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Livros de Aventura | Moby Dick

31 ago 2022

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Um dos mais conhecidos livros de aventura, “Moby Dick” é uma obra monumental, repleta de simbolismo e de referências a clássicos universais.

Seu autor, Herman Melville (Nova York, 1819 – 1891), nasceu numa família de comerciantes de ascendência escocesa e holandesa. Com a morte do pai, teve de intercalar períodos de estudo com outros de trabalho como escriturário e professor. Tinha menos de vinte anos quando se tornou marinheiro, e até 1844 fez várias viagens, inclusive em navios baleeiros, nos quais viveu experiências que o ajudaram a escrever sua obra-prima. Conheceu também lugares que viria a descrever, como as ilhas do Pacífico Sul que servem de cenário a seu primeiro livro. “Typee”, um relato romantizado de viagem, foi publicado em 1846. No ano seguinte, Melville se casou com Elizabeth Knapp Shaw, com quem teve quatro filhos.

“Typee”, sua sequência, “Omoo”, e os três livros subsequentes de Herman Melville foram elogiados pela crítica e por escritores como Nathaniel Hawthorne. O autor de “A Letra Escarlate” influenciou Melville a ponto de levá-lo a reescrever boa parte de “Moby Dick”, obra de que vinha se ocupando desde o início de 1850 e à qual se referiu como “um romance de aventura, baseado em lendas que correm nas companhias baleeiras”. Depois de muitas modificações, o livro saiu em 1851, primeiro numa edição britânica em três volumes – que foi intitulada “A Baleia” e na qual, além de vários cortes impostos pelos editores, suprimiu-se o epílogo -- e, em seguida, em volume único, nos Estados Unidos, já com o título definitivo.

Narrada em primeira pessoa por um tripulante de navio baleeiro (responsável por uma das mais famosas primeiras frases de todos os tempos, “Call me Ishmael”), “Moby Dick” é uma história de aventura e vingança, na qual o sombrio Capitão Ahab viaja incansavelmente à caça da baleia branca para a qual perdeu uma de suas pernas. O livro tem nada menos que 135 capítulos, alguns dos quais são informativos: tratam de temas como a história dos baleeiros, a classificação científica dos cetáceos e sua representação na arte. Também há trechos de pura ação, mostrando a perseguição e a caça, enquanto outros vão construindo habilmente o momento do clímax ao longo da viagem marítima e das ações cada vez mais maníacas do capitão.  Um ponto a ser notado é a narrativa de Melville, sempre complexa, lançando mão tanto da linguagem e da gíria náutica quanto de recursos de estilo à maneira dos sermões religiosos. Vários críticos o aproximaram de Shakespeare em tragédias como “Macbeth”, “Rei Lear” e especialmente “Hamlet”, personagem que, tal como Ahab, é atormentado por forças além do seu controle.

Com toda a sua grandiosidade, “Moby Dick” não foi um sucesso de vendas. As tiragens eram pequenas – menores que as dos livros anteriores de Melville – e os livros saíam lentamente. A crítica se dividiu: alguns consideraram a obra bem escrita, imaginativa, vigorosa, enquanto outros, principalmente os conservadores, reclamaram da irreverência, do uso de termos “profanos” e dos exageros na composição de Ahab. O livro seguinte de Herman Melville, “Pierre” (1852), também foi um fracasso comercial, o que levou seu editor a recusar um manuscrito intitulado “Isle of the Cross”. A obra, hoje perdida para sempre, foi mencionada em cartas a Nathaniel Hawthorne, e teria uma mulher como protagonista.

Melville ainda escreveu alguns contos e livros – alguns, como “Bartleby, o Escriturário” (1853) e o romance “Billy Budd”, publicado postumamente em 1924, se tornaram bastante conhecidos --, mas não tornou a ter o sucesso de “Typee”. Também não chegou a ver “Moby Dick” ser redescoberto por pesquisadores e editores, ser incluído entre as grandes obras da literatura estadunidense e universal e, a partir dos anos 1920, conquistar definitivamente o público, embora muitos leitores não conheçam a versão integral.

Segundo John Milton, que escreveu sobre traduções brasileiras em publicação da UNICAMP, o livro de Melville foi traduzido de três diferentes formas no Brasil. A primeira, chamada por ele de “pretensa tradução”, é uma adaptação que leva pouco em conta a linguagem original e promove cortes para tornar a obra mais palatável para o grande público, ou mesmo para cortar gastos. Foi assim a primeira tradução de “Moby Dick no Brasil”, feita por Monteiro Lobato e Alberto Rochsteiner para a Cia. Editora Nacional, na qual os 135 capítulos da obra original viraram 55.

Veja uma notícia da tradução na Coleção “Para Todos”. O livro é dito “de ação” e subtitulado “a fera do mar” (O Cruzeiro, 1935).

Leia artigo da escritora Rachel de Queiroz contando suas impressões sobre a obra (O Cruzeiro, 1950).

O subtítulo da primeira edição brasileira veio, possivelmente, da primeira adaptação de “Moby Dick”, para o cinema: um filme mudo estrelado por John Barrymore e lançado em 1926. Em 1956, um segundo filme, dirigido por John Houston e com Gregory Peck no papel de Capitão Ahab, fez um grande sucesso, o que levou editores de vários países a investirem em novas traduções do livro. No Brasil, em 1957, havia duas traduções: mais uma do tipo “pretenso”, de José Maria Machado, e uma do segundo tipo, fiel ao original, por Beatriz Xavier. Esta saiu pela José Olympio, e mais tarde foi republicada pela Francisco Alves e pela Ediouro.

Leia uma notícia da tradução integral de Beatriz Xavier (A Cigarra, 1957). A edição foi prefaciada por Rachel de Queiroz.

Além desses dois tipos de edição, “Moby Dick” foi, também, recontado e adaptado para jovens e crianças. Tais como as “pretensas”, essas versões suprimem ou condensam em poucas frases os capítulos informativos e se concentram mais na ação, realçando as características que fazem da obra um livro de aventura. Uma boa adaptação, porém – seja na literatura, visando agradar a leitores mais novos, seja em outras mídias –, sempre deverá levar em conta as várias camadas da obra, de forma a preservar a intensidade da narrativa, a construção dos personagens e o fascínio das cenas que transcorrem em meio a poderosas forças da natureza.



A Cigarra, 1957.