas a sede de governar, os desatinos e violências, as perseguições inqualificáveis, o iníquo e caprinhoso (sic) extermínio do Rio Grande, o desrespeito e violação constante das leis atirou o paiz a esse cahos medonho de uma luta fratecida, que já se estende a cinco Estados, que já estão em estado de sitio, e da qual se succumbir a nova forma de governo o único governo nefasto é o marechal Floriano Peixoto, que lançou o governo na mais completa anarchia e pertubação (sic) da ordem publica, apezar de clamar sempre a imprensa livre pela paz, ordem e tranquillidade.” (A Cidade do Turvo, 17 dez. 1893, Ano IV, n. 25)

Depois de uma interrupção em 1895, o jornal voltou a circular em 15 de agosto de 1897, sob nova direção e não mais como órgão republicano, mas agora consagrado aos interesses do município, o qual, em 1930, passou a se chamar Andrelândia, homenagem a André da Silveira, o fundador da cidade.