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Jornal da Sociedade Philomatica

por Maria Ione Caser da Costa
O Jornal da Sociedade Philomatica teve seu primeiro número lançado em abril de 1859 no Rio de Janeiro e foi impresso pela Typographia Franceza de Frederico Arfvedson, que estava localizada no Largo da Carioca, nº 14.

A coleção da Biblioteca Nacional é composta apenas pelos dois primeiros exemplares. O segundo foi publicado no mês seguinte, em maio, tendo sido impresso pela Typographia de Teixeira & Co.ª, situada na rua do Ouvidor, nº 91.

As capas dos dois exemplares foram diagramadas com uma cercadura ornamental de estilo rococó. Na parte interna da moldura além dos dados referentes ao título e data de publicação, está a relação dos colaboradores que participaram da comissão de redação. São eles: Francisco de Siqueira Dias, Manoel Inacio Barboza Lage, Antonio Justiniano das Chagas, Honorio Bicalho, Eugenio Adriano Pereira da Cunha e Mello e Francisco Bazilio Duque.

O periódico pertenceu a Sociedade Philomatica que foi “fundada em Junho de 1858 por alguns sócios desejosos do cultivo das letras”. Esses sócios eram jovens, “em cujas veias borbulha o sangue aquecido pelo sol dos tropicos, prometem um futuro brilhante, se desempenharem o compromisso que contrahirão”. Quase um ano após a criação da Sociedade Philomática, foi lançado o primeiro exemplar do jornal, que contava com um “não pequeno numero de sócios effectivos e honorários, que, como os primeiros, esforção-se pelo progresso e prosperidade da mesma sociedade”.

O editorial, com o título “Primeira folha”, sem indicação de autoria, inicia com uma epígrafe retirada de “Inspirações do claustro” de Junqueira Freire (1832-1855): “Eis-ahi, pois, a definição de meu trabalho. Julgai-o por essa maneira, - e sêde rigorosos, sim, - porém justos”. Eis um excerto do editorial.

 
Quando quebramos os élos, que prendem as nossas idéias ás profundidades de nossas almas, ellas são recebidas pela intelligencia de cada um, ou por meio de nossas palavras, ou pelo invento de Guttenberg. As primeiras ás mais das vezes acolhidas em um pequeno auditorio, perdem-se com o correr do tempo; - as ultimas, gravadas de uma maneira indelevel, recebendo uma fórma palpavel, atravessão os seculos, conservando sempre a intenção de seu primeiro autor.

D’ahi, nasce a necessidade de um jornal para a SOCIEDADE PHILOMATICA.

Ainda mais: - Sendo ella uma sociedade scientifica, e, como bem demonstra o seu titulo, - desejosa de instruir-se, necessitava de um jornal, para o cultivo do espirito de cada um dos socios. E qual o meio mais natural a empregar-se?

- Creando-se um jornal, em que a grande somma dos trabalhos scientificos e litterários de cada um dos socios, servisse de pasto ás intelligencias de todos.

O desejo de instruir-nos, de conservar as lições, que fossemos recebendo; eis os motivos que derão existência a este jornal.

Filho de uma associação ainda principiante, - é natural, que appareção alguns defeitos em suas columnas; - relevem-nos os leitores: - a culpa não é nossa. [...]

- Eis o frontispicio de nossa modesta associação, primeira pedra de seu alicerce fraca, como nós, não se unirá ás d’esses templos de architectura gothica, cobertos de mil relevos, que vão perder-se nas nuvens, com suas cruzes douradas, servindo de pouso ás altaneiras águias.

Agora avaliem-nos.

Fecimus quod possimus, faciant meliora potentes. (Tradução da expressão latina:

O periódico apresentou artigos científicos sobre filosofia, sobre as grandes invenções conquistadas pela humanidade, além de poesias e contos. Como mencionado no editorial, o   objetivo era divulgar os trabalhos científicos e literários de cada um dos sócios.

O poema selecionado para ilustrar o dossiê é “Na rede” do poeta romântico Casemiro de Abreu (1839-1860), que é homenageado nas páginas do Jornal da sociedade Philomatica.

 

Na Rede

Nas horas ardentes do pino do dia

Aos bosques corri,

E qual linda imagem dos castos amores,

Dormindo e sonhando, cercada de flores,

Nos bosques a vi!

 

Dormia deitada na rêde de pennas

— O céo por docel;

De leve embalada no quieto balanço

Qual nauta scismando n’um lago bem manso

N’um leve batel!

 

Dormia e sonhava — no rosto sereno

Qual um seraphim:

Os cilios pendidos nos olhos tão bellos,

E a briza brincando nos soltos cabellos

De fino setim!

 

Dormia e sonhava — entregue formosa

Ao doce sonhar,

E doce e sereno n’um magico anceio

Debaixo das roupas batia-lhe o seio

No seu palpitar!

 

Dormia e sonhava — a boca entr’aberta,

O labio a sorrir;

No peito cruzados os braços dormentes,

Compridos e lisos quaes brancas serpentes

No colo a dormir!

 

Dormia e sonhava! — de manso cheguei-me

Sem leve rumor,

Pendi-me tremendo e qual fraco vagido,

Qual sopro da briza, baixinho ao ouvido

Fallei-lhe de amor!

 

Ao halito ardente o peito palpita...

Mas sem despertar;

E como nas ancias d’um sonho que é lindo,

A virgem na rêde - corando e sorrindo

Beijou-me — a sonhar!

 

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