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Iracema: revista do Centro Litterario

por Maria Ione Caser da Costa
O periódico Iracema: revista do Centro Litterario, lançado em Fortaleza, capital do estado do Ceará no dia 2 de abril de 1895, foi impresso pela Typographia Studart, que estava localizada na rua Formoza, nº 46. Trouxe como epígrafe a frase: “Só a arte immortalisa.”

Os primeiros diretores de Iracema foram Pedro Moniz (1866-1898) e Julio Olympio (1873-1945). A partir do segundo exemplar, que só foi publicado no dia 1º de julho, aparecem os nomes de José Rodrigues de Carvalho (1867-1935) e Pedro Moniz como redatores e Francisco Carneiro como secretário.

Os responsáveis pela redação científica de Iracema foram Guilherme Studart (1856-1938) e Justiniano José de Serpa (1856-1923) e a redação literária ficou a cargo de Pedro Moniz, José Rodrigues de Carvalho e Alvaro Dias Martins (1868-1906).

Inicialmente Iracema teve periodicidade quinzenal, e a partir do número 7, publicado no início de 1896, passou a trimestral, alterando seu formato e aumentando sensivelmente o número de páginas, de 8 para 80. Mudou também a diagramação das páginas.  Nos primeiros seis exemplares, as páginas foram diagramadas em duas ou três colunas, separadas por um fio simples. A partir do número 7, passam a ter uma única coluna, como os livros, e inicia com uma homenagem prestada pelos centristas, reunidos em sessão extraordinária pelo “18º anniversario do passamento de José de Alencar”.  A publicação encerra com o número 9, no final de 1896.

Ser centrista significava pertencer ao Centro Literário, uma sociedade cultural surgida no Ceará. Foi fundado em 27 de setembro de 1894 por Temístocles Machado e Alvaro Martins (1868-1906), chegando a ser conhecido em todo território nacional. Seus fundadores, eram também conhecidos como ex-padeiros, pois tinham pertencido a outra agremiação literária e artística, a Padaria Espiritual, que também reunia escritores, poetas e artistas do Ceará.

Com o mesmo propósito de seus confrades, o Centro Literário teve como foco levar a literatura como instituição condutora da mocidade cearense projetando novos poetas e escritores, bem como a produção literária de seus membros. Teve uma vida longa, se comparada aos grupos literários dos oitocentos, durando cerca de dez anos.  Os centristas formalizaram como instrumento de divulgação de suas obras a revista Iracema.

A agremiação pretendia também mudar o nome do estado de Fortaleza para Iracema, em homenagem a José de Alencar: “Resta agora que ao nome de Fortaleza, que lembra ainda o dominio ferrenho da prepotencia e arrogância de governadores imbecis, seja substituído pelo de Iracema, a formosa cearense, prototypo da dedicação, da lealdade e do amor da pátria.”

O editorial de Iracema, assinado por José Lino, demonstra o que os participantes do Centro Litterario, desejaram ao idealizar Iracema:

 
O titulo escolhido pelo “Centro Litterario” para servir-lhe de senha no templo augusto da imprensa apenas significa um preito de homenagem a um dos mais fortes esteios do grande edificio da litteratura nacional.

Iracema é uma das criações mais bellas e originaes de Alencar.

Um dia o grande genio francez açoitado pelo temporal da revolução disse a seu amigo Malesherbes que ia errar no seio das florestas virgens do Novo-Mundo e lá escrever - a epopéa do homem da natureza. [...]

Justificado o titulo é natural dizermos mais algumas palavras sobre o nosso apparecimento na liça incruenta da imprensa.

Unidos pelo mesmo pensamento batalhamos por um ideal unico – o aperfeiçoamento do espirito no campo da litteratura em busca da arte e do bello.

Qual o mensageiro das nossas emoções, do nosso sentir, da nossa concepção – sinão este vehiculo mysterioso – a imprensa – revoada de passaros que leva por toda parte o ramo de oliveira e a semente fecunda do pensamento humano.

Assim, pois, o nosso despretensioso apparecimento entre os combatentes, nas luctas da intelligencia, quer dizer mais uma parcella no grande numero dos que se esgrimem pela civilisação e pela Patria.

Vários colaboradores estiveram presentes nas páginas de Iracema, dentre eles, Alcebiades Mattos Guerra, Alvaro Martins (1868-1906), Antonio Bezerra, Antonio Ivo, Francisco Alves Lima (1869-1958), José Augusto, José Lino da Justa (1863-1952), F. Clotilde, Justiniano José de Serpa (1856-1923), Julio Olympio (1873-1945), Leonidas e Sá, Octacílio de Oliveira, Pedro Moniz (1866-1898) e Themistocles Machado (1874-1921),

A poesia selecionada para ilustrar esta página do dossiê, publicada no periódico Iracema é “Na Solidão”, de autoria de Henrique Castriciano de Souza (1874-1947). Seus versos foram “escriptos n’uma pedra da gruta da Trincheira, da qual jorra eterno fio d’agua.” A Gruta da Trincheira fica na atual cidade de Martins, situada no alto da serra, no interior do estado do Rio Grande do Norte.


Na Solidão

A lagrima sem fim, a lagrima pesada,
Que eternamente cahe do cimo desta gruta,
Representa algum’alma extranha e desolada,
Que mora a soluçar dentro da rocha bruta...

Esta alma quem será? Não sei! Mysterio fundo...
Entretanto eu presinto alguém que se debruça,
E baixinho me diz, n’um gemido profundo:
- Existe um coração na pedra que soluça...

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