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Livros de Aventura | As Minas de Salomão

26 jul 2022

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Os romances de aventura e fantasia de H. Rider Haggard influenciaram muitos autores que, no final do século XIX e início do XX, se dedicaram a escrever histórias sobre mundos perdidos. Dentre seus muitos livros, o mais conhecido é “As Minas de Salomão”, que se constitui num caso interessante para os leitores de língua portuguesa.

Henry Rider Haggard (Bradenham, Inglaterra, 1856 – Londres, 1925) era o oitavo filho do advogado William Haggard e da poeta e escritora Ella Doveton. Em 1875, viajou para a atual África do Sul, onde trabalhou para o governo das colônias britânicas da região. Voltou brevemente à Inglaterra, onde se casou com Marianna Margitson, e regressou à África com a esposa. Lá nasceu seu primeiro filho, que morreria de sarampo aos dez anos de idade. Em 1882 o casal voltou a viver na Inglaterra, onde nasceram suas três filhas.

Em 1884, após ter passado algum tempo estudando Direito, Haggard começou a advogar, mas a maior parte do seu tempo era gasta escrevendo novelas. Em 1885, publicou “As Minas de Salomão”, com base em suas memórias da África e de aventureiros que lá conhecera, os quais o inspiraram a criar o herói e narrador do livro, Allan Quatermain. A história conta as peripécias de três europeus na terra perdida de Kukuanaland, povoada por guerreiros e dominada por um tirano e usurpador. Entre lutas e aventuras, os estrangeiros ajudam o herdeiro legítimo Ignosi, que até então se disfarçara como um criado de nome Umbopa, a recuperar o trono. Haggard mostra certa simpatia, se não respeito, pelas culturas africanas e confere traços heroicos ao príncipe exilado Ignosi, embora a narrativa ainda se desenvolva dentro de um viés colonialista: os europeus, na maioria, são benevolentes, atuam como conselheiros do jovem rei e são fundamentais na resolução da trama.

Várias editoras rejeitaram o livro, mas, ao ser finalmente publicado, ele se tornou um sucesso de vendas, com tiragem após tiragem saindo do prelo. Isso incentivou Haggard a escrever várias outras obras, a maior parte de aventura e fantasia, entre as quais se destacam “Ela” (publicado de forma seriada entre 1886 e 1887 e depois como livro), sua sequência, “Ayesha” (1905), e o romance protagonizado por um herói viking, “Erik Brighteyes” (1890). Alguns de seus livros flertam com a ideia do sobrenatural, tema pelo qual o escritor sempre se interessou.

As obras de Haggard não demoraram a ser conhecidas no Brasil. Para citar alguns exemplos, “Beatriz”, tradução do romance vitoriano “Beatrice” (uma história de amor sem aventuras ou elementos fantásticos, publicada em 1890), saiu pela Laemmert seis anos depois, e em 1898 o jornal carioca “A Imprensa” publicou, como folhetim, “O Testamento do Sr. Meeson”, novela de aventura escrita dez anos antes. Veja um capítulo desta última.

“As Minas de Salomão” chegou ao Brasil através da tradução do escritor português Eça de Queiroz – na verdade uma reescrita do texto mais factual e comedido de Haggard, ao qual Eça adicionou um jeito todo próprio de contar a história. Publicada, em princípio, na “Revista de Portugal”, entre 1889 e 1890, a edição portuguesa em livro saiu em 1891 e foi comercializada aqui antes que o texto traduzido fosse republicado por editoras brasileiras.

Veja a notícia de publicação de “As Minas de Salomão” pela editora gaúcha Livraria Americana, na qual se tecem considerações sobre a obra. Ela traria “fatos verídicos” , ao contrário de obras de Júlio Verne, a quem o autor inglês era equiparado (Almanack Litterário e Estatístico do RS, 1905)

Leia a análise de alguns trechos da obra, em tradução literal e na tradução de Eça de Queiroz, em artigo do escritor Godofredo Rangel, no “Diário de Notícias” de 1933.

Alguns pesquisadores contestam a autoria da tradução, que segundo eles foi apenas revisada e não realizada por Eça de Queiroz. O fato é que, para os leitores de língua portuguesa, essa versão continuou a ser publicada ao longo de décadas, e talvez seu colorido peculiar tenha contribuído para tornar a obra tão conhecida e querida no Brasil. Outros romances, publicados aqui desde o final do século XIX, e até mesmo livros de aventura, tais como “Ela”, “A Volta de Ela” e “O Anel da Rainha de Sabá”, publicados na Coleção Paratodos da Cia. Editora Nacional entre as décadas de 1930 e 1950, tiveram circulação mais restrita, e alguns são hoje praticamente desconhecidos do público.

Veja a adaptação de “As Minas de Salomão” para quadrinhos, feita pelo artista Fernando Dias da Silva e publicada na revista “O Mundo Ilustrado” (1953).

Curiosamente, dentre as muitas obras de Haggard adaptadas para o cinema e a televisão, foi “Ela” e não “As Minas de Salomão” a que teve mais versões, inclusive uma dirigida pelo pioneiro Georges Meliès em 1899, intitulada “A Coluna de Fogo”. “As Minas de Salomão” estreou nas telas em 1937, com a história modificada em relação ao livro e trazendo o renomado cantor e ativista negro Paul Robeson no papel de Umbopa/Ignosi. A adaptação mais famosa é de 1950, em que o papel foi interpretado pelo ator africano Siriaque.

Veja fotos das filmagens de “As Minas de Salomão” na Fon-Fon (1951).

Os livros de H. Rider Haggard influenciaram muitos outros autores que escreveram sobre mundos e civilizações perdidas. Entre eles, nomes ilustres, como Arthur Conan Doyle, Edgar Rice Burroughs e o criador de “Conan”, Robert E. Howard. Seu personagem Allan Quatermain participou de cerca de dez novelas escritas por Haggard e, além de inspirar a criação de outros aventureiros fictícios, tais como Indiana Jones, aparece em obras de autores contemporâneos, como a famosa história em quadrinhos roteirizada por Alan Moore, “A Liga Extraordinária” (2001).



O Capitão John monta um... potro? (HQ de “As Minas de Salomão”, arte de Fernando Dias da Silva).