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O Mosaico

por Maria Ione Caser da Costa
O primeiro exemplar de O Mosaico foi publicado no dia 26 de abril de 1863, um domingo, na Província do Rio de Janeiro, pela Typographia Paula Brito. Neste período a tipografia estava localizada no número 64 da Praça da Constituição.

Num texto inicial, que recebeu o título “Fiat Lux”, os editores informam que O Mosaico, é um periódico de caráter político. Nesse editorial de página e meia discorrem sobre as variáveis percorridas pelos responsáveis de qualquer publicação periódica.

Os antigos tinham costumes muito interessantes e dignos d’eternas luminárias. Por cada cousa que faziam: por cada passo que davam; ahi vinha um chuveiro de satisfacções ao respeitável publico.
Não se escrevia um livro sem um prólogo estiradissimo, uma advertência, um prefacio ou cousa que o valha: não se publicava um periódico sem um prospecto, promettendo mundos e fundos, que quasi nunca se realisavam: não subia um ministério ao poder sem patentear ao paiz, de modo muito explicito e terminante, o programma que pretendia seguir na gerencia dos nogocios do estado.
Ora tudo isto é sem duvida nenhuma uma reverendíssima massada. O publico não tem que se intrometter na vida privada de ninguém; occupe-se da sua, que não faz tão pouco.
Felizmente vai passando a moda; hade acabar finalmente de todo, como tem acabado muitas outras cousas, que aliás promettiam muito maior duração. Quem é que se lembra mais da constituição? Que fim levaram os partidos saquarema e luzia?


Citando os saquaremas e luzias, continuam o editorial. Vale uma explicação para os leitores que não os conhecem. Saquaremas e luzias foram os apelidos dados aos membros dos partidos que dividiam o cenário político do Segundo Império, o Conservador e o Liberal, respectivamente. Somente depois de alguns parágrafos, decidem os editores, direcionar para os motivos que os levaram a produzir tal periódico:

Dirigindo, pois a palavra neste nosso primeiro artigo, aos amáveis leitores, é nossa intenção informal-os dos fins com que tomamos sobre nossos fracos hombros a tarefa da redacção desta gazeta.
Vamos, pois fazer um programma, é verdade, mas o que querem? Tenham paciência, já agora deixem-nos fallar, que estamos com a palavra.
O Mosasico é um periódico político: sabem porque? [sic] Porque tem de se occupar de objectos que interessam ao bem do paiz: não tratará, porém, das questões pessoaes e pequeninas, á que hoje quase que está reduzida a nossa política: a qual, aqui para nós, que ninguem nos ouça, limita-se á meras e insignificantes intrigas, filhas de interesses ridículos e de ambições desregradas, sempre fataes ao bem publico. [...]
Entretanto, como felizmente ainda não estamos minados do indifferentismo, que neste paiz mirra e acaba as mais bellas aspirações, não nos esmorece a importância da empreza: oxalá que o Mosaico em boa hora appareça: e que empenhando os mais ardentes exforços, possa prestar ao paiz os serviços importantes á que tem elle incontestável direito, e merecer a sympathia e aceitação publica, que tão necessárias lhe são, para que possa existir e perdurar.


A Biblioteca Nacional possui apenas este exemplar de O Mosaico. As pesquisas feitas a partir deste título não informam se ele teve continuidade. Medindo 29 cm x 22 cm, foi diagramado em duas colunas separadas por um fio simples. Com oito páginas não apresentou nenhuma ilustração.
Publicou poemas e notícias de um modo geral, do Brasil e da Europa.

A seguir o poema de José Maria de Almeida com o título “Não vês?”, datado de dezembro de 1861 e publicado na última página. O mesmo inicia com uma pequena epígrafe de Álvares de Azevedo: “Não tardes, minha vida! no crepusculo / Ave da noite me acompanha a lyra...”

Não vês?

Não vês meu rosto pallido, tristonho,
Os olhos derramando amargo pranto?
Não vês o meu aspecto tão medonho
Caminhar já vergado e soffrer tanto?

Tu não vês destas faces já mirradas
Os sulcos salientes da paixão?
Não vês que minhas mãos já descarnadas
Igualam com meu pobre coração?

Não vês? Não vês de certo o margo fel
Que sinto no meu peito trasbordar?... [sic]
Não vês, mulher, não vês, porque és cruel,
E sentes regosijo em me matar!

Oh! não sejas assim! dá-me uma esperança.
Uma esperança que faça-me viver:
Se recusas ao naufrago a bonança,
O que resta depois? É só morrer!

Sim morrer! que este amor que me devora
É ardente, como a chamma do volcão!
Piedade, mulher! p’ra quem te adora
N’um arranco fatal do coração!

Dá-me o teu amor! verásá vida
Voltar-me de prazer enebriante;
Serás do meu sonhar a virgem qu’rida,
A virgem qu’eu adoro delirante!...

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