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O Domingo: jornal litterario e recreativo

por Maria Ione Caser da Costa
O Domingo: jornal litterario e recreativo foi editado pela primeira vez no Rio de Janeiro em 23 de novembro de 1873 sob a responsabilidade de D. Violante Atabalipa Ximenes de Bivar e Vellasco (1817-1875). Foi impresso pela Typographia Lyra de Apollo, que estava localizada na rua d’Alfandega, nº 185.

Em 1852 dona Violante, como era respeitosamente chamada, já havia assumido a direção do Jornal das Senhoras, uma publicação destinada às mulheres, fundada por Joana Paula Manso de Noronha (1819-1875).

Cada exemplar de O Domingo foi composto por quatro páginas, e cada página dividida em duas colunas, separadas por um fio simples. A partir do número 55 passa a ser estruturado em três colunas.

As assinaturas valiam “2$ por trimestre, 4$ por semestre e 8$ por ano, para a Côrte e Nictheroy.” E as reclamações e pedidos de assinatura deveriam ser remetidas para o sobrado que estava localizado na rua do Principe dos Cajueiros, nº 64, atualmente é a rua Senador Pompeu.

Voltado para a defesa do direito à educação e emancipação feminina, a redatora e proprietária do semanário tentava despertar nas mulheres a vontade de se profissionalizar, publicando textos literários e biografias de mulheres ilustres. Eis o editorial:

 
Uma vez que os seculos caminham, devemos todos convir que a humanidade tem a obrigação de acompanhar a marcha peranne e incessante dos seculos.

O Creador Supremo formando o mundo em seis dias e descançando no setimo, deu ao homem, não só o exemplo do trabalho, como o do repouso apóz; e o homem a isso habituou-se e tudo foi maravilhosamente. Nos tempos primitivos os habitantes da terra lavraram a dita e apascentavam rebanhos, eram trabalhos que só se faziam de sol a sol, (espécie de musica oitavada, de fácil preludio); nada havendo que fazer á noute, dormia-se que para isso Deus a creára. [...]

E o dia de repouso ainda era um só!

De necessidade em necessidade, de invento em invento, chegou a época em que ha bailes, imprensa, navegação, bonds, telegraphos electricos, patrulhas e salteadores, que obrigam a velar, uns, grande parte da noute, e outros a noute inteira.

Percorreu-se a escalla de maior a menor e vice-versa.

E o dia de repouso ainda é um só! [...]

Foi em virtude d’estas ideias e do intuito de contribuir com o nosso minguado contingente para o bem dos nossos semelhantes que nos lembramos de introduzir mais um Domingo na semana. Quod abundat non nocel.

É um Domingo sem obrigação de ouvir missa.

É um Domingo que embora permitta o céo, véda as diffamações e não consente variações de rebeca sobre o thema da vida alheia. [...]

Decididamente, a humanidade não póde deixar de bem dizer-nos agradecida! Se todavia o respeitavel publico julgar-nos com direito á sua gratidão, desde já lhe declaramos que dispensamos a creação de estatuas ou qualquer outro monumento: basta-nos que adopte nossa ideia e proteja o nosso Domingo.

O Domingo não teve vida efêmera. Pode-se afirmar que teve uma coleção grande, se considerarmos a média dos fascículos publicados por cada título nos oitocentos. Publicou até o número 71, em 9 de maio de 1875, quando morre Violante Atabalipa, portanto, seu semanário circulou por quase dois anos ininterruptos.

A partir do número 21, publicado no dia 12 de abril de 1874 o subtítulo da publicação muda para semanário litterario e recreativo. O número 55, publicado em 10 de janeiro de 1875 acrescenta ao subtítulo a frase “colaborado por algumas senhoras”.

Em seu conteúdo são encontrados poemas, folhetins, charadas, piadas, e pequenas histórias. Alguns de seus colaboradores foram Adelia Josefina de Castro Rebello (1827-1920), Alexandrina Aragão, Alice de Sá Rego, Carlos Ferreira, Ezequiel Freire, Honorata Carneiro de Mendonça, J. Augusto da Silva, Lellis Teixeira, Lopez de La Vega, Maria Leonilda Carneiro de Mendonça, Martinho Rodrigues, Miguel Vieira Fernandes, Narciza Amália, Olympio Catão, Olympio Julio de Oliveira Mourão, Tossam Lomel, Visconde da Pedra Branca, dentre outros.

A seguir um poema de D. Maria Leonilda Carneiro de Mendonça escrito em abril de 1874 na cidade de Rio Preto, MG.


Não creias, não!

Recitativo
L'oubli! 1'oubli! c'est 1'ondo oú tou se noie
V. Hugo

Onda perdida, d'Oceano abismo,
aos pés do Bardo, murmurand’amor,
se distraida, junto á ti eu scismo,
não creias, não, qu’eu vos tenh’horror!

Rôlla sentida, que no verde ramo,
modella endeixas, que suspir’á medo,
se alguem disser-te, qu’eu te não amo,
não creias não, ainda é cedo!..

Meigo regato, que rolando treme,
na verde relva, deslisar-se á custo,
s'a lyra novel, junct’a ti só geme,
não creias, não, que me causes susto.

Astro da noute, que nos Céos errante,
a terra cobre, d'argentina cor,
s'evito ás vezes, teu fallar constante,
não creias, não que me causes dôr !

Anjo ou demonio, que doudej’á mente
qual lava ardente, que traduz “amor”
s'e o vate ás vezes sem querer te sente,
não creias não, que me causes dôr!

Sonho da vida, nos emball’um dia,
a fronte ardente, qu’o pézar créstou!
gozos insanos qu’a demencia cria!
louca magia qu’o tufão levou!

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