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A Crença: jornal politico e litterario

por Maria Ione Caser da Costa
O semanário A Crença: jornal politico e litterario foi editado sob a direção de Ed. Villas-Boas, que também foi o responsável pela redação. Lançado em uma quarta-feira, dia 27 de outubro de 1887, no Rio de Janeiro, foi impresso pela Imprensa Mont’Alverne, que estava localizada o número 3, do Largo da Carioca.

O número avulso de A Crença foi vendido por 200 réis, e os valores das assinaturas anuais valiam 10$000 para a corte e 12$000 para o exterior ou as províncias. A assinatura semestral custava 5$000 para a corte e 6$000 para o exterior e/ou províncias, e os interessados deveriam efetuar o pagamento adiantado. Uma observação colocada na capa informava que “no fim de cada trimestre publicarà, na capa, a relação dos Srs. assignantes que tenham realisado suas assignaturas.”

Logo abaixo do título encontra-se a seguinte informação: “este jornal, collaborado por muitos homens de lettras, recebe e publica gratuitamente artigos de interesses geraes, bem como romances, poesias, approvados pela redacção, a qual não será obrigada a dar os motivos da escusa da publicação. Em cada capa publica annuncios importantes, segundo o que fôr ajustado.”

A Biblioteca Nacional tem em seu acervo apenas os dois primeiros exemplares, que podem ser consultados através da Hemeroteca Digital. O número dois saiu publicado no dia 3 de novembro de 1887. O primeiro tinha 12 páginas enquanto que o segundo saiu com duas a menos. Cada página foi diagramada em duas colunas separadas por um fio simples, não apresentando ilustração.

Uma extensa lista de colaboradores aparece na segunda página. Muitos se consagraram na literatura brasileira, dentre eles citamos Arthur Azevedo (1855-1908), Bittencourt da Silva (1831-1911), Ernesto Senna (1858-1913), Escragnole Taunnay (1843-1899), Felix Ferreira (1841-1898), Guilherme Bellegarde (1836-1890), Machado de Assis (1839-1908) e Quintino Bocayuva (1836-1912). Na terceira página, um longo editorial, inicia com letra capitular, e discorre, sobre a luta abolicionista de seus editores.

 
Nas civilisadoras obras do progresso e da perfectibilidade humana nunca são demais os obreiros que vão levar-lhes o concurso de suas aptidões, ou, como nós – os esforços de suas boas vontades.

No vasto templo eregido á glorificação de nossa futura e liberal grandeza, já carcomido pelo parasytismo dos partidos, que ante elle vegetam – ainda não foi erguida a esplendorosa cupula da liberdade – que tem de encarar e atravessar os seculos.

Para elevar-se e concluir-se esse eterno monumento de soberba e formosa architectura, trabalharam os utopistas de outr’ora, trabalham os crentes de hoje – que serão os vencedores de amanhã.

Nós, como jornalistas e como emancipadores – apesar de longos annos de esteril peregrinação, não sômos desconhecidos dos trabalhadores hodiernos.

O titulo deste jornal não póde estar esquecido por aquelles que ha mais de trinta annos trabalham pela liberdade da espécie humana.

Segue o editorial fazendo um relato das conquistas alcançadas, e constrói um histórico das lutas travadas pelos que acreditavam que a abolição da escravatura seria possível, apesar do processo longo e difícil, marcado por grandes sofrimentos.

A Crença publicou artigos variados, poemas, sonetos, depoimentos de personalidades ilustres, favoráveis à abolição da escravatura e alguns anúncios nas duas últimas páginas de cada exemplar.

A seguir transcrevemos um soneto de Laurindo José da Silva Rabello (1826-1864), oferecido ao periódico A Crença, por “nosso colega e amigo João Luiz de Almeida e Cunha, como uma das raras producções do chorado poeta”.

 

Conta e tempo

Deus pede estreita conta a mim do tempo

É forçoso do tempo já dar conta;

Mas, como dar sem tempo tanta conta

Eu que gastei sem conta em passatempo?

 

Para ter minha conta feita a tempo,

Dado me foi bem tempo e não fiz conta;

E quero hoje do tempo fazer conta

E p’ra fazer a conta falta tempo.

 

Oh! vós, que tendes tempo sem ter conta,

Não o gasteis sem conta em passatempo

Cuidae emquanto é tempo em fazer conta.

 

Mas ah! se quem isto conta de seu tempo,

Fizesse desse tempo alguma conta

Não chorára sem conta, o não ter tempo.

 

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