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Arte | Alfredo Volpi

11 jul 2020

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Alfredo Volpi (Lucca, Itália 1896 - São Paulo, São Paulo, 1988)

Nascido em 1896, chega ao Brasil no ano seguinte, entre as muitas levas de imigrantes italianos. Construiu suas raízes no bairro do Cambuci, bairro de classe média baixa, onde permaneceu por toda vida. Desde jovem demonstrava habilidades manuais, tais como entalhador, pintor e decorador, atuando profissionalmente como pintor de paredes e murais. Autodidata, não possuía formação acadêmica.

Suas primeiras produções são figurativas, a exemplo das marinhas executadas em Itanhaém, São Paulo. Seu envolvimento com a arte mantém conexões com o artesanato, sua formação inicial. Em 1930 se envolve com o grupo Santa Helena, associação informal de artistas, de natureza artesanal, que, apesar de pertencerem a estratos sociais menos privilegiados, possuíam grande interesse e trânsito nos debates intelectuais e artísticos.

Mesmo dedicado à vida no ateliê e de ser visto como alguém mais recluso, não afeito a disputas acadêmicas, Volpi se manteve a par dos debates empreendidos nos círculos artísticos e intelectuais, que agitavam uma São Paulo ainda em busca do ideário modernizador. Entre os círculos de artistas, destacam-se as relações com os artistas e críticos de arte como Mario Pedrosa, Paulo Mendes, Maria Bonomi, Ronaldo Azeredo e Diná Lopes Coelho.

Em 1936, participa da formação do Sindicato dos Artistas Plásticos de São Paulo e, na sequência, torna-se membro da FAP: Família Artística Paulista. Em 1940, ganha o concurso promovido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), pelos trabalhos inspirados nos monumentos localizados nas cidades de Embu e São Miguel. A escolha, sinaliza sua afeição pela arte colonial, influência que também se manifestará na série “Fachadas”, cuja arquitetura brasileira, da composição de portas e janelas expressa o recurso à geometrização, tão característico de sua obra.

Inaugura em 1944 a sua primeira individual, realizada na galeria Itá em São Paulo. Anos depois viaja à Europa, acompanhado dos artistas Rossi Osir e Mario Zanini. Lá, concentra seus estudos nas obras pré-renascentistas. O retorno ao Brasil marca o início da sua fase mais celebrada. A aproximação com o movimento concretista, especialmente com o movimento Ruptura de São Paulo irá marcar a variedade das representações e dos arranjos geométricos. Este processo se sintoniza razoavelmente ao ritmo da modernização, a combinação do artesão à arte pré-industrial, pré-capitalista, que com o tempo se dissocia da promessa de industrialização brasileira tão cara aos concretistas.

Há uma tendência, entre os críticos de arte em evidenciar a sua pureza artística e intuitiva. Sua poética é coesa. Preserva a organicidade de sua obra. Porém, ainda que as temáticas contenham certa singeleza, a representação da vida simples, da tradição popular, do cotidiano, tão presentes na obra de Volpi, guarda, ao mesmo tempo, grande complexidade. Está imbricada, portanto, a perspectiva de quem vê, tanto para torná-la idílica, reforçando a noção de simplicidade, quanto para adensar tensões ali existentes.

A adoção da têmpera, na passagem da década de 1940 para os anos 1950, confere à sua pintura vantagens, pois a contenção da liquidez, permitiria o tratamento do espaço dimensional de forma laminar. Composição, cor, luz, volumetria, se renovam na arte do pintor. A Bienal de São Paulo de 1953, conhecida como a Bienal “Guernica” pela exibição da obra de Pablo Picasso, foi considerada uma das edições mais importantes de todos os tempos e confirma a boa fase de Volpi, que recebe o prêmio de melhor pintor da mostra.

Muitos dizem que Volpi não pode ser interpretado como um pintor de fases. Algumas de suas séries como Marinhas, Flores, Fachadas, Bandeirinhas, Ampulhetas, registram a transição da pintura representativa, onde a natureza e a preocupação com a luz dão lugar, à arte concreta, à geometrização, de estrutura formal, obedecendo à pinceladas variadas, onde as qualidades do colorista alcançam maior vigor artístico.

Era um artista completo. Produzia os próprios artefatos: chassis, suportes, tintas, dispensando por vezes o uso da tinta industrializada, revelando assim grande capacidade e perícia. Não cedia à dinâmica, ainda incipiente, do mercado das artes no Brasil, atrelado à projeção dos artistas internacionalmente.

Entre outros trabalhos, pinta nas décadas de 1960 e 1970, afrescos para a Capela da Nossa Senhora de Fátima, em Brasília.

Volpi estaria mais próximo ao que se entende como brasilidade, pois soube transpor na tela as experiencias populares. Desprendido à rótulos, ele nunca se preocupou em responder à qual corrente artística seu trabalho estaria associado.

Na imagem, matéria do jornal “O Rio” de autoria do curador e crítico de arte Marc Berkowitz. O crítico avalia a exposição do artista sob a curadoria de Mario Pedrosa no Museu de Arte de São Paulo em 1956. Interessante notar que os conceitos de pureza, singeleza, e associação ao primitivismo são amplamente compartilhados entre aqueles que tentam compreender a obra de Volpi: “É um pintor que consegue uma incrível pureza em sua obra, através de um despojamento completo, não essencial. Ele é um dos poucos artistas que podem dar o luxo de ignorar tudo o que tão é importante: matéria, desenho e até às vezes composição – porque no mundo poético tão singelo que ele cria esses elementos são de importância secundária. A espontaneidade de Volpi é a espontaneidade dos puros, e não dos primitivistas como se querem pensar”.