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A Revista do Rio num artesanato simplório

por Irineu E. Jones Corrêa (FBN), Luzia Ribeiro de Carvalho (IC Faperj – bolsista)
O acervo da Biblioteca Nacional guarda o exemplar número 5 da Revista do Rio - órgão aos interesses diligados do Brasil, datado de 14 de setembro de 1902, um dia de domingo. O título faz parte da Coleção Bellarmino Carneiro, que foi incorporada à Biblioteca Nacional em fevereiro de 1972, conforme registra à página 99, o Guia de Coleções da seção de manuscritos da Biblioteca Nacional brasileira, acessível em versão digital no portal da instituição. Trata-se de mais um registro do interesse pela imprensa de sujeitos anônimos. A simplicidade do exemplar guarda, entretanto, um dado precioso, a disseminação do modelo gráfico para periódicos, e anota a circulação de informação e valores morais e políticos, inclusive com a internalização de um modelo específico de nação - republicano e católico.

O artesanato textual e iconográfico do periódico é simples, deixando evidente uma falta de domínio da gramática e das técnicas de desenho. O material está montado em papel madeira claro, de gramatura baixa, sem pauta. A mancha da escrita, com cabeçalho em destaque, a divisão da folha em colunas e a presença de um folhetim, ao rodapé da terceira página, arremedam o modelo do periodismo impresso da época. Lápis grafite é o material usado para escrever. Suas medidas são 67,5 x 52 cm.

A numeração serial do periódico, indicando ser sua quinta aparição, sugere uma curiosa permanência pelo contraste que estabelece com a precariedade do artesanato. A mesma ordem de cuidado, referente agora a uma circulação em intervalos de tempo regulares, é indicada por um sobrescrito que aparece na última página, página que, dobrada, compõe o invólucro do periódico. O aviso se desculpa com o atraso naquele número.

As matérias são separadas em colunas, demarcadas por linhas irregulares. As notícias da seção “Novidades”, datadas de um “hontem”, mostram uma integração a acontecimentos diversos da cidade: resultados da loteria, quase acidente automobilístico em Botafogo, atraso de trens da Central, precariedades dos bondes do Santo Cristo. A seção seguinte, “Sermões”, oferece uma assertiva moral que começa indicando ser a ignorância o pior dos males e termina invocando salvação pela fé em Deus. A seção “Versos” apresenta frases curtas misturando pensamentos morais, políticos e religiosos - um posicionamento político antimonárquico. Esta seção indica a autoria de Maximo Paulino dos Reis, datada de 14 de setembro de 1902, a mesma data da circulação do periódico. A última das sete colunas da página da capa noticia três festas religiosas e uma cívico-militar. Na página três, um folhetim ocupa um quarto da folha. O título é “O filho de Deus”, indicando ser um trecho do evangelho, traduzido pelo autodenominado “notável escritor Maximo Paulino dos Reis”. O folhetim promete continuação. Em todo o texto, o discurso é sempre direto.

As ilustrações mostram recursos técnicos parcos, sendo chapadas, sem profundidade e pobres em detalhes. As cores usadas são o azul e vermelho, de lápis comum. Ocupam as duas páginas internas do periódico. Na primeira delas, estão várias imagens representando cenas circenses. Ocupando três quartos da outra, desenhos diversos: o prédio da redação da revista, indicando o endereço à rua Bela 36, o edifício do Senado do Rio, indicando que era localizado à rua do Areial, a estátua do general Osório no largo do Paço, a capela do Santo Cristo na praia Formosa, o chafariz da água pública também no Paço, o quiosque do Capitão Negro com número e valor, a estátua de Silveira Martins relacionada com o Rio Grande do Sul, um “nigrotério” norte-americano decorado com uma bandeira aludindo as cores daquele país e o barco Riachuelo, nome da famosa batalha fluvial, na guerra contra o Paraguai (1864-1870). Na Brasiliana Fotográfica digital, da Biblioteca Nacional, há um verbete sobre a batalha com farta iconografia.

O autor e editor do manuscrito é homônimo um pintor, nascido em 1781 e falecido em 1866, personagem que, depois de viajar pelos territórios italianos, foi acolhido como artista residente do palácio d’Ajuda, conforme verbete da Collecção de memorias, relativas ás vidas dos pintores e escultores, architectos, e gravadores Portuguezes, e dos estrangeiros que estiverão em Portugal..., editada em 1823, existente na Biblioteca Nacional de Portugal.

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