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A Classe Operária

23 jul 2014

Artigo arquivado em Hemeroteca
e marcado com as tags Astrogildo Pereira, Censura e repressão, Ditadura civil-militar brasileira, Estado Novo, Imprensa clandestina, Imprensa marxista, Maurício Grabois, Otávio Brandão Rego, Partido Comunista Brasileiro, Partido Comunista do Brasil, Rio de Janeiro

Fundado pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB), então denominado Partido Comunista do Brasil, A Classe Operária é um dos mais importantes periódicos de organizações partidárias de esquerda da história brasileira – e também o mais antigo ainda em circulação, precursor de Tribuna Popular, Imprensa Popular, Voz Operária e Novos Rumos. Foi fundado no Rio de Janeiro (RJ) como órgão do comitê central do PCB, em data sugestiva: 1º de maio de 1925, quando teria circulado com 5 mil exemplares. Seus fundadores foram Astrogildo Pereira e Otávio Brandão Rego, que tinham a colaboração de José Lago Morales e Laura Brandão.

Em seu II Congresso, o PCB havia decidido pela criação de um jornal que divulgasse o programa, as principais causas e a atuação do partido. No entanto, como foi criado em pleno estado de sítio – que durou quase todo o governo de Arthur Bernardes (1922-1926) –, o jornal teve que superar vários obstáculos, antes mesmo de ser lançado. Afonso Pena Júnior, então ministro da Justiça, chegou a destacar dois jornalistas, Alberto Lira e Carlos Sussekind, para censurar o periódico, embora, na prática, isso não tenha ocorrido.

Como o PCB não tinha gráfica própria, a primeira edição demorou alguns dias para ser lançada. A partir da segunda, o jornal passou a ser composto e impresso na oficina de O Paiz, ironicamente o grande jornal governista da República oligárquica. O aspecto visual do jornal melhorou consideravelmente com esta parceria.

Dedicando-se a temas centrais como a defesa das classes trabalhadoras, a disseminação do marxismo segundo a visão do Partido Comunista, o debate das causas e questões proletárias, a crítica ao capitalismo e a conciliação de classes e,não menos importante, as condições de vida e de trabalho dos trabalhadores brasileiros, A Classe Operária, em seus primeiros momentos, circulava repleto de reivindicações, com destaque para a seção de cartas de leitores. Seu noticiário era didático e popular, com as análises e discussões teóricas em segundo plano. Até a grande cisão no partido, em 1961-62, o periódico defendia incondicionalmente a linha política adotada pela União Soviética, vista como o modelo a ser seguido.A partir de 1962, com a primeira grande cisão, o jornal ficou com o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), de linha chinesa.

Inicialmente o jornal era um semanário de quatro páginas, em formato standard, impresso a off-set e com tiragem de cinco mil exemplares. Durante os primeiros anos, usava como subtítulo o slogan “Jornal de trabalhadores, feito por trabalhadores, para trabalhadores” e não se assumia como jornal do PCB, para evitar represálias. Seu primeiro editor foi A. Brazil de Mattos.

Atento às reivindicações populares em geral, às quais dava amplo espaço, o jornal logo aumentou a tiragem. Depois da 12ª edição, do final de julho de 1925, o governo de Arthur Bernardes suspendeu a sua circulação, indicando como motivo a campanha feita pelo periódico contra o representante da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil, Alberto Tomás, tido como um "reformista" que lutava pela conciliação de classes. Ao longo de sua conturbada história de falta de recursos para edição e de perseguições políticas, a circulação de A Classe Operária seria interrompida inúmeras vezes. Não foram poucos, porém, os períodos de circulação clandestina.

Em maio de 1928, já no governo de Washington Luís, A Classe Operária voltou a circular legalmente. Um dos motivos era a formação, sob a liderança d PCB, do Bloco Operário Camponês, frente de esquerda que disputou as eleições naquele ano. O editor era M. C. de Oliveira. Em meados de 1929, o periódico foi novamente fechado em decorrência da repressão política desencadeada pelo governo de Washington Luís. Sua redação foi invadida e depredada pela polícia, como também vinha acontecendo com diversos sindicatos.

Em 1930, A Classe Operária voltaria a circular, mas desta vez de forma clandestina e com periodicidade bastante irregular. Segundo a historiadora Marieta de Morais Ferreira, em verbete sobre o jornal no “Dicionário histórico-biográfico brasileiro pós-1930”, a redação funcionava em um pequeno quarto no bairro de Vila Isabel, onde os originais eram entregues ao editor e tipógrafo Antônio Pereira da Silva, que os compunha e imprimia às escondidas. Prontos e separados, os exemplares eram postos em caixotes às vezes cobertos por laranjas e encaminhados aos pontos de distribuição.

Apesar dos cuidados tomados pelos comunistas, a polícia do governo de Getúlio Vargas conseguia descobrir as oficinas ilegais, prender e torturar os responsáveis pelo jornal, que teimava em existir. Embora durante o governo Vargas (1930-45) tenha circulado a maior parte do tempo na ilegalidade, sobretudo no Estado Novo (37-45), seu papel na luta contra o fascismo e, no final da ditadura varguista, na campanha pela anistia foi significativo. Com o fim do Estado Novo e a abertura política, o PCB foi legalizado (maio 1945) e o jornal voltou a circular legal e periodicamente – agora como semanário oficial do PCB, que então podia assumir a sua paternidade.

Na nova fase, o editor era Maurício Grabois. Segundo Nelson Werneck Sodré, em sua História da imprensa no Brasil (p. 369), o periódico era “um dos mais bem feitos jornais do país”, muito por suas importantes inovações gráficas, que surpreenderam o restante da imprensa brasileira. Outras modificações podiam ser vistas em sua pauta política, que era nada mais que um reflexo das próprias transformações que o Partido Comunista havia sofrido no pós-guerra. Assim, os textos analíticos e teóricos eram mantidos em segundo plano, enquanto o noticiário esportivo e diário ganhava destaque, buscando aproximar o jornal dos setores populares.

Durante o governo de Eurico Gaspar Dutra e com o início da Guerra Fria, porém, em maio de 1947, o PCB teve seu registro cancelado. Dois anos depois, em maio de 1949, o jornal era novamente fechado, levando os comunistas a a criarem um novo periódico, a Voz Operária.

Em 1951, A Classe Operária renasceria, então vez como publicação mensal e como novo subtítulo: "Órgão central do Partido Comunista do Brasil". Maurício Grabois continuava como o editor. Além da nova disposição gráfica, seu conteúdo e direcionamento doutrinário haviam mudado bastante. Ainda segundo para Marieta de Morais Ferreira, a principal preocupação não era mais o cotidiano das classes operárias e a conscientização das massas, mas o fortalecimento ideológico do PCB. O noticiário amplo e geral, que havia caracterizado o jornal tempos antes, desaparecera, dando espaço a artigos teóricos e analíticos sobre o marxismo-leninismo, os rumos do movimento comunista mundial e a disciplina e educação ideológica dos filiados ao partido. Outros dois periódicos do PCB – Voz Operária e Imprensa Popular – se encarregariam do noticiário geral, voltado à doutrinação das forças populares e não-intelectualizadas. A nova proposta, no entanto, não deu certo, e em junho de 1952 o próprio partido fechou o jornal.

Depois de dez anos de inatividade, no início de 1962, com a primeira grande dissidência do PCB e a consequente criação do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), A Classe Operária voltou a circular – agora, como órgão de propaganda do novo partido. Maurício Grabois, Pedro Pomar, João Amazonas Diógenes Arruda Câmara foram os principais organizadores do PCdoB (visto por eles como o Partido Comunista original). O jornal circulou legalmente e com regularidade (era vendido nas bancas) até março de 1964. Com o golpe civil-militar, o jornal foi novamente silenciado, voltando a circular por pouquíssimo tempo e com muitas dificuldades em abril de 1965. Logo em seguida voltou à clandestinidade, circulando mensal e irregularmente em mimeógrafo.

Em 1973, com a vigência, desde 13 de dezembro de 1968, do Ato Institucional Nº 5 (AI-5)e com o governo militar em vias de desarticular a guerrilha que estava sendo organizada pelo PCdoB na região do rio Araguaia, no centro-norte do país, os editores de A Classe Operária foram descobertos, presos e torturados. O jornal ficou sem circular até janeiro de 1975. Durante alguns anos, nessa mesma década, chegou a ser editado na França e impresso em Portugal, sendo distribuído clandestinamente no Brasil. O alcance, porém, era restrito aos membros do partido ou a pessoas ligadas à resistência ao regime militar.

Com a abertura política no Brasil, o PCdoB lançou, em 1980, A Tribuna da Luta Operária, jornal voltado às camadas populares e vendido em bancas. A Classe Operária, ainda o órgão oficial do comitê central do partido, continuou a circular, porém numa condição restrita, na semilegalidade. Com a legalização do partido em 10 de maio de 1985, e já extinta a ditadura militar, o jornal voltou a circular em junho, tendo como editor João Amazonas, um dos mais antigos dirigentes do partido. Maurício Grabois, que editara o jornal durante anos, havia morrido no dia 25 de dezembro de 1973 em combate contra uma tropa do Exército brasileiro na Guerrilha do Araguaia.

Hoje A Classe Operária circula em forma impressa e digital, com periodicidade mensal e formato de revista, acessível no site do PCdoB (www.pcdob.org.br/classe-digital/). O principal responsável pela publicação é o secretário nacional de comunicação do PCdoB, José Reinaldo Carvalho. O editor é José Carlos Ruy.

O site Arquivo Marxista na Internet (www.marxists.org/portugues), na seção "Imprensa Proletária", ainda traz edições digitalizadas de A Classe Operária do período de março de 1972 a janeiro de 1977 (abrangendo o período clandestino do jornal durante a ditadura militar).

Fontes:
1. Arquivo Marxista na Internet. Coleção A Classe Operária. Disponível em: http://www.marxists.org/portugues/tematica/classe_operaria/index.htm Acesso em 27 mar. 2013.

2. A Classe Operária. Ano 87, 7ª fase, nº 49. Março de 2013. Disponível em: http://www.pcdob.org.br/classe-digital/ Acesso em 27 mar. 2013.

3. FERREIRA, Marieta de Morais. A Classe Operária. In: ABREU, Alzira Alves et al. (Coord.) Dicionário histórico-biográfico brasileiro pós-1930. Rio de Janeiro: Editora FGV; CPDOC, 2001. Vol. II.

4. SODRÉ, Nelson Werneck. História da imprensa no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966.