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Il Pasquino Coloniale

29 out 2015

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e marcado com as tags anticomunismo, Colunismo social, Comércio, Conservadorismo, Crítica política, Cultura popular, Economia, Fascismo, Futebol, Humor político, Imprensa imigrante, Italianos no Brasil, Primeira Guerra Mundial, Questões trabalhistas, São Paulo, Voltolino (João Paulo Lemmo Lemmi)

Semanário humorístico ilustrado, Il Pasquino Coloniale foi lançado em São Paulo (SP) em meados de julho de 1909, por Arturo Trippa. Feito por e para a comunidade imigrante italiana paulistana, quase sem textos em português, o jornal é atualmente considerado um dos principais periódicos ítalo-brasileiros do início do século XX, tendo atingido tiragens de 10 mil exemplares entre os anos 1910 e 1920. Normalmente pró-governo italiano, por volta da década de 1920 o Pasquino chegou a se notabilizar pelo seu posicionamento a favor do regime fascista.

Quando fundado, o Pasquino Coloniale teve redação e administração instaladas no nº 5 da Rua Boa Vista. Neste primeiro momento, o periódico circulou em formato standard, com edições de quatro páginas diagramadas em cinco colunas. Cada exemplar era vendido inicialmente a 100 réis, com assinaturas semestrais a 2$500 e anuais a 5$000. A partir de 1911, o número de páginas do periódico dobrou e o Pasquino, aparentemente impresso em tipografia de melhor qualidade do que anteriormente, passou a vir com a marca “Unico giornale italiano umoristico con caricatura di attualità pubblicato nel Sud-America”.

Il Pasquino Coloniale trazia principalmente notícias e avaliações crítico-satíricas de assuntos relativos à política italiana e à realidade e os interesses da comunidade ítalo-brasileira. Nesse sentido, costumeiramente o jornal discordava de outros jornais coloniais, especialmente Fanfulla, seu grande rival por longos anos. A conotação política do humor do periódico era alimentada especialmente por suas ilustrações e caricaturas de maior destaque, quase sempre relativas a conflitos armados e disputas entre governos europeus. Tanto em textos quanto em desenhos o periódico adotava uma linha política conservadora, antianárquica e anticomunista – ver, na edição nº 517, de 14 de julho de 1917, os textos “Anarchi pericolosi” e “Proletariato... Incosciente!”. Em seu nº 694, de 5 de fevereiro de 1921, o Pasquino Coloniale definia o fascismo como “l'antiperina del bolchevismo” (o “analgésico do bolchevismo”), ilustrando-o como um porrete acertando a cabeça de um bolchevique.

Em linhas gerais, o Pasquino apresentava e discutia condições de trabalho em São Paulo, visitas de autoridades italianas ao Brasil, variedades do cotidiano paulistano, informes sobre idas e vindas de navios da e para a Europa, novidades e atividades de clubes e demais instituições imigrantes (especialmente o Instituto Medio Dante Alighieri, o Instituto Coloniale, a Camera Italiana di Commercio e o Circolo Italiano), os destaques italianos durante a Primeira Guerra Mundial, esportes (com preferências do jornal pelo clube de futebol Palestra Itália, da colônia italiana paulista), telegramas enviados da Itália com notícias gerais sobre a nação, galhofas com determinadas figuras imigrantes, notícias variadas de colônias de cidades do interior, economia, questões ligadas ao comércio e à indústria, variedades culturais e eventos ocorridos em São Paulo, entre outras coisas. Versos humorísticos, comentários mordazes sobre diversos assuntos, correspondência de leitores, colunas sociais, aforismos, folhetins e anúncios também eram publicados. Durante a década de 1920, conforme o jornal foi melhorando sua qualidade gráfica, grandes reportagens fotográficas foram aparecendo – como exemplo, a cobertura da visita do embaixador italiano Bernardo Attolico a São Paulo, na edição de 7 de abril de 1928.

Como bom representante da imprensa humorística de sua época, Il Pasquino Coloniale era especializado na publicação de caricaturas e charges, sendo as de maior destaque as assinadas por João Paulo Lemmo Lemmi, conhecido como Voltolino, um dos desenhistas mais importantes da imprensa ítalo-paulistana. Já nos primeiros tempos do jornal, o pintor Torquato Bassi, repetidamente caricaturado por Voltolino em 1909, chegou a processar Arturo Trippa por crime de injúria, condenando o redator do Pasquino a quatro meses de prisão e multa. Sabe-se ainda que, em outra oportunidade, Trippa fora detido por 67 dias, tendo após sua soltura, em 1917, publicado o livro de memórias “Impressioni di carcere”, onde avaliava e criticava o sistema carcerário paulista da época.

Além de Voltolino, outra figura pitoresca do Pasquino foi Franchesco Jaccheo, conhecido como Don Ciccio, o crítico de teatro do periódico. Depois de assinar a sua aclamada “Cronaca Teatrale”  no jornal ítalo-paulistano Fanfulla, Don Ciccio, na verdade, era analfabeto, devendo sua fama na Fanfulla ao jornalista Giovannetti, que colhia suas impressões dos espetáculos e as publicava. No humor pilhérico de Giovannetti, entretanto, os textos da seção diziam justamente o contrário do que era pretendido pelo crítico. Já no Pasquino, Don Ciccio passou a ser “interpretado” por Ermano Borla, que manteve a fórmula de sucesso de sua coluna. Borla assinava como “Vice Ciccio”, ou ainda “Salciccio”.

Sucesso de público quando lançado, Il Pasquino Coloniale foi ganhando cada vez mais páginas ao longo de seus dez primeiros anos. No entanto, conforme o jornal se expandia, suas edições iam ficando cada vez mais cheias de anúncios. Em 1915 o jornal já tinha 10 páginas e era impresso em formato menor, com três colunas de texto por página – no ano seguinte, seu número de páginas aumentaria para 16.

A partir de 1916 o Pasquino iniciou um longo período de constantes mudanças em seu endereço e na empresa tipográfica que imprimiria seus exemplares. Tendo passado a funcionar no nº 33 da Rua XV de Novembro e sendo então impresso no “Stabilimento Tipografico Pocai & C.”, na Rua João Adolpho nº 60, logo em abril de 1917 o jornal se transferiu ao nº 52 da mesma Rua XV, passando a ser impresso na tipografia do jornal O Pensamento, no nº 40 da Rua Rodrigo Silva. Em 1917 o número de páginas do periódico colonial já atingia 24 por edição. Entrando na década de 1920 a sede do Pasquino já funcionava no nº 65 da Rua XV de Novembro. No início de 1921 o jornal anunciava em suas páginas a compra de uma nova rotativa, melhor, sinalizando seu momento de boa aceitação junto ao público. Suas assinaturas semestrais e anuais, à época, haviam sido corrigidas para 6$000 e 12$000, respectivamente.

Editorialmente, nesse início de década, Il Pasquino Coloniale passou a apoiar a doutrina política fascista em sua pátria-mãe. Nessa época, o suporte ou a rejeição ao fascismo dividiu a imprensa imigrante italiana no Brasil, opondo o Pasquino aos jornais Il Piccolo e Fanfulla e alinhando-o a folhas como Il Moscone e Il Corriere Degli Italiani.

Por volta de 1924 o endereço da redação e da administração do Pasquino mudou novamente, desta vez para o nº 147 da Rua Libero Badaró. Pouco depois da mudança, conforme visto no cabeçalho da primeira edição de 1925, Ermano Borla, antigo redator do jornal, passou a figurar como o seu diretor-proprietário, com Francesco Costantini assinando como administrador-gerente. Após sair de Il Pasquino Coloniale, Arturo Trippa veio a trabalhar no jornal Fanfulla, para, posteriormente, substituir Paolo Mazzoldi na direção do Il Piccolo.

Na edição de 10 de janeiro de 1925, percebe-se que o endereço do periódico transferiu-se então para o nº 5 da Rua Três de Dezembro. A partir de meados desse ano, no entanto, o local de composição e impressão da folha estabilizou-se como a “Typographia Paulista de José Napoli & Cia.”, na Rua da Assembleia. Chegando ao fim dos anos 1920, Il Pasquino Coloniale começou a passar por uma série de mudanças em sua direção, indicando uma possível instabilidade administrativa. Na virada para 1929, Emidio Rocchetti passou a ser o diretor-proprietário do jornal, tendo mudado a sua redação para o nº 2 da Rua da Quitanda. No entanto, o periódico ficou pouco tempo sob essa configuração: a partir da edição de 6 de julho de 1929 passou a ser dirigido por Pietro Petroselli, com Eugenio Giora como gerente, e a ser editado na Rua Anhangabaú, nº 12. Adentrando 1930, Eugenio Gioria continuava sendo o gerente da folha, mas Francesco Costantini voltava como diretor-responsável.

Entre julho e setembro de 1930, Carlo Bruno Puteri passou a ser o dono do Pasquino, então impresso na Typographia Napoli, no nº 4 da Rua dos Andradas. Apesar de ainda possuir diversos anunciantes, o jornal já não possuía a mesma qualidade gráfica e editorial de alguns anos antes. Seu número de páginas havia sido reduzido para cerca de 16, veiculando-se menos ilustrações. No ano de 1931 somente a administração do periódico havia se mudado para o nº 2 da Travessa do Commercio, tendo a redação se estabelecido no endereço da tipografia que imprimia as edições, na Rua dos Andradas. Em meados deste ano, Emidio Rocchetti voltou a figurar como responsável pelo jornal em seu expediente, mas desta vez dividindo a função com Ugo M. Sgambati. Com a mudança, a redação migrou para o nº 17 da Rua Libero Badaró e a impressão da folha passou a ser feita na Tipografia Cupolo, no nº 21 da Ladeira Santa Ephigenia. Esta última seria substituída no ano seguinte pela “Typographia do Argus”, na Rua Asdrubal do Nascimento, nº 6-B.

Il Pasquino Coloniale não chegou a ficar muito tempo sob a administração de Rocchetti. Após lançar o seu nº 1.177 em 2 de julho de 1932, o nº 1.178 só veio a circular em 5 de novembro daquele ano. No seu reaparecimento, o jornal aparecia com outro endereço, o nº 7 da Rua José Bonifácio, e outros donos: Gaetano Cristaldi como diretor, e Guglielmo Foti como gerente. Esta edição de 5 de novembro expunha uma possível causa para a mudança na direção da folha: Rocchetti havia sido nomeado cônsul em Corumbá pela Régia Autoridade Diplomática Italiana.

Sob a direção de Cristaldi, o Pasquino passou por algumas mudanças consideráveis, responsáveis pela abolição de seu velho formato. Primeiramente, durante esta nova fase as capas do jornal, antes quase sempre ilustrações de teor político, foram substituídas por caricaturas ou fotografias de figuras importantes da colônia ítalo-brasileira, “Gli amici del Pasquino”. Editorialmente, o periódico parecia menos crítico e politizado, mais ameno e humorístico, voltado predominantemente a questões internas da colônia – e a algumas novidades, como destaques do cinema, que começavam a ser explorados em suas páginas. As antigas demonstrações de simpatia pelo regime fascista não eram mais explícitas, sendo substituídas por homenagens e elogios a italianos ilustres. Em paralelo, apesar de publicar a grande maioria de seus textos em italiano, neste momento de sua história o Pasquino Coloniale chegou a desenvolver em suas páginas uma linguagem conhecida como “macarrônica”, ou seja, misturada entre o italiano e o português. Caricata e informal, a linguagem fazia sentido sobretudo entre os colonos ítalo-brasileiros.

Ainda durante a gestão de Gaetano Cristaldi, as páginas de esportes do Pasquino, dedicadas sobretudo ao futebol, chegaram a trazer reportagens e análises em português, numa possível tentativa de levar o jornal a um público externo à colônia.

Durante a segunda metade da década de 1930, Il Pasquino Coloniale publicava edições especiais de fim de ano, lançadas logo no início dos meses de dezembro e valendo para todo o mês, contendo cerca de 100 páginas. Curiosamente, o jornal chegou a participar da Gran Exposición Internacional de Publicaciones Periodicas, promovida pela Secretaria de Educação do governo de Cuba entre 10 e 12 de dezembro de 1937. Um diploma de honra dado pela autoridade cubana foi publicado na edição de 8 de janeiro de 1938.

A nova fórmula editorial de Cristaldi para o revitalizar o jornal colonial aparentemente tivera resposta junto ao público. Depois de longo período de instabilidade, tanto em sua direção quanto em seus locais de edição, o periódico finalmente conseguira manter uma estrutura administrativa. Pouco tempo depois de assumir o jornal, Cristaldi já assinava o expediente da folha apenas como  proprietário, sem Guglielmo Foti e deixando Antonio Carbonaro como responsável. Aparentemente, Cristaldi continuou na propriedade do Pasquino até a extinção do periódico, em 1941. Uma das prováveis causas de seu fim foi a Campanha de Nacionalização do governo de Getúlio Vargas, responsável pela repressão e pelo fechamento de diversos periódicos da imprensa imigrante no Brasil.

Ao longo da história do Pasquino, o jornal contou com colaborações de figuras coloniais como Beppe Ceccone, Tito Livio Cianchettini, L. Maggiori, Gigiotto, Tre di Piche, Gaetano Pepe, Ubaldo Zendrini, M. Carnicelli (“Kim”, outro ilustrador além de Lemmo Lemmi), Mario Zeppegno, Dottore Rompiscatole, Pico Della Mirandola, Paolo Forza, Vicente Pecorella, E, Beccari, Ada Negri, Nasonelli, Gianché, Gigi Polentina, Cornelio Machié, Giuseppe Cavaliere, Francesco Pettinati, Arnaldo Fraccaroglia, Sam Marco, Adriano Crespi, Biagino Filizzola (ou Filizzolo Biagini), Tommaso Grossi, Ciccia Riforma, Enzo Moncassoli, Nino Augusto Goeta, Alfredo Nunzi, Lino Finocchi, Vinicio Tamborra, Rosario Caltabiano, Tristano Giramenti, Gustavo La Ciccia, Adhemar Pimenta, Bruno Sercelli, entre outros. Alguns destes podem ser pseudônimos.

Fontes:

- Acervo: edições do nº 404, de 8 de maio de 1915, ao nº 408, de 5 de junho de 1915; do nº 467, de 29 de julho de 1916, ao nº 470, de 19 de agosto de 1916; do nº 490, de 6 de janeiro de 1917, ao nº 538, de 15 de dezembro de 1917; do nº 588, de 4 de janeiro de 1919, ao nº 636, de 20 de dezembro de 1919; do nº 689, de 1º de janeiro de 1921, ao nº 740, de 24 de dezembro de 1921; edição nº 793, de 30 de dezembro de 1922; edição nº 894, de 3 de janeiro de 1925; edições do nº 972, de 7 de janeiro de 1928, ao nº 1.005, de 1º de setembro de 1928; do nº 1.021, de 5 de janeiro de 1929, ao nº 1.051, de 10 de agosto de 1929; edição nº 1.072, de 4 de janeiro de 1930; edições do nº 1.104, de 20 de setembro de 1930, ao nº 1.106, de 4 de outubro de 1930; do nº 1.113, de 3 de janeiro de 1931, ao nº 1.152, de 26 de dezembro de 1931; do nº 1.177, de 2 de julho de 1932, ao nº 1.182, de 5 de dezembro de 1932; do nº 1.239, de 6 de janeiro de 1934, ao nº 1.285, de 20 de dezembro de 1934; do nº 1.335, de 25 de janeiro de 1936, ao nº 1.372, de 10 de outubro de 1936; e do nº 1.434, de 1º de janeiro de 1938, ao nº 1.480, de 3 de dezembro de 1938.

- Edições nº 49, de 12 de junho de 1910; nº 50, de 19 de agosto 1910; nº 111, de 18 de agosto de 1911. Museu da Imigração do Estado de São Paulo. Disponíveis em: http://www.museudaimigracao.org.br/acervodigital/jornais.php?pesq=1&nome=Pasquino+Coloniale%2C+Il&idioma=&ano=&ano1=&Reset2=Pesquisar Acesso em 9 abr. 2012.

- BERTONHA, João Fábio. O fascismo e os imigrantes italianos no Brasil. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2001.

- CENNI, Franco. Italianos no Brasil: “Andiamo in 'Merica”. 3ª edição. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2003.

- TARASANTCHI, Ruth Sprung. Pintores paisagistas – São Paulo 1890 a 1920. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2002.

- TRENTO, Angelo. Do outro lado do Atlântico: um século de imigração italiana no Brasil. São Paulo: Livraria Nobel S. A., 1989.