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A Manhã (Rio de Janeiro, 1935)

28 out 2015

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e marcado com as tags Aliança Nacional Libertadora, Antifascismo, Carlos Lacerda, Censura e repressão, Crítica política, Cultura popular, Di Cavalcanti, Futebol, Getúlio Vargas, Imprensa marxista, Jorge Amado, Luís Carlos Prestes, Movimento grevista, Nacionalismo, Partido Comunista Brasileiro, Questões agrárias, Questões sociais, Questões trabalhistas, Rio de Janeiro, Rubem Braga, Sindicalismo

A Manhã foi um diário matutino lançado no Rio de Janeiro (RJ) em 26 de abril de 1935, por Pedro Mota Lima, como órgão de divulgação da Aliança Nacional Libertadora (ANL). Ligado ao Partido Comunista, foi, portanto, um periódico de combate à ideologia fascista, ao imperialismo, ao latifúndio e ao governo de Getúlio Vargas, defendendo não só o movimento de frente ampla mas também as lutas populares por melhores condições de vida e trabalho, a valorização da cultura popular brasileira e o engajamento da sociedade à esquerda. Ao dar ênfase às atividades da ANL, que ocupavam a maior parte de suas edições, o jornal ia contra a corrente de grande parte da grande imprensa, que ignorava ou hostilizava o movimento. Sem ter nenhuma relação com o jornal homônimo fundado por Mário Rodrigues cerca de dez anos antes, na capital, A Manhã era dirigido pelo seu fundador, Pedro Motta Lima, contando ainda com o trabalho de Osvaldo Costa, Sadi Garibaldi, Paulo Motta Lima, Di Cavalcanti, Hermes Lima, Jorge Amado, Brasil Gérson, Rubem Braga, Carlos Lacerda, Maurício de Lacerda, Álvaro Moreira, Anísio Teixeira, Josué de Castro, Francisco Mangabeira, Newton Freitas, Durval Pereira, Sá Pereira, Léo Gordon, entre outros.

Basicamente, em cada edição, A Manhã trazia relatórios dos principais acontecimentos nacionais da área sindical, dando destaque a greves e assembleias de classe e promovendo campanhas salariais, como a campanha nacional pró-salário mínimo. Movimentos populares políticos, sociais e culturais, desde que engajados com a esquerda, também eram divulgados pelo diário, que destacou atividades da Frente Única Popular Antiintegralista, a União dos Negros do Brasil, a União Feminista do Brasil, o Centro de Defesa da Cultura Popular, o Clube da Cultura Moderna, entre outras organizações. Em sua editoria internacional, A Manhã priorizava o noticiário sobre manifestações e movimentos proletários e antifascistas ao redor do mundo.

A partir de julho de 1935, quando do aperto do governo Vargas sobre a ANL, A Manhã começou a viver seus momentos mais difíceis. Grupos políticos e militares, com o apoio de setores da imprensa, começaram pleitear às autoridades a suspensão da ANL, sob a alegação de que se tratava de uma organização comunista. O jornal do movimento, obviamente, se colocava contra esta pressão, vindo a publicar, em sua edição de 5 de julho de 1935, um importante manifesto de Luís Carlos Prestes, presidente de honra da ANL. Poucos dias depois, em 11 de julho, a aliança acabou sendo fechada por decreto do governo, mas A Manhã continuou circulando, evitando ataques frontais a Vargas. A rigor, o diário culpava “agentes internacionais” pela suspensão do movimento de frente ampla, como a família Guinle, os Diários Associados de Assis Chateaubriand, Roberto Simonsen e o British Intelligence Service – em sua postura antiimperialista e nacionalista, não convinha ao matutino criticar forças militares. Por outro lado, no mês seguinte ao do fechamento da ANL, A Manhã voltou seus ataques, de maneira mais aguda, à Ação Integralista Brasileira e a Plínio Salgado, líder deste movimento. Já no dia 2 de agosto era publicada uma extensa matéria denunciativa alegando envolvimento de Salgado com corrupção e vinculando-o ao fascismo italiano.

Fora seu âmbito estritamente político, em setembro de 1935 A Manhã veio a lançar um suplemento dominical de cultura, proposto a valorizar a cultura brasileira e combater estrangeirismos. Ali, o diário promovia concursos entre escolas de samba, cobrindo seus desfiles e valorizando-as sobremaneira, tendo, aliás, empreendido esforços ao trazer agremiações da Zona Norte carioca para o centro da cidade no carnaval. Em paralelo, sem sacrificar suas editoriais sindicais e sócio-políticas, A Manhã também vinha mantendo bom noticiário esportivo, destacando sobretudo o futebol carioca. Nesse momento, o jornal era um dos matutinos mais vendidos da capital.

Em outubro de 1935 A Manhã iniciou sua derrocada. A partir desse mês o diário havia começado a empreender uma série de ataques diretos ao governo Vargas, tratando-o por fascista. O jornal continuou nesta toada até o dia 23 de novembro, quando, em detrimento da eclosão da Revolta Comunista em Natal (RN), toda a imprensa carioca foi posta sob censura – na ocasião, A Manhã apenas comentou o fato, sem emitir opiniões. Em 27 de novembro de 1935 a folha estava prestes a lançar uma edição conclamando a população a aderir ao levante comunista, mas antes que pudesse colocá-la em circulação, sua sede foi invadida e empastelada pela polícia, com a destruição de todos os exemplares ainda não distribuídos. Naquele dia a cidade do Rio de Janeiro sentia os efeitos do Estado de Sítio, já que, durante a madrugada, o 3º Regimento de Infantaria da Praia Vermelha e a Escola de Aviação Militar do Campo dos Afonsos haviam-se sublevado em apoio aos revoltosos de Natal, fazendo, assim, chegar a Revolta Comunista à capital. Na repressão por parte do governo, grande parte dos funcionários e dos colaboradores de A Manhã foi presa, à exceção dos que conseguiram sair do país a tempo. Imerso no turbulento ambiente político de sua época, afinal, A Manhã acabou tendo vida curta, sendo suspenso apenas sete meses depois de sua criação.

Logo no começo de 1936, Abguar Bastos e Domingos Velasco, deputados, chegaram a solicitar legalmente o título de A Manhã, numa tentativa de reavivar o diário. Acabaram sendo presos, acusados de comunismo por terem defendido a ANL e seu órgão de imprensa.

Fontes:

- GASPARIAN, Helena. A Manhã. In: ABREU, Alzira Alves et al. (Coord.) Dicionário histórico-biográfico brasileiro pós-1930. Rio de Janeiro: Editora FGV; CPDOC, 2001. Vol. III.

- SODRÉ, Nelson Werneck. História da imprensa no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966.