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O Besouro: folha illustrada humoristica e satyrica

por Maria Ione Caser da Costa
O hebdomadário O Besouro: folha illustrada humoristica e satyrica, foi fundado pelo caricaturista português Rafael Bordalo Pinheiro (1846-1905), na então capital do Império. Bordalo esteve no Brasil no período entre 1875 e 1879, convidado a fazer as ilustrações do periódico O Mosquito.

O Besouro circulou 06 de abril de 1878 a 08 de março de 1879, perfazendo um total de 49 edições, e para a maioria das edições, Bordalo contou com a participação efetiva de José do Patrocínio (1853-1905). O escritório da redação do periódico funcionava na rua do Ouvidor, 130, 1º andar.

Antes do lançamento do primeiro exemplar, circulou um aperitivo: uma folha de propaganda, com quatro páginas, que procurava futuros assinantes para o semanário. Ela circulou em 02 de março de 1878, trazendo várias informações a respeito da futura publicação semanal. Na capa, um desenho de página inteira, assinado por Bordallo, no qual dois personagens seguram uma flâmula cada, tendo ao centro e no alto, a figura de um grande besouro. No interior das flâmulas os valores das assinaturas: o número avulso valia 500 rs, o preço da assinatura para a corte e para Niterói tinha os seguintes valores: 20$000 a anual, 11$000 a semestral e 6$000 a trimestral. O valor para as províncias era de 24$000 para a anual, 14$000 a semestral e 8$000 a trimestral. Na parte superior do desenho: “aos Srs. assignantes será offerecida no dia 9 de março UMA REVISTA CARNAVALESCA D’ESTE ANNO”. Informava ainda que “a folha illustrada começaria a 06 de abril de 1878”. Na parte inferior do desenho: “é esta a FOLHINHA que offerecemos aos nossos assignantes, emquanto lhes não damos a folha da arvore das patacas”.

As duas páginas seguintes desta folha de propaganda apresentavam um grande calendário em centro de página, “folhinha do Besouro 1878” - , ironizando os acontecimentos de cada mês. Por exemplo: “janeiro: mez ministerial, o das economias e das fardas novas e viradas”, “setembro: mez do grito a grande Orchestra. É o do Ipiranga, do verbo irregular, das luminárias e da coroa de gaz do Sr. José Bonifacio”.

Na última página, mais uma caricatura de Bordallo representando as quatro estações de modo brincalhão . Desenhos de personagens e de besouros tomam conta de todo o espaço da página, finalizando com a seguinte frase: “Estamos d’accordo e temos amizade com todas as estações, posto que estejamos mais próximos do outono, epocha dos fructos pendentes... Que Deus os dê um bom sucesso.”

A escolha do título para o periódico é contada por José do Patrocínio, no primeiro editorial da revista, sempre no estilo cômico.

Vae se não quando a gente pegou de um pouco de boa vontade, que tinha resistido á dyspepsia e aos credores, e apresentou-a aos amigos com o sorriso de burguez que annuncia ao visinho a vinda ao mundo de mais um criado para o servir.
Foi um regosijo, medimos as costellas uns aos outros com abraços estreitos, rimo-nos com o descuido de collegiaes, e fallámos de futuro, de prosperidade, e até de acquiescencia publica.
Mas de repente uma nuvem sombria passou-nos pela alegria, intempestivamente como vertigem de cavalheiro n’um momento de idyllio.
O nome – a voz com que se dá a conhecer as cousas e nunca os ministérios – surgiu com a solemnidade de uma sphinge a ameaçar-nos com um problema de vida ou morte. O nome! – suspirou-nos o desanimo repentinamente. [...]
Percebia-se nos nossos semblantes e attitudes que todos os nossos cerebros tinham-se convertido em grandes pontos de interrogação – assim - ??? [...]
No relaxamento cerebral sobrevindo ao cogitar esteril, sentimo-nos todos invadidos pelo tédio boçal do caixeiro em domingo de plantão ou da menina lympathica, marcada nas palpebras pelos roixos vincos do lyrismo.
Pouco a pouco a nossa impotencia concepcional foi fermentando em despreso pela idéa apresentada e adormecemos com a promptidão do somno de comedia, e nós, os emprezarios enthusiastas de poucas horas – transformamos-nos em Tytiros tediosos, dormindo bucolicamente á sesta sob a faia virgiliana – como se diria em fanforronada litterararia.
Ao cabo de uma modorra o Bordallo estremunhando-se e espreguiçando-se ruidosamente alarmou-nos, e Simão da Motta com a gravidade pedagogica do Simão de Nantua bocejou por sob as guias do seu bigode: entremos no assumpto.
No recinto havia agora um zum-zum perenne, semelhante ao de um ventilador, e um voador negro, incansável, sonoro descrevia grandes ellypses esbarrando nos quadros, nas estantes, nos vasos de bigonias, nos tapetes, em tudo.
Fitamos attentamente o insecto estroina que revoava incessantemente e todos levantando os braços exclamamos unisonos: está alli o nome!
O Chaves reclamou espirituosamente contra a metonimia e pediu em nome do realismo que dissessemos apenas: está alli o insecto de que vamos tomar o nome.


A Typographia de G. Leuzinger & Filhos, que estava localizada na rua do Ouvidor, número 31, publicou em um volume, o “primeiro anno”, 1878, reunindo os números de O Besouro. A página de rosto relacionava os “redactores e collaboradores do presente volume”, aqui listados em ordem alfabética: Affonso Celso Junior, Alberto de Oliveira, Alfredo Camarate, Arthur Azevedo, Arthur Barreiros, Demerval da Fonseca, Dr. Ferreira de Araujo, Filinto de Almeida, Fontoura Xavier, Generino dos Santos, Guerra Junqueiro, Henrique Chaves, José do Patrocínio, Julio Xavier, Lino de Assumpção, Lucio de Mendonça, Luiz de Andrade, Simão da Motta e Thomaz Alves Filho.

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