BNDigital

Periódicos & Literatura

< Voltar para Dossiês

A Estréa: publicação mensal

por Maria Ione Caser da Costa
A Estréa: publicação mensal foi lançada no Rio de Janeiro, no dia 15 de abril de 1904, quando a República dava seus primeiros passos. O gerente responsável foi Arthur Oswaldo e o redator chefe foi Hermes Fontes (1888-1930). Como secretário estava Julio de Suckow (1880-?).

O editorial de autoria de Hermes Fontes, então um jovem de apenas 15 anos, assinando com as iniciais H. F., discorre sobre a esperança de publicar um periódico simples, mas que tentará incentivar outros jovens a conhecerem as letras e as artes.

É mais uma tentativa e, portanto, mais um esforço. Abre os olhos ao publico na quadra em que as flores abrem o caule de esmeralda aos róridos beijos do céo primaveril.
Orgão de uma republica litteraria, é, de algum modo, um incentivo, um impulso que se dá a jovens cultores o Bello, modestos herdeiros, ao menos por pensamento, dessa rutilante pleiade artística que enobrece a Terra de Santa Cruz. D’ahi não se deve deduzir que A Estréa empunhe e levante o lábaro da Pretensão, porque, além de tudo, reconhece nesta uma divindade pagan, cujo throno é um torvellinho de tenebrosos bulcões que, por seu turno, obumbram os raios do sol; e, fazendo a treva campear infremente, preludiam os desatinos e preparam as grandes catastrophes. É por isso que o recente jornalzinho se esquiva dessa estrada, d’onde, a nosso ver, emana a orphandade da Luz. [...]
É o caso dos jornaes inicialmente palavrosos. Assim, as palavras de nosso programma são succintamente, estas: “orgão de principiantes”. Bem se vê que nos esgueiramos ás proclamações bombasticas.
E é sob esse mesmo principio que A Estréa desabotôa, como um pórtico de nosso futuro e um palladium de nossas esperanças.
As colaborações daqueles que desejassem “iniciar nas Lettras”, como indica um convite logo na primeira página, deveriam ser encaminhadas para a rua Conde de Bonfim, nº 149, endereço de Hermes Fontes.

A Estréa teve como colaboradores Armando Motta, J. d’Alvear (1884-?), Thomaz Pará, Jayme Lessa, Luiz Pistarini (1877-1918) e Aniceto de Medeiros (1883-1956), que seriam também os responsáveis por julgar e dar o parecer final para o aceite dos textos enviados, a título de colaboração.

Medindo 35 cm x 24 cm, cada página foi diagramada em três colunas e o título, composto por quatro páginas, não apresentou ilustração.

Um único exemplar está armazenado na Biblioteca Nacional, o número 1. Não foram encontrados outros exemplares nas pesquisas realizadas em bibliotecas. Em suas páginas foram publicados conto, crônica (também de autoria de Hermes Fontes), poemas e o capítulo de uma novela.

Das páginas de A Estréa selecionamos o soneto “Silencio!” de J. d’Alvear que o dedica a Hermes Fontes. J. d’Alvear, além de colaborar com o jornalismo, também teve participação na aeronáutica brasileira, construindo, em 1914, um novo tipo de monoplano. De acordo com a revista Fon-Fon de 15 de novembro de 1914, este foi o primeiro invento nacional construído na América do Sul sem auxílio do Governo. Eis o soneto:

Silencio!

Estavamos os dois. Nunca tão bella
A tarde nos sorriu. Sereno e vago,
O céu não era o céu de hoje naquella
Tarde outonal que de memoria trago.

Tudo era bello, tudo: a immensa Umbella,
O campo, o valle, o bosque, a fonte, o lago,
Aves e flores, a distancia, a estrella
Vesper, a rir-nos com ternura e affago.

Sós e tão sós... De uma arvore copada,
Sob a silvestre e espessa ramaria,
Olhei-a, olhou-me. Estava dominada.

Houve um rumôr nas frondes do arvoredo.
Depois... depois.... (que diga a cotovia)...
Silencio, coração! Todo o segredo!...

Parceiros