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O Beijo: publicação semanal de modinhas, recitativos, lundús e poesias diversas, dedicadas ao bello sexo

por Maria Ione Caser da Costa
No dia 11 de março de 1881 vinha a público, na então capital do Brasil, o Rio de Janeiro, o periódico O Beijo, que trazia um extenso subtítulo: publicação semanal de modinhas, recitativos, lundús e poesias diversas, dedicadas ao bello sexo. A responsável por sua impressão foi a Typographia Economica, que estava localizada na rua de Gonçalves Dias, nº 28.

De acordo com o subtítulo, a publicação é dedicada especificamente ao público feminino, entretanto o responsável é do sexo masculino, como pode ser confirmado no último parágrafo do editorial. Este, inicia com uma bonita letra capitular, enfeitada com adornos e desenhos florais. Eis o texto:

Aonde vais, Rio de Janeiro?
Que é feito das tuas pomposas serenatas, quando a lua bella e peregrina reflecte a doce luz nas olentes flores dos teus jardins?
As donzelas já não cantão? Os trovadores já não existem?
Deixaste de ser poetica Veneza para cuidares só no que é grave e positivo? Não. O Beijo será um protesto contra essas supposições. Se não se canta com o enthusiasmo de outros tempos, é porque os bardos já não afinão seus alaúdes, os musicos não dedilhão seus acordes, porque não vêem nem Appollos, nem Trovadores, que nos dêem as bonitas modinhas, os inspirados recitativos e os alambicados lundus!
A brazileira, a meiga brazileira, canta desde o desabrochar dos mais tenros annos e é preciso que se lhes dê harmonias suaves como são as nossas, melodias bellissimas como sabem escrever os talentosos mancebos que cultivão a arte de Verdi, Mozart e Carlos Gomes!
O Beijo toma hoje a si a grata missão de fornecer ás moças brazileiras, as modinhas, recitativos, lundús e poesias diversas que servirão para mais encantar as suas horas de entretenimento.
É pois, esta publicação dedicada ao sexo bello e espera o seu proprietario[*] que ella seja recebida desses bondosos corações, com os mais amaveis sorrisos, com a mais complacente boa-vontade!
Sahirá aos Sabbados e póde ser procurada á rua de Gonçalves dias, n. 28, a qual foi escolhida, por estar nella gravado o nome de um principe da poesia brazileira!

Medindo 22cm x 15cm, com oito páginas cada exemplar, a coleção preservada na Biblioteca Nacional, e que pode ser consultada através da Hemeroteca Digital, contempla apenas dois fascículos.

Impresso em uma coluna, suas páginas trazem apenas poemas, divididos pelas categorias destacadas no subtítulo da publicação: “recitativos, lundús e poesias”. Por exemplo, no primeiro exemplar consta na seção Recitativo, “O Canto da noiva”, com poesia de M. P. Leitão e música de J. P. Serqueira (não apresenta as notas cifradas). Na seção Modinha está “Dormir e sonhar”, poesia e música de João Luiz de Almeida Cunha, e na seção Lundu, está “Hei de olhar”, com poesia e música do Dr. Luiz José Cardoso.

Uma nota, ao pé da última página do primeiro exemplar, informa que o número avulso valia 40 réis no dia da publicação, e nos dias posteriores passaria a 100 réis. Para a assinatura trimestral, o valor cobrado era de 1$000, e os assinantes receberiam os números avulsos, pelo correio e “um vol. brochado no fim do trimestre”.

O outro exemplar preservado, é o número 13, do dia 3 de junho de 1882, e foi impresso pela Typographia Cosmopolita, situada na rua do Senhor dos Passos. Logo abaixo do título aparece a informação de pertencer a “3ª serie”, e está diagramado como o primeiro fascículo. Relaciona os locais para fazer assinatura e venda dos exemplares avulsos: “rua Senhor dos Passos n. 49, estrada de ferro Pedro II, Ponte das barcas, rua de S. José 93, plano inclinado de Santa Thereza, Praça Onze de Junho (charuteiro). Largo da Lapa, Cattete n. 42, Arsenal de Marinha, São Diogo 86, Conde d’Eu canto do bom jardim”. A seguir o poema “Ciumes” de J. J. S. Dias, publicado neste exemplar.


Ciumes

Eu tenho ciúmes das rolas queixozas,
Que fazem gemendo teu pranto soltar;
Das verdes boninas do lyrio da roza,
Que o seio de graças te vem adornar.

Eu tenho ciúmes da fonte serena,
Que o brando murmúrio te faz escutar;
Eu tenho ciúmes do vago sorriso
Que vejo em teos labios constante adejar.

Da noite serena que falta comtigo,
Que arranca do peito teu triste queixume
Em zelos eu ardo da terra que pizas
Com as plantas mimosas eu tenho ciúmes.

 

[*] Negritado pela autora.

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